quarta-feira, 15 de julho de 2009

o aMOR é fRANCÊS

Ciclicamente, os enredos de filmes de amor chegam à sua mais completa exaustão de idéias. Sem histórias suficientemente humanas para contar, o filão cinematográfico encontrou nos romances sobrenaturais, além ou do outro lado da vida, tolos, açucarados ou simplesmente sórdidos uma maneira de manter hipnotizadas plateias que sonham com o "amor romântico legítimo".
A verdade é que os filmes de amor mais bonitos realizados nunca prescindiram de sustentações metafísicas para amparar suas tramas. Sustentam-se no que de mais interessante e necessário existe em qualquer história de amor: o encontro apaixonado entre um homem e uma mulher.
Uma produção simples como Antes do Amanhecer (Before Sunrise, 1995), de Richard Linklater, prova que o cinema norte-americano, há 15 anos, não perdera a mão para narrativas cujo pretexto é contar a história de duas pessoas - Jesse (Ethan Hawke) e Celine (Julie Delpy) − que se apaixonam de verdade.
O principal mérito do filme, além da maneira como narra sua história, é o de fazer acreditar no amor nascente entre os personagens.
Mas a soberania sobre o romantismo cinematográfico ainda é dos franceses. O amor é lindo em qualquer língua, mas, no cinema a "francofilia" fica irresistivelmente atraente. Os franceses tem a manha de mostrar o amor com mesma profundidade e acalento que o sentimento precisa para existir.
Quando esses filmes são rodados nos anos 60, então, a profundidade parece ter ainda mais campo. A produção Um Homem, Uma Mulher (Un Homme et une Femme, França, 1966), do diretor Claude Lelouch, é uma linda história de amor à francesa que conquistou espectadores em todos os cantos – e que, afinal, poderia muito bem acontecer com qualquer pessoa.
O filme tocou corações apaixonados (e indigentes) mundo afora e despertou os olhares sobre a obra de Lelouch. Sem grandes existencialismos e diálogos intelectuais enfadonhos, o diretor envolve o espectador na história da jovem cineasta e viúva Anne Gauthier (Anouk Aimée), que conhece o também viúvo e piloto de carros Jean-Louis Duroc (Jean-Louis Trintignant).
Encontram por acaso, quando vão visitar os filhos num internato na localidade de Deauville, afastada de Paris.
Je t'aime... moi non plus − A partir de uma carona que Duroc dá a Anne, o casal vai interessando-se um pelo outro, à medida que relatam passagens marcantes das suas vidas.
A semana passa e Duroc só pensa na bela mulher que conheceu; ela também pensa nele com intensidade recíproca. No domingo seguinte, acompanhados dos filhos (uma das cenas mais belas do filme), eles reencontram-se na praia de Deauville.
Tornam-se amigos e apaixonam-se, finalmente. Contudo, ainda têm muitas contas a acertar com o passado. O filme ganhou a Palma de Ouro no Festival de Cannes de 1966, além dos Oscar de filme estrangeiro e roteiro original de 1967.
Carros, trens, inverno, bossa nova, um cachorro e seu dono, praia. Esse é o idílico cenário do filme no qual a música dos brasileiros Vinícius de Moraes e Baden Powell cai mui bem com a chason française.
Claude Lelouch usou a cor para localizar os espectadores no tempo: o preto-e-branco representa as lembranças e, o colorido, o presente. A trilha sonora levou "Samba da Benção", cantada por Vinicius de Moraes, a ser mundialmente conhecida.
Assim como Antes do Amanhecer, que ganhou continuação à altura de seu antecessor, Claude Lelouch filmou a seqüência Um Homem, Uma Mulher: 20 Anos Depois, em 1986, repetindo o par central Aimée & Trintignant.
Na França, o cinema continua a fazer filmes de amor com as sutilezas de sempre.
Amor em Cinco Tempos - Uma produção "de amor" recente é Amor em Cinco Tempos (5x2, França, 2004), de François Ozon (Swiming Pool).
Na primeira cena do filme, Marion (Valeria Bruni-Tedeschi) e Gilles (Stéphane Freiss) assinam papéis de divórcio. O roteiro cumpre a ordem inversa dos acontecimentos.
Nesta ordem: começa com separação, traições, turbulências de relacionamento e, finalmente, termina na sublime cena em que os corações dos apaixonados amantes encontram-se pela primeira vez.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

