terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

bUENAS bANDAS, dISCOS y oTRAS cOSITAS

Los Shakers [[Uruguai]]
Banda dos irmãos Hugo e Oswaldo Fattoruso, Los Shakers são o melhor "conjunto de Beatles" do mundo, ao lado dos australianos Easybeats. Cantavam em inglês e gravaram três discos clássicos com a levada beat tradicional. Em 1967, gravaram o "Sgt Pepper's sulamericano", o disco La Conferencia Secreta del Toto's Bar.
Los Saicos [[Peru]]
Banda de Lima, no Peru, é uma espécie de nossa mais perfeita tradução das bandas "nuggets" ou "pebbles". Em 1964, gravou a música "Demolición", um petardo punk da estirpe de "Psycho" ou "Surfin' Bird". Para garantir a lenda, não gravaram nenhum LP, apenas seis compactos sem reedição oficial.
Los Gatos [[Argentina]]
É uma das três bandas fundadoras do rock argentino, ao lado de Almendra e Manal, nos anos 60. Distante da Nueva Ola, que quase não vingou na Argentina, tem a seu favor o fato de fazer rock em espanhol desde o início. Liderada por Litto Nebia, deixou cinco ótimos discos gravados.
Los Mac's [[Chile]]
Um dos vários grupos chilenos importantes da primeira metade dos 60. Mas, além dos demais, destaca-se pela gravação do disco Kaleidoscope Man, em 1967, outra espécie de Sgt. Pepper's local. Psicodelia, garagem e ecos de Stones 66 fazem da banda audição obrigatória.
Los Speakers [[Colômbia]]
Natural de Bogotá, Los Speakers são os responsáveis pelo disco mais "doido" da discografia latina, e também o primeiro independente – Em El Maravillos Mundo de Ingeson. Fundamental pela sonoridade psicodélica e pelo inedetismo conceitual, que incluia uma “pastilha” colada no disco (um chiclete Adams...hehehehe...)
Almendra [[Argentina]]
Banda de Luis Alberto Spinetta, que depois montou outros projetos, em especial o grande Pescado Rabioso. De orientação "Beatles", o Almendra fez a transição dos anos 60 para a psicodelia setentista. Seus singles e o primeiro álbum são clássicos do rock argentino lembrados até hoje.
Los Traidores [[Uruguai]]
Banda dos anos 80, com o tradicional mix de punk & new wave, é responsável por um dos melhores discos da discografia latina: Montevideo Agoniza. Com letras existencialistas e/ou politizadas, traduziu o período que marcou o fim da ditadura, que afastou os jovens do país.
Leusemia [[Peru]]
A grande banda punk da América do Sul, em música, estética e especialmente atitude. Nascida com o Movimento Subterrâneo, deixou alguns dos hinos musicais da juventude peruana. De carreira irregular, retornaram nos anos 90, com o disco A la Mierda lo Demás (Asssinato del Mito), que acabou tendo efeito contrário...
Los Prisioneros [[Chile]]
A maior banda de rock do Chile, um trio com música econômica, entre punk & new wave e letras politizadas - e longas. Surgida ainda sob a ditadura de Pinochet, gravou diversos discos, com destaque para La Voz de Loz 80 e Pateando Piedras, clássicos do rock da América do Sul.
Sentimiento Muerto [[Venezuela]]
Outra banda tão importante quanto desconhecida para os brasileiros. Natural da Venezuela, teve seu primeiro disco lançado em 1987, produzido pelo argentino Fito Paez. Também com estética punk & new wave, incorporava toques de ritmos regionais. Gravou três discos e deixou um hit clássico, "Manos Frias".
CANCIONES PARA SIEMPRE
"Demolición" [[Los Saicos]]
A grande representante do proto-punk latino. Cantada até hoje pelas novas gerações. Até no Brasil ganhou cover, com os gaúchos da Damn Laser Vampires. Tão boa quanto "Surfin Bird", talvez melhor. Pena que os Ramones não a conheceram.
"Oirán tu voz, oirán nuestra voz" [[Leusemia]]
Uma bela canção de geração, típica dos anos oitenta. Sem afetação política, mas reivindicando que "a juventude precisa ter mais espaço". Tem duas versões, uma mais crua, de meados dos 80 e outra posterior, mais trabalhada.
"Aprendizaje" [[Sui Generis]]
A mais fiel tradução do discurso "drop out" sulamericano, com a banda Sui Generis, de Charly Garcia. Um mix de folk & piscodelia, foi um tipo de hino da juventude argentina no início dos anos 70.
"Cae la Lluvia sobre Montevideo" [[Los Traidores]]
Com sua letra sombria, cantava um dos períodos mais difíceis de um Uruguai que teve seus jovens assassinados ou expulsos do país. Com ela, Los Traidores deram sentido ao clima de quase abandono de uma geração.
"Chica Rutera" [[El Mató a Un Policia Motorizado]]
Natural de La Plata, El Mató a un Policia Motorizado é a grande revelação do rock argentino atual. "Chica Rutera", com suas duas frases, se converteu em um mantra suburbano dos “chicos” indies do Rio da Prata.
CANAIS PARA OUVIR & LER SOBRE O ROCK LATINO
Super 45 (e-zine do Chile com rádio)
Zona Indie (e-zine da Argentina com rádio)
Zona de Obras (revista espanhola com política editorial ibero-americana)
Programa Operación Escuchar (Rádio Nacional Faro, de Buenos Aires)
SENHOR F SEM FRONTEIRA
Está na rede a quinta edição do programa Senhor F Sem Fronteira, apresentado por Fernando Rosa e veiculado pela Rádio Câmara, em Brasília. No programa, destaque para o desconhecido rock paraguaio, com a banda Limón Sutil e um passeio pela milonga pampeana de Kevin Johansen e Vitor Ramil, além de Caf Tacuba e músicas do novo disco Si No. A edição também traz a dobradinha brasileira Vanguart/Los Porongas, incluídos na coletânea da revista espanhola Zona de Obras. Para ouvir todas as edições do Sem Fronteira, é só clicar.

sábado, 2 de fevereiro de 2008

a mALDIÇÃO dO sAMBA*

A cada briga de rua, uma nova música - um novo hino de louvor ao fim dos tempos
CRISTIANO BASTOS
Um aviso aos incautos: não basta gostar de black metal, nem bancar o eclético. É preciso ter santo forte e nenhuma repulsa para encarar as 18 faixas instrumentais de O Jazz Vai à Merda, o primeiro disco da banda brasiliense Satanique Samba Trio (gravadora Amplitude).
Só pelo nome das canções dá para ter uma noção da atmosfera de horror e blasfêmia que o SS3 quer instaurar com sua "música do contra": "Kit de Amputação Asa-sulista", "Canção pra Atrair Má Sorte (Ato 6)", "Todos os Santos na Grelha", Salve Satã e Ponto Final", "Auto-retrato em Tripa de Cachorro".
Insurgidos dos subterrâneos da capital federal 2000, esses missionários do anticristo com formação erudita se investiram na missão confessa de meter medo. O golpe é mais ou menos o seguinte: o trio - que na verdade são cinco integrantes - primeiro absorve os cacoetes mais indigestos da música erudita contemporânea, de dissonâncias a distorções rítmicas. Depois, regurgita tudo na cara da MPB com uma injeção de punk, ao menos no barulho e na atitude. "As microfonias foram cuidadosamente planejadas para azucrinar o ouvinte com uma algazarra infernal", adverte o criador do grupo, baixista e regente Munha.
A duração das músicas de O Jazz Vai à Merda, obssessivamente calculada, nas quais não há nem sombra de improvisos, segue o ideário punk. Nada ultrapassa os cerca de 3 minutos. Na opinião de Munha, a ambivalência de uma banda que toca música desconhecida e particular soa desafiadora, cativa os expectadores menos imbecilizados, mas enoja fãs do jazz, irrita roqueiros e causa asco nos eruditos.
O SS3 jura que não é simplesmente lúdica essa conversa de adoração ao demo, que já virou piada gasta por causa do culto infantil dos fãs de heavy metal. Todo o universo temático do grupo está voltado para o louvor ao conceito de "adversário", conforme esclarece a etimologia hebraica (Shaitan) do termo "Satã".
Segundo o músico, que sofre de transtorno bipolar e toma remédios controlados, além da besta, suas influências resumem-se a quatro: falta de dinheiro, umidade relativa a 10%, insônia aguda e Gustav Mahler: "A quarta sinfonia de Mahler é de fazer lacrimejar os olhos do mais duro fuzileiro naval!".
Na opinião de Munha, de tão árida e tediosa, Brasília se torna bastante inspiradora: "Sempre que vejo uma briga na rua, volto para casa e componho. Na última pancadaria, escrevi uma ópera na seqüência". Ele vê a cena do rock brasiliense como um retrato deprimente da realidade nacional. "Bandas tão inventivas quanto a equipe de criação do Caldeirão do Huck", zomba.
A imprensa local nem reconhece a existência da SS3, tamanho é o boicote do jornalismo quase beato da cidade, critica o compositor. "Por aqui todos querem escrever sobre pessoas simpáticas que levam a vida na maior curtição. Da cena brasiliense, gostaríamos de ser os vilões, mas os roqueiros nos ignoram. Não que isso seja ruim, é claro".
Se a imprensa local não dá espaço ao SS3, pelo menos a de fora do país está antenada com o que se passa no nosso submundo. No ano passado, a banda saiu nas páginas do jornal britânico The Observer. Com o título "Anyone for a spot of satanic samba?" - algo como "Alguém a fim de um pouco de samba satânico?", a matéria, que também citava Graforréia Xilarmônica e Hurtmold, afirmava haver muito mais que bossa nova no Brasil: "Uma explosão de coisas novas, algumas profundamente estranhas", comentava o artigo.
Sobre o atual estado da música popular brasileira, Munha acha que há tanto artista bunda-mole solto por aí que dá até desânimo criticar: "É como chutar cachorro morto. Prefiro falar mal de roqueiro". Mesmo depois de lançar em 2005 o elogiado EP Misantropicália, ele confessa que ainda não sabe definir como o grupo soa. "Imagino que para quem houve deve ser algo do tipo 'samba de filho da puta'". Diante de tudo, só resta a pergunta: que diabos esses caras pretendem, afinal? "Nada que preste, pode apostar", escarnece Munha.
*Bizz, março de 2006.

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

eNCAIXOTANDO eLEKTRA*

Velharias inéditas de bandas como The Doors são jóias cada vez mais escassas. O box set Forever Changing: The Golden Age of Elektra Records-1963-1973, lançado pela Rhino, recupera raridades de artistas do cast da Elektra, que foi do purismo folk ao rock psicodélico e ajudou a fecundar as sementes do punk.
Os cinco discos que compõem a caixa são oportunidade única para se deliciar, entre outras pepitas, com a versão de "Moonlight Drive", em que a banda altera os arranjos para que um manhoso Jim Morrison recite seus vocais embriagados.
Antes dos Doors, nomes respeitados da cena folk foram lançados pela Elektra: Fred Neil, Juddy Collins, Phill Ochs e o mitológico Tim Buckley. A grande sacada da caixa, contudo, é a reedição de obscuridades piscodélicas como Holly Modal Rounders, Clear Light, Ars Nova, Plainsong, The Wackers e de uma camarilha de bandas dadas como esquecidas.
Forever Changes desenterra tesouros do período pré-fama dos The Byrds e Blue Oyster Cult, que antes se chamavam Beefeaters e Stalk-Forrest Group, respectivamente - nada mau para uma gravadora que começou a operar com capital inicial de 300 dólares, em 1950, e foi a casa do MC5 e dos Stooges.

O brilho da Elektra resplandece na produção do box set, que contém livro, postais e CD-ROM. Uma das curiosidades é a canção "World without End", do aspirante a herói glitter Jobriath, que morreu em 1983, não destronou Bowie e Bolan, e hoje é amado por gente sensível como Morrisey.