nELSON gONÇALVES vAI gANHAR bIOGRAFIA


Livro sobre a vida do cantor gaúcho deve chegar ao mercado em meados de 2010


A vida de Nelson Gonçalves será contada em livro. A biografia Nelson Gonçalves - O Rei do Rádio será escrita pelos jornalistas Cristiano Bastos e Flávio Ilha. A previsão é de que o projeto, inscrito na Lei Rouanet e na lei de incentivo à cultura do Rio Grande do Sul, chegue às livrarias em meados de 2010.

Nelson Gonçalves iniciou carreira na década de 40, tornando-se ídolo da música romântica chamada hoje de "brega") nos anos seguintes. Além de amigos e familiares, personalidades como Angela Maria, Pery Ribeiro, Cauby Peixoto, Ney Matogrosso, Caetano Veloso e Lobão, entre outras, devem ser consultadas para a produção da obra.

Morto em 18 de abril de 1998, aos 80 anos, vítima de infarto, o cantor e compositor gaúcho deixou um legado de mais de duas mil canções, gravadas em cerca de 60 anos de carreira. De acordo com dados não oficiais, ele é segundo artista que mais vendeu discos no Brasil - seriam 65 milhões de cópias adquiridas ao redor do país (a medalha de ouro fica com Roberto Carlos).

Os autores ainda buscam patrocinadores para o livro. Saiba mais no site da Rolling Stone.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

oRGASMO dE 14 hORAS

O século 21 corre adiantado. Entretanto, a década de 1960 é, ainda, um planeta a ser esmiuçado mais profundamente. Com a difusão de meios audiovisuais, como DVD e YouTube, hoje, o mundo encontra-se em vias de redescobrir a caleidoscópica arte florescida na "era psicodélica".

Imprescindível, inclusive, para entender-se meandros da cultura contemporânea. A Technicolor Dream – documentário dirigido por Stephen Gammond, recentemente lançado no Brasil – é um prefácio histórico e tanto.

Nos dias 29 e 30 de abril de 1967 (alvorecer do flower power), a vitoriana casa Alexandra Palace, em Londres, abrigou o festival 14 Hour Technicolor Dream. Contexto, porém, que começa com as marchas da Campanha para o Desarmamento Nuclear (CND), no ínicio da década – movimentação que culminou, também, na fundação da London Free School e no legendário UFO Club.

A Technicolor Dream recaptura, por exemplo, leituras de poemas do beatnick Allen Ginberg, explosões lisérgicos de luzes e apresentações das "coqueluches do momento", como as bandas The Pretty Things, Soft Machine e Pink Floyd.

Logo no começo, alguém faz importante revelação: "Tinha toda sorte de loucura e coisas experimentais: um orgasmo de 14 horas".

Waters, numa divertida passagem, também rememora que Syd Barret (o qual comandava o Floyd, naquele tempo) passava rolimã nas cordas da guitarra ou um isqueiro Zipo, para que, dessa forma, suas estripulias sonoras surtissem maior efeito plástico-sonoro.

O filme aborda a caminhada – a passos largos – de Sid em direção à esquizofrenia, motivada pelo consumo excessivo de LSD, que fritou-lhe o cérebro: "Dependíamos muito de Syd. Ele era nosso líder criativo", admite. Como extra, o filme traz performances do Floyd: "Astronomy Domine," "Scarecrow" e "Arnold Layne". Uma explosão inevitável de som e cores.


tRIÂNGULO dO dIABO

sexta-feira, 3 de julho de 2009

yOUNG mAN bLUES


Perto de completar 40 anos, álbum ao vivo do The Who chega em terras brasileiras


Reino Unido. Madrugada do dia 29 de agosto de 1970 – duas e meia da manhã. O The Who sobe Ao palco do majestoso festival da Ilha de Wight (espécie de Woodstock britânico). Missão: saciar audiência de 600 mil fãs que, noite adentro, esperou para ver em ação uma das mais gigantescas bandas de rock desde sempre.