*Bizz, março de 2007.

domingo, 27 de janeiro de 2008

aTHOS bULCÃO: cRIAÇÃO sEM mISTÉRIO*

Parceiro de Oscar Niemeyer, artista fez da capital federal a grande obra da sua vida

POR CRISTIANO BASTOS

"A criação é misteriosa". Assim, Athos Bulcão tenta definir sua arte. Mas não há mistério em se dizer que Bulcão é um dos grandes expoentes da cultura brasileira. Sua extensa produção, reconhecida internacionamente, pode ser vista em aproximadamente cem monumentos públicos de Brasília, em locais como Teatro Nacional, o Panteão da Pátria, o Palácio do Itamaraty e o Congresso Nacional.
Aos 88 anos, com dificuldades para falar por causa do Mal de Parkinson, ele recebeu a revista Bien'Art, no Hospital Sarah Kubistchek, em Brasília, onde estava internado desde fevereiro. Ironicamente, ali mesmo, o artista pôde ver sua obra, criada quando esbanjava saúde: painéis feitos nos anos 1960 para o projeto de João de Filgueiras Lima, o Lelé, arquiteto conhecido pelos inovadores projetos da Rede Sarah. A doença, que hoje impede Bulcão de andar e trabalhar integralmente, não esconde sua veia poética: "A vida, para mim, foi e continua a ser uma constante indagação. Com alegria pelo cerrado, à espera de alma e de beleza".
Juntamente com a mudança da capital do Rio de Janeiro para Brasília, o artista carioca adotou o cerrado para o resto da vida quando recebeu o convite de Oscar Niemeyer para realizar uma série de obras de arte em prédios da cidade. Já havia sido colaborador do arquiteto na Igreja da Pampulha, em Belo Horizonte.
Em 1958, travando verdadeira corrida contra o tempo, Bulcão desembarcou na futura capital - até então um enorme canteiro de obras no meio do planalto central - para integrar artes às concepções de Oscar Niemeyer. O arquiteto e artista trabalharam juntos nas ações de revestimentos, painéis, murais, divisórias e outros ofícios de integração de artes plásticas à arquitetura da cidade.
Atos costuma dizer que seu encontro com Niemeyer foi uma sorte. "Ele me ensinou a correr riscos. Com ele, aprendi a pensar arte e arquitetura, visualidade, espaços e distâncias". Outro privilégio na sua vida, afirma o artista, foi ter visto Brasília nascer praticamente do nada. E ter colaborado no custoso parto. "Artista eu era. Pioneiro eu fiz-me. Realmente um privilégio: ser um pioneiro".
O arquiteto oscar Niemeyer recorda com afeto os tempos de trabalho e camaradagem ao lado do colega. "Lembro como, atento, Athos tentava supor o que eu tinha em mente, para poucos dias depois surgir com o projeto realizado. O meu amigo decifrava como ninguém a nossa arquitetura e nela se inseria com sensibilidade invariável", conta destacando as pinturas que Bulcão fez para a Catedral de Brasília, a partir de composições equilibradas e muito coloridas. "Às vezes eu o procurava sem nenhum propósito profissional. Queria apenas vê-lo, saber se ia bem de saúde, se a vida lhe corria feliz, e lá ficávamos, a conversar, solidários. Ele, falando baixinho, como é seu hábito", relembra Niemeyer.
Obras de Bulcão dão cor ao concreto de Brasília - Para a professora do Instituto de Artes da Universidade de Brasília (UNB), Grace Maria Machado de Freitas, a porção mais conhecida da vasta obra do artista é a que está integrada à arquitetura. Mas Grace, também presidente da Fundação Athos Bulcão (que desenvolve programas voltados para a difusão de arte e ações sócio-educativas para jovens), destaca outros tipos de trabalho, como a série de relevos policromados, intitulada Máscaras, em que o artista adota a figuração e textura variadas. Grace também destaca as fotomontagens, que expressam um fino humor a partir de uma linguagem surrealista. "Mais adiante, a fase pictórica apresenta soluções de tonalidades cromáticas que traduzem o espaço e a luminosidade da paisagem", acrescenta.
Anos antes de instalar-se em Brasília, Bulcão foi auxiliar do pintor Cândido Poirtinari no painel de São Francisco de Assis, da Igreja da Pampulha, em Belo Horizonte. Terminou sendo chamado para fazer um estágio no ateliê do mestre, no Rio de Janeiro. "Conheci Portinari em 1945. Ele era muito importante, enquanto eu era sempre muito cerimonioso. Com ele aprendi a entender os quadros e a analisar como eram feitos. Compreendi que trabalho é disciplina e passei a valorizar a importância de se pensar a arte. Até hoje, antes de pintar, escolho as cores que vou usar. Pré-determino o quadro que vou pintar e muito raramente acrescento alguma coisa nova", revela o artista.
Na década de 1960, vivendo a plenitude da sua produção artística, Bulcão foi convidado pelo antropólogo Darcy Ribeiro, então reitor da Universidade de Brasília (UnB), para lecionar no Instituto Central de Artes. "Foram tempos complicados", relembra Maciej Babinsk, pintor polonês naturalizado brasileiro, que na época ocupava o cargo de professor-assistente de Bulcão. A atmosfera era de repressão, inclusive na área cultural. Em 1965, ambos acompanharam, a contragosto, a demissão coletiva de mais de duzentos colegas, conseqüência do golpe militar.
Babinski lembra que Bulcão, assim como outros intelectuais da sua geração, estava envolvido no projeto de tornar a UnB uma universidade nova - antes, durante e depois do regime militar. "A UnB era muito pressionada pela ditadura para levar adiante as demissões. A intenção era que os professores mais 'transgressores' fossem substituídos por outros, inofensivos", recorda o velho colega. Foi um momento de grande desespero.
Na tentativa de fazer com que os professores que estavam na lista fossem poupados, e como forma de protesto, o grupo de acadêmicos fez uma assembléia. A solução acordada entre todos foi a demissão coletiva. Mas o resultado da ação não ocorreu como esperado e as exonerações, assim mesmo, foram realizadas. Em 1985, os professores remanescentes, entre os quais Bulcão e Babinski, foram reintegrados à UnB graças à Lei da Anistia e se envolveram, com a mesma forma do passado, no projeto do novo Instituto de Artes.
A integração da arte à arquitetura - Durante e após a ditadura, a amizade entre Bulcão e Babinski progrediu além da docência. O polonês tem o artista como o precursor, no Brasil dos anos 1940, da técnica de colagem com motivos surrealistas, que ele viria a utilizar na sua arte com azulejos. Essas peças, que podem ser vistas nas paredes do Palácio do Itamaraty ou até mesmo no Memorial da América Latina, em São Paulo, primam pela combinação das cores azul e branco, padrões nos azulejos do Brasil colonial. "É de inteira responsabilidade dele ter reintroduzido a forma de arte oriunda dos azulejos do Brasil colonial na arquitetura moderna".
Na opinião de Babinski, a integração entre arte e arquitetura que se observava em Brasília era mais harmoniosa do que a dos projetos atuais. Segundo ele, em outros tempos, a relação não parecia "simplesmente decorativa". Hoje, falta bom senso e as intervenções são excessivas. "Antes víamos os edifícios em meios às àrvores. Parecia que morávamos em um parque. Agora a quantidade de outdoors é tão grande que em alguns lugares não vemos mais nada. Nem o que eles dizem", reclama. "Eu sempre trabalhei ao lado do arquiteto procurando entender seu projeto para, nele, associar a minha arte", justifica.
Lucio Costa, oscar Niemeyer, Athos Bulcão. De todas as combinações de nomes e obras em Brasília, conforme Grace Maria Machado de Freitas, esta é a mais emblemática para a capital. "O legado de Athos Bulcão para a cidade, em especial, é indissociável do seu projeto urbanístico e arquitetônico", define a professora.
O crítico de arte e professor da Faculdade de Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP), Agnaldo Farias, enfatiza o fato de Bulcão ter como mérito trabalhar em espaços coletivos numa cidade com inúmeras dificuldades para agregar a convivência social, mas apta a acolher obras de arte e, por meio delas, mediar possíveis encontros. "A obra de Athos tornou-se expressão de um povo".
*Perfil publicado na revista Bien'Art (Fundação Bienal de São Paulo), março de 2006.