Sem aviso prévio, o Who solta a arrasa-quarteirão "Heaven and Hell" – mortífero petardo do vasto repertório do quarteto formado por Pete Townshend (guitarra), Roger Daltrey (vocais), John Entwistl (contrabaixo) e Keith Moon (bateria).

Heaven and Hell, porém, é só o número de abertura do portentoso concerto The Who: Live at Isle of Wight Festival 1970, que ganhou, no Brasil, sua primeira edição (dupla) em CD. Com potência e fulgor juvenil, o Who executa 30 de suas musculosas canções.

O lançamento, licenciado diretamente da marca The Who Group Ltd., é da gravadora brasileira ST2 Records – que vem se destacando, no mercado nacional, pela reedição de uma série de tesouros musicais nunca editados por estas bandas.

Live at Isle of Wight tem assento cativo (e perene) em qualquer listagem de "melhores do rock" que se preze. Sua importância é na mesma estante de robustos álbuns de registrados ao vivo – como o vermelho Slade Alive! (1972), do Slade e Band of Gypsys (1970), de Jimi Hendrix.

No "lado A", o Who ataca com canções, a maioria, até então, desconhecidas de seu público. A única excessão, nesse lado, aos velhos tempos (embora a platéia clame por hits como "My Generation") é Can’t Explain.

O restante são canções novíssimas, à época, como a semi-obscura "Water" – e seus dez minutos de compressão, peso e melodia – e "I Don't Ever Know Myself". A melhor definição para a exuberância sonora do The Who foi cunhada por Townshend: "Maximum R&B". Conceito que pode ser traduzido, livremente, como "Rhythm'n'blues no volume máximo".

Nesse álbum, a performance do Who não encaixa-se direito nas manjadas rotulagens "heavy metal" ou "hard rock". Após presenciar O Who ao vivo, impressionado, Rick Wakman, tecladista do Yes, disse que os quatro integrantes soavam como se fossem oito – tamanha a convição e habilidade com a qual tocavam.

No segundo volume de The Who: Live at Isle of Wight, o repertório faz, no final, concessão aos power hits. Estão lá "Substitute", "My Generation" e "Magic Bus," por exemplo. De novo, o Who ressalta porque era embatível nas apresentações ao vivo, com o medley "Shakin'All Over/Spoonful/Twist and Shout".

O crème de la crème, porém, é o set inicial, onde a ópera rock Tommy é interpretada na íntegra. Como diria-se na gíria: "Matam a pau!".





mADMAN (S)





quinta-feira, 2 de julho de 2009

lITERATURA aTÉ oS oSSOS

POR CRISTIANO BASTOS

O jornalista, tradutor e escritor Ruy Castro, mineiro de Caratinga (cidade natal de Agnaldo Timóteo e Ziraldo), pode dizer que viveu inúmeras aventuras ao traçar a história das grandes personalidades que biografou: Nélson Rodrigues, em O Anjo Pornográfico (1992); Garrincha, em Estrela solitária (1995); e Carmen Miranda, em Carmen (2005).

O próximo lançamento, adianta o escritor, será o volume Leitor Apaixonado - Prazeres à Luz do Abajur. Além disso, ele vem organizando uma coletânea de artigos, charges e ilustrações publicados na lendária revista Senhor, de 1959 a 1964: "Será O Melhor da Senhor, e sai no fim do ano pela Imprensa Oficial de São Paulo", conta em primeira mão.

Pertencente à mítica Geração Paissandu, que existiu entre 1964 e 68 e influenciou profundamente o cinema brasileiro, Ruy habitou o célebre Solar da Fossa, casarão colonial, em Botafogo, Rio de Janeiro, no qual conviveu a geração que se projetou nos festivais de música da década de 1960.

Você toparia escrever um livro sobre a história de Brasília? Por onde começaria ou terminaria?