pESO e lEVEZA

Para realizar uma das suas mais reconhecidas obras, o relevo da fachada lateral do Teatro Nacional Cláudio Santoro, em Brasília, Athos Bulcão conta que o objetivo inicial da proposta que Niemayer lhe fez era imprimir um pouco de leveza à imensa fómula sólida e piramidal do prédio.
Ele lembra que Niemayer pediu sua colaboração, no que primeiramente deveria ser apenas um painel de azulejos, mas o arquiteto terminou concluindo que, pra complementar o exterior do teatro, o ideal era criar algo, ao mesmo tempo, leve e pesado: "Fui à casa de um amigo que tinha uma serra mecânica e tive a idéia de fazer aqueles cubos que se multiplicam em diferentes tamanhos. Ficou pronto em uma semana e é uma das obras que me deu maior satisfação, por ser grande, complexa e exposta. É um trabalho muito bem aceito pelas pessoas. As crianças sobem e se divertem - o que é sinal de aprovação".
VENDO ATHOS:
Na Fundação Athos Bulcão há uma grande coleção de gravuras, pinturas, fotomontagens, máscaras, bichos e desenhos do artista em exposição. No site, você pode conhecer os pontos de Brasília em que ele fez a integração entre arte e arquitetura e tem acesso a artigos, biografias e aos projetos desenvolvidos pela fundação. Não deixe de visitar a seção de produtos, onde a arte de Bulcão vem estampada em artigos como sombrinhas, pratos, canecas e camisetas.

domingo, 20 de janeiro de 2008

o hIPERESPETÁCULO

“E sem dúvida o nosso tempo... prefere a imagem à coisa, a cópia ao original, a representação à realidade, a aparência ao ser... O que é sagrado para ele, não é senão a ilusão, mas o que é profano é a verdade.
Melhor, o sagrado cresce a seus olhos à medida que decresce a verdade e que a ilusão aumenta, de modo que para ele o cúmulo da ilusão é também o cúmulo do sagrado”. (Ludwig Feuerbach, prefácio da segunda edição de A Essência do Cristianismo)

Considerações como essa, que o filósofo alemão Ludwig Feuerbach (1804/1872) escreveu em sua obra definitiva, A Essência do Cristianismo, custaram-lhe a carreira acadêmica e o condenaram ao ostracismo pelo resto da vida. Feuerbach viu sua inteligência amargar a vitória do ilusionismo, mas acabou provando quão perigosas podem ser as tentativas de desvendar noções coletivas consagradas pela sociedade.
Todavia, cerca de século e meio depois, as ponderações de Feuerbach ainda são lúcidas para explicar a ilusão mágica exercida pelos reality-shows sobre rebanhos de milhões de telespectadores. No Brasil, eles se acomodam em frente ao televisor para "decidir" sobre o futuro dos participantes do programa Big Brother.
A exemplo do catolicismo e do futebol, duas heranças estrangeiras, o Big Brother, cuja franquia pertence a empresa holandesa Endemol, só vingou mesmo é no Brasil. Por essas bandas, alimentar a ilusão de poder aparecer na Rede Globo em horário nobre é uma aspiração além de unânime. Istoé, sagrada, como postulou Feuerbach.
Se fosse organizada uma temporada de plebiscitos mediados pela televisão, para determinar o destino do dinheiro público, por exemplo, não haveria o mesmo envolvimento dos telespectadores. No entanto, quando o tema é um entretenimento em massa, como o Big Brother, ou o final da novela, todo mundo tem a sua opinião. Detalhe: os telespectadores ligam (e pagam) para a emissora para participar dos chamados "paredões" do programa. Cidadania e política não é o que importa, alienação vouyerística, sim, é o que há.
Vivo, o teórico Guy Debord teria presenciado, nem um pouco abismado, nos reality-shows, a materialização das teorias da sua obra A Sociedade do Espetáculo (Editora Contraponto, 1997), escrita em 1967. Segundo Debord, o espetáculo apresenta-se como algo grandioso, positivo, indiscutível e inacessível.
Debord chamou o espetáculo de "o sonho da sociedade", que encontra nele sua vontade de fugir da realidade e se entregar à ilusão: "A alienação do espectador mediante o objeto de contemplação, resultado de sua atividade inconsciente, exprime-se assim: quanto mais ele contempla, menos vive; quanto mais aceita reconhecer-se nas imagens, menos ele compreende a sua própria existência e o seu próprio desejo. A exterioridade do espetáculo em relação ao homem que age aparece nisto, os seus próprios gestos já não são seus, mas de um outro que se apresenta".
A ironia maior é que a mídia, que ignorou Debord por toda a vida, promoveu, quando ele morreu, um "espetáculo na Sociedade do Espetáculo". A televisão exibiu o documentário Guy Debord, Sua Arte e Seu Tempo e o filme-documentário A Sociedade do Espetáculo. Os jornais lhe deram a primeira página, seu suicídio estampado com a manchete: "Morre um dos grandes pensadores do século 20".
Hiperespetáculo − Na opinião do sociólogo Juremir Machado da Silva, Debord é um homem do século passado. O espetáculo debordiano, para Juremir, chegou ao fim. A era que vivemos é outra − a era do hiperespetáculo. O espetáculo, elucida Juremir no texto Depois do Espetáculo (reflexões sobre a tese 4 de Guy Debord), era um fenômeno ligado à contemplação. O hiperespetáculo é a contemplação de si mesmo num outro:
"No espetáculo, cada indivíduo abdicava do seu papel de protagonista para tornar-se espectador. Mas era uma contemplação do outro, um outro idealizado, a estrela, a vedete, os 'olimpianos'. Um outro radicalmente diferente e inalcançável, cuja fama era ou deveria ser a expressão de uma realização extraordinária. No espetáculo, o contemplador aceitava viver por procuração. Delegava aos 'superiores' a vivência de emoções e de sentimentos que se julgava incapaz de atingir. No hiperespetáculo, a contemplação continua. Mas é uma contemplação de si mesmo num outro, em princípio, plenamente alcançável, semelhante ou igual ao contemplador. (...) O outro é 'eu' que deu certo graças às circunstâncias. O preço da fama parece estar ao alcance de qualquer um".
E o escritor George Orwell, que pensaria ao ver a expressão Big Brother furtada do livro 1984, e que diria dos reality-shows de hoje? Foi mais ou menos essa a pergunta feita ao apresentador Pedro Bial em uma entrevista à Revista Trip. O jornalista não deixa de tirar uma onda do povão que assiste ao Big Brother Brasil, que nunca ouviu falar de 1984 e que, se o lesse, saberia que o tal Grande Irmão é um vilão de primeira.
Bial, que pode se prestar ao papel de jornalista-animador de TV, mas não é nenhum idiota, tergiversou diplomaticamente: "Acho que ele ia ficar meio possesso com a apropriação do título. Depois, inteligente como era, ia falar: 'Puxa, o danado do capitalismo conseguiu subverter até isso!'. Até o que era sinônimo de totalitarismo e controle absoluto do cidadão vira programa de entretenimento. No Brasil é mais engraçado ainda porque o povo não sabe a origem da expressão. Acham que o 'brother' é de irmão, amigo [risos]".
Sombrio é confundir 1984 com entretenimento, quando a obra é puramente sobre totalitarismo. De qualquer forma, a analogia do BBB com o mundo profetizado por Orwell, de fato, existe. A única liberdade no Big Brother é a liberdade vigiada e contratualmente monitorada. Que um dos participantes ouse falar mal do funcionamento do programa ou do governo que o rege (a Globo)... A punição seria a pior imaginável: defenestração pública em rede nacional e a saída do programa transmitida para todos os lares. Com direito a lição de moral do Bial. Humilhação pior que o soldado deserdor poderia receber por abandonar a guerra do seu país.
Nesse ponto, o Big Brother é muito semelhante ao livro que o inspira: o controle absoluto pelos olhos que tudo vêem, sabem e controlam. Medo, sentimentos de inquietação, castração sexual e liberdade − mas só até certo ponto. Em outras palavras, uma forma de escravidão que pode ser muito bem remunerada. Ou não. A maioria esmagadora sai de lá com as mãos abanando.
E as analogias vão muito mais além do que supúnhamos. Tal qual a obra de Orwell, no Big Brother as classes são bem determinadas. Alguma punjança para os líderes e, para todos os demais, obediência, medo e solidão. O público, o olho tentacular do Big Brother, analisa as personalidade, faz os julgamentos e dá o seu veredito. E não há chance para se redimir. Se o jogador causar má impressão ao sair da casa, assim será para toda a sociedade, a brasileira, essa que legitima muitos dos seus valores com um controle remoto em punho.
Do ponto de vista sociológico, o mais intrigante é que os "brotheres" se mostram extremamente felizes na condição de confinados. Tão exultantes que as lágrimas rolam lépidas e inconseqüentes. Nem o santo nome de Deus tem descanso. É dito em vão a todo momento pelos participantes, agradecendo por estarem ali, encarcerados, ou suplicando à sensibilidade superior para que se dêem bem no jogo. Logo Deus, que já tem o Big Brother Mundo pra vigiar, além das guerras, da fome, da violência e da corrupção no Brasil.
Apesar de tudo, o fetiche é grande. Tanto por parte dos participantes como do público. Até as formas mais suaves de pornografia são beneficiadas pelo BBB. É a lógica de funcionamento do programa, que já prevê destino editorial certo para os saradas e sarados do programa no observatório erótico das revistas. Todos, sem sombra de dúvida, bombados e musculosos. Pedaços de carne bem cotados no mercado.
Autencidade premiada O BBB é o território no qual a dissimulação vem fantasiada de "autenticidade", palavra-chave no glossário dos reality-shows. Certa vez, uma pessoa que conheci revelou que torcia por fulano de tal na edição passada do programa. Para uma confessa telespectadora do Big Brother, nada de anormal, se identificar com algum participante do jogo. Mas, ao me dizer isso, fiquei naturalmente curioso para saber porque ela estava torcendo por aquela pessoa: "Porque ele é autêntico", respondeu-me, como se tivesse aprendido a palavra "autêntico" assistindo à televisão.
A grande questão era saber se ela torcia pelo candidato em questão porque o Brasil inteiro estava torcendo pela mesma pessoa − e então este é um jogo de cartas marcadas em que o ganhador é definido antes do final − ou, simplesmente, porque o jogador seria realmente autêntico. Autêntico até o ponto em que a liberdade do programa permite. Pelo que sei, autenticidade tem a ver exclusivamente com liberdade. Sobretudo, liberdade de expressão e de pensamento.
Porém, como pode se ter autencidade ao participar de um programa que limita a liberdade de seus jogadores em um código de conduta que não pode ameaçar, nem de longe, os interesses da empresa que o produz? No BBB, autenticidade só seria possível se houvesse a mínima chance de crítica contra o stablishment do programa. Como não há, qualquer tentativa de ser autêntico, portanto, é meramente simulada. É como achar que existe liberdade escrevendo para um jornal. A liberdade só vai até onde começam os interesses da empresa.
A noção de autenticidade também se dilui nas edições do BBB. Confinamento após confinamento, fica visível que os participantes do jogo partilham de uma mesma linguagem padrão. Por já terem sido espectadores dos números anteriores, eles estão cada vez mais profissionais na construção de uma autenticidade auto-elaborada e na criação, com a palavra final da edição, de “kits-de-perfis-padão” identitários.
Edição após edição, "espie": a ritualização é sempre a mesma − dos gestuais ensaiados aos modelitos de banho, do exibicionismo fashion aos cortes de cabelo da hora, do sentimentalismo que se apodera de todos as amizades verdadeiras, da troca generosa de elogios à sinceridade fingida. Até a franqueza é fingida. Na casa do Big Brother todo mundo age segundo a mesma cartilha dissimulatória e, nos lares, todos dizem amém.
No Brasil, a usina do entretrenimento barato avança a todo o vapor. O número de pessoas que aspira a um posto de popstar, para gozar de cinco minutos de fama televisiva, é muito maior do que se imaginava. Culpa dos reality-shows, que retroalimentam os sonhos daqueles que não possuem talento para estrelar no restrito universo artístico. A oitava edição do Big Brother Brasil foi um record, superando os 200 mil inscritos.
Nos Estados Unidos, a lógica dos reality shows com "pessoas comuns" foi por água abaixo e não chama mais atenção do grande público. Por lá, o lance é explorar aspectos ainda mais bizarros da condição humana. A nova aposta da televisão norte-americana é manter sob vigilância celebridades decadentes em uma clínica de reabilitação para drogados e alcóolatras. É o Celebrity Rehab With Dr. Drew, que estreou nos EUA essa semana.
O desafio é largar o vício e ficar sóbrio em rede nacional. O programa começa mostrando os participantes no pleno exercício de seu vício, antes de ir para clínica. Um deles é a atriz Brigitte Nielsen (ex-senhora Silvester Stalone), que mamou uma garrafa de vodca no gut-gut antes de entrar na casa. Outro é o ator Jeff Conaway (da sitcom Taxi, dos anos 70), que está tão emboletado por ter ingerido uma mistura de álcool e comprimidos que sua fala precisa ser traduzida com legendas para o telespectador. Só estão esperando Amy Winehouse parar de vender discos pra mandá-la ao Celebrity Rehab.
Ratos de laboratório − Sabe como nasceu a idéia do Big Brother? Tudo começou quando o empresário John Demol, lendo um artigo na revista Biosphère, teve a idéia de filmar, dia e noite, cobaias humanas em condições similares à de ratos de laboratório. Batizado de Big Brother, o conceito virou show televisivo em setembro de 1999, atraindo 55 % da audiência.
Após sua explosão na Holanda, o programa foi transmitido para 27 países. Hoje, Demol produz em sua empresa, a Endemol, cerca de trezentos programas para o mundo inteiro. Relendo o velho Guy Debord, o esperto John Demol descobriu o grande trunfo teórico que viabilizou a criação do seu programa: "quem fica sempre olhando, para saber o que vem depois, nunca age: assim deve ser o bom espectador".
Os objetivos comerciais do empresário também se espelham em outra justificativa formulada na teoria espetacular de Debord: "O espetáculo é o capital elevado a um tal grau de acumulação que se torna imagem". No caso do Big Brother Brasil, botar sua imagem à venda equivale concorrer a R$ 1 milhão. Mas não é garantido que você vai ganhar. Mesmo assim, vai querer?