Não me atreveria a isto, porque não conheço o cenário o suficiente. Como também não conheço bem o de São Paulo, Belo Horizonte ou Tegucigalpa. Meus livros se passam basicamente no Rio porque conheço cada palmo de chão, e isso já é um adianto no trabalho.

Grandes personagens da história brasileira foram biografados por você: Nelson Rodrigues, Garrincha, Carmen Miranda. Quem mais, em sua opinião, carece ser biografado por sua importância?

Muita gente: Carlos Lacerda, Di Cavalcanti, Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade, Tancredo Neves e várias mulheres ? nenhum, até hoje, teve uma biografia decente. A do Lacerda, pelo Foster Dulles, é terrível de ler. São também todas muito problemáticas, e não serei eu que me meterei a fazê-las. Já não tenho o necessário ímpeto para isto.

Você acha que o século 21 tem possibilidade de ser mais interessante que o século 20, do qual és um apaixonado? Esse século será capaz de superar o que passou, em termos de conhecimento?

Sim, por que não? Os instrumentos à nossa disposição hoje são infernalmente superiores aos do passado.

Quais foram os grandes predicados do século que findou?

A capacidade de registrar praticamente tudo que aconteceu, ao contrário de todos os séculos anteriores. Não há evento no século 20 que não tenha sido filmado, fotografado, desenhado, gravado, pintado ou registrado com palavras.

Na sua opinião, até agora, qual a personalidade do século 21?

Ainda é muito cedo para escalar alguém. Mas, se você quiser uma personalidade do século XIII, tenho uma: José Sarney.

Qual é a frase predileta (e pertinente) de seu livro O Melhor do Mau Humor?

"O brasileiro é um povo com os pés no chão. E as mãos também", Ivan Lessa. Notar que os três livros originais (O Melhor do Mau Humor, O Amor de Mau Humor e O Poder de Mau Humor) foram reunidos num único livro, Mau humor, lançado em 2002, e enriquecidos com frases novas.

Sabia que seu livro Chega de Saudade , assim como obras de outros autores, pode ser baixado na internet, por meio de download? Isso é positivo ou não?

É um roubo, não? E como um roubo pode ser positivo? Mas o que mais me irrita é que ele deve ter sido digitado por um analfabeto. Está cheio de erros, as aberturas de parágrafos não foram respeitadas, enfim, é um escândalo.

Você deu importante depoimento a respeito de seu alcoolismo e como o superou. A vida é melhor sem a companhia do álcool?

No meu caso, a vida melhorou em um milhão por cento. No que parei de beber, em 1988, comecei a produzir os livros e, tanto pessoal como profissionalmente, tudo mudou a partir daí. Isso já faz 21 anos e espero continuar abstêmio pelos próximos 21.

Pensa em fazer como Jack London, que contou tudo em Memórias Alcoólicas, publicado em 1913, a partir da analogia com a entidade "John Barleycorn"?

Por enquanto, não. Mas usei muito do meu conhecimento prático e teórico do assunto para produzir o livro Estrela Solitária, sobre o Garrincha.

Esse é o ano de Carmen Miranda, morta precocemente, aos 46 anos, vítima da dependência de substâncias. Por que sempre parece que as grandes estrelas estão fadadas à tragédia?

Porque as estrelas são famosas e fica-se sabendo o que aconteceu a elas. Mas essa possibilidade de tragédia acontece o tempo todo, e em muito maior escala, entre os pobres, os anônimos, os desvalidos.

A Justiça deu ganho de causa para o caso envolvendo a biografia sobre Garrincha. Como ficou o caso?

O livro foi liberado e voltou a ser vendido normalmente, mas o processo se arrastou por 11 anos. Há um relato minucioso do caso no meu próximo livro, O Leitor Apaixonado - Prazeres à Luz do Abajur, de artigos sobre literatura e jornalismo, que sairá no fim do mês de julho pela Companhia das Letras.

Prefere biografar os vivos ou os mortos?

Os mortos, sem dúvida. Os vivos não são confiáveis, mentem muito e obrigam os amigos a mentir sobre eles.

Who's Next?