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

sÓ nÃO vALE qUEIMAR*

Idade Média, peste negra, cadáveres de duas cabeças, lobisomens, naves espaciais movidas por partículas psíquicas, planetas remotos, rock. A aparente algazarra de alusões é chave para entender a reputação que escritor italiano Valerio Evangelisti conquistou entre leitores europeus.
Em O Inquisidor, segundo romance dele traduzido pela Conrad Editora, Evangelisti (na foto) engendra uma trama sobre conspirações, heresias e mistérios investigados pelo padre dominicano Nicolau Eymerich.
Em sua obra, o ponto em comum é o claro pendor para gêneros brutais e velozes do rock. Volumes de energia punk e heavy metal pontuam o ritmo dos enredos fantásticos criados pelo autor, que também colabora com a edição italiana da Rolling Stone. (Cristiano Bastos)
Na trilogia O Ciclo do Metal há citações que vão do punk ao heavy metal. Como o rock afeta sua obra?
Alguns momentos fortes saem direto do rock. Às vezes, um trecho de uma música sugere uma visão: góotica, se estou ouvindo heavy metal, ou de ação, no caso do punk rock.
Porque a escolha de Chaos A.D., do Sepultura para estrear sua coluna na Rolling Stone italiana?
Por muito tempo as bandas de metal imitaram os modelos anglo-saxões, incluindo o Sepultura. Mas o álbum Chaos A.D. é muito diferente, com canções inspiradas em por danças tribais e pela realidade social do Brasil. Foi algo novo no metal. A obra-prima veio depois, com Roots, mas Chaos A.D foi o verdadeiro marco que influenciou o metal em todo o mundo.

O heavy metal ainda está vivo e atuante? Qual é seu futuro?
Se velho heavy metal está um pouco cansado, o gênero é grande o suficiente para se renovar. Existem muitas bandas experimentando novos estilos. Na Europa, a mais popular é o Rammstein, da Alemanha, com seu bizarro "dance metal". Mas, em todos os lugares, há músicos trabalhando. Não acho que o metal morrerá tão cedo!
*Entrevista publicada na Revista Bizz, edição de fevereiro de 2006.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

iPOD'S 20

As mais pedidas no iPod:

“Yea Yeah Yeah Song” – Flaming Lips (At War Whit the Mistics)
“Next Big Thing” – Dictators (Go Girl Crazy!)
“I Love Rock’n’Roll” - Jesus & Mary Chain (Munki)
“I Hat Rock’n’Roll” – Jesus & Mary Chain (Munki)
“Baby Snakes” – Frank Zappa (Sheik Yerbouti)
“Folsom Prison Blues” – Johnny Cash (Live At Folsom Prison)
“Magical Colors” – Jon Spencer Blues Explosion (Acme)
“I Beg your Pardon” – Kon Kan (Kon Kan)
“Happy Together” – Turtles (The Turtles)
“Special” – Violent Femmes (Blind Leading The Naked)
“Venus” – Television (Marque Moon)
“Último Verão” – Julio Reny (Último Verão)
“Sexx Laws” – Beck - (Midnite Vultures)
“Casino Royale Theme” – Burt Bacharach (Original Soundtrack)
“The Thrill is Gone” – Chet Baker (Deep in a Dream)
“Resolution” – John Coltrane (A Love Supreme)
“Place to Be” – Nick Drake (Pink Moon)
“Caravan” – Van Morrison (Moondance)
“Rocks” – Primal Scream (Dirty Hits)
Hard Luck” – Undertones (The Best Of Undertones)

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

fRUIT tREE

A Island Records lançou uma nova edição da caixa Fruit Tree, de Nick Drake. Mais do que previsível, essa deliciosa luxúria não vai ser lançada no Brasil. As embalagens dos três únicos àlbuns oficiais de Drake, Five Leaves Left, Bryter Layter e Pink Moon ganharam o formato de réplicas das edições dos discos em vinil.
O box é acompanhado do DVD do filme A Skin Too Few - The Days of Nick Drake, um documentário sobre a vida e a obra do atormentado músico. Não espere por imagens raras ou registros de apresentações ao vivo de Nick Drake. Como se sabe, ele não deixou nenhuma. Fruit Tree também não traz o volume de raridades Time of No Reply. No entanto, todas os bootlegs possíveis de Drake, como Tanworth-in-Arden, The Complete Home Recordings e Second Gracem estão disponíveis para download no blog Time Has Told Me.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

kINDA kINKS

Toda vez que um gigante do rock manda recado que vai despertar de uma sonolenta temporada de hibernação, não é a emoção que fala mais alto – é o pé-atrás. Depois do ostracismo, a volta dos dinossauros aos palcos e aos estúdios cheira a golpe ou recende à naftalina. A reação alérgica de abrir o guarda-roupa da casa de praia que ficou fechado por uns verões.
Muita gente vibrou com a volta dos Stooges, mas nem os mais fanáticos sabem o nome de uma música do novo The Weirdness. Eu sei: “My Idea for Fun”, que tem jeito de "No Fun” recauchutada. Os New York Dolls lançaram One Day it Will Please Us to Remember Even This, mas não tem muita graça sem Johnny Thunders e Arthur Kane Killer.
A imortal empolgação com as músicas do The Who não justifica desembolsar algumas pratas pra ver Pete Townshend e Roger Daltrey se aturando pra dar uma última carga de energia em “My Generation” e “Can’t Explain”. São os velhos álbuns que vão preservar a perenidade da banda para as futuras gerações de roqueiros que vão se suceder no inexorável hype de amanhã. É difícil imaginar onde e como Townshend arrumaria forças pra novamente sacrificar uma guitarra como nos áureos tempos. No Who, outra parte do mojo perdeu-se há bastante tempo, quando Keith Moon, a força motriz da banda, se foi entre boletas e baquetas.
A mesma expectativa em relação ao retorno do Led Zeppelin previsto pra esse ano. Sabe-se que Robert Plant detonou sua voz abusando de tantos agudos e que Jimmy Page e sua cabeleira branca, revelada em fotos recentes, é o retorno da múmia em pessoa. Pelo menos no imaginário dos fãs, o gogó de Plant ainda conserva a forma dos anos 70, assim como Page nunca deixou de ser o guitarrista incendiário de “Black Dog”. Mas que ele deve estar tocando melhor do que nunca, isso sim. A verdade é que sempre tem uma multidão saudosista disposta a financiar a volta de todos os mortos-vivos do rock – então, who cares? Viva a necrologia do pop!
Na volta de um sobrevivente como o MC5 – show que vi com os próprio olhos em 2005 – a expectativa latente era de se reviver a emoção genuína que se tem ao ouvir o disco Kick out The Jams: virulência punk em alta octanagem, duelos sônicos de guitarra e deleite noise. A banda, ainda que desfalcada de Fred Sonic Smith e Robin Tyner, claro, fez de tudo para concretizar o sonho coletivo presenteando a todos com um simulacro quase perfeito dessas nossas expectativas. Saí de lá enganado e feliz. Se faz uma ressalva pro MC5: a banda não fazia apresentações desde que se separou, há 35 anos atrás.
Se você não concorda com nada escrito até aqui, tudo bem – foi só um nariz de cera pra justificar que também tenho defuntos que gostaria de ressuscitar enquanto a morte não ceifa as almas que restaram no panteão de heróis clássicos do rock. Se eu tivesse chancela divina (ou financeira) pra isso, não resta dúvida de que a primeira banda pra qual daria o meu "sopro de vida" seria The Kinks. Eles estão no topo da minha lista além-túmulo.
Something Else By The Kinks – Fãs como eu, que passaram a adolescência – e ainda na idade adulta – sonhando ver os Kinks tocando “Waterloo Sunset”, “Till the End of the Day”, “All Day All Night”, “Set me Free”, “Picture Book”, “Lola”, podem soluçar à vontade. Ray Davies, o homem a frente dos Kinks, anunciou que a banda vai se reunir em 2008. Davies é um dos maiores cronistas do Império Britânico e, antes de assumir esse papel, foi o grande hitmaker da Britsh Invasion. Ele é o cara.
Na obra dos Kinks estão os melhores álbuns de rock já gravados nos anos 60 e 70. A banda nunca alcançou dimensões gigantescas de público, de estrutura ou de fama e sempre foi mais cultuada do que popular, então, nunca se desgastaram em espetáculos megalomaníacos. Quem já ouviu sabe que a maioria das canções dos Kinks são à prova de envelhecimento. Se você é neófito e se interessou, fácil, vá na internet e ache um the best of da banda. Depois deixe por conta da sensibilidade. Catequizado, siga para o resto, atacando nas principais fases da banda.
A fase guitar band (The Kinks, Kinda Kinks, The Kinks Kontroversy, Face to Face); psicodélica (Something Else By The Kinks, The Kinks Are the Village Green Preservation Society, Arthur – Or the Decline and Fall of the British Empire); hard caipira (Lola versus Powerman and the Moneygoround Part One, Muswell Hillbillies); conceitual (Preservation Act 1, Preservation Act 2, Soap Opera); e até glitter (Sleepwalker).
Agora, o melhor de tudo nos Kinks: eles não gozam da importância e da seriedade canônica dos contemporâneos Beatles. Essa coisa de insuperabilidade que é imperativa e chega a ser irritante. Estabelecer o posto de “Melhores de Todos os Tempos” para o Fab Four é adimitir importância menor para todo o que surgiu antes e depois deles. Ser mais mortal preservou nos Kinks boa parte da mística que, nos Beatles, perdeu-se por causa da massificação. O quarteto de Liverpool já teve o DNA inteiramente desvendado, graças a exegese exagerada da sua obra e aos lançamentos oportunistas que chegam no mercado todos os anos.
Ray Davies fez o anúncio da volta durante o lançamento do box set Retrospective e aproveitou pra desabafar sobre a sua carreira solo. Davies disse que gostaria de voltar a tocar com os Kinks: “Você sente falta da interação. Com outros músicos é diferente, não tem a mesma paixão”. Vejo essa sanha de tocar como “a” diferença no vôo de regresso de qualquer desses pterodátilos do rock. Imagine (mas não faça trocadilhos) Lennon e McCartney se reunindo pra reativar os Beatles. Se já naquela época eles não tocavam...
Como as letras de Davies, os Kinks tiveram uma trajetória peculiar. Colocaram inteligência e literatura no psicodelismo, foram venerados pelos punks no final dos anos 70, presenciaram e usufruíram do nascimento da MTV nos anos 80 e terminaram sem gravadora e com discos de baixa vendagem no começo dos 90, convivendo lado a lado com bandas que influenciava, como The Fall, Blur e Pretenders (Chrissie Hynde foi a ex-senhora Davies). Deixaram um legado de mais de 30 discos, entre álbuns, coletâneas, trilhas sonoras e dezenas de singles que ainda inspiram o rock alternativo mundo afora.
♪ Girl, you really got me goin ♪ - Em 2007, o hit “You Really Got Me” (número 1 em todo o Reino Unido) completou 42 anos. Pra sacar a importância dessa música, é bom lembrar que Ozzy Osbourn disse mais de uma vez que, se não fosse ela, provavelmente, o Black Sabbath não teria existido. É fácil imaginar Ozzy e Ritchie Blackmore dando cabeçadas no balanço contagiante de “You Really Got Me”. Depois dela, os riffs powerchord, ou seja, baseados em acordes fortes e poderosos, foram a base de clássicos do hard rock pesado como “Smoke On The Water”, do Deep Purple, "Heartbreaker", do Led Zeppelin e "Paranoid", do Black Sabbath.
O som inflamado de guitarra de “You Really Got Me” é mérito do irmão de Ray, o guitarrista Dave Davies, um dos membros originais dos Kinks. Dave conseguiu o timbre único dessa música com uma Harmony Meteor de segunda mão ligada a um amplificador Vox AC-30. O guitarrista furou o alto-falante com um lápis e espetou algumas agulhas de costura. Assim, fez com que o som da guitarra soasse especialmente rachado e distorcido. Resultado: nenhum guitarrista da época (1964) jamais conseguiu reproduzir o efeito de Dave e do seu destruidor experimento. Em termos de barulho, os Kinks foram a vanguarda. O páreo continua duro até hoje.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

aS mIL vIDAS dE dYLAN

É fácil dizer porque Tod Haynes conseguiu transformar I’m Not There numa majestosa cinebiografia sobre o maior gênio da música do século 20 – Robert Allen Zimmerman, melhor reconhecido como Bob Dylan. Simples, Haynes entendeu que Dylan viveu a vida de mil homens juntos.
I’m Not There tem o atributo de provocar nos fãs ardorosos um longo suspiro e, da mesma forma, instigar a fração do público que, ingenuamente, pensa que ele se reduz ao prosador fanhoso e profético de "Blowing in the Wind". Se bem que, se Dylan tivesse vivido só a vida do profeta, já teria sido satisfatório.
O cineasta Tod Haynes é um aficcionado por "cultura pop". Refazendo o conceito: Haynes é uma aficcionado pela história da música pop, o que não é apenas questão de ordem semântica, mas porque a expressão encerra uma significação muito mais profunda. Diminuindo ainda mais para maximizar o entendimento: ele é um aficionado pela história da música. Ponto.
O termo cultura pop está mais para fenômeno da natureza do que para léxico definidor de "conjunto de conhecimentos". Apesar das bobagens açucaradas produzidas pela fábrica de entretenimento musical, cultura pop, no fundo, é apenas o que Roland Barthes chamou de fait divers. Nascimento de bezerros de duas cabeças, gêmeos grudados pelo ventre, crianças com três olhos, micro-anões. Ou seja, tudo o que, além dos fatos, é lido como "notícia" nos jornais. No rock, é saber pelos tablóides que Damon Albarn, do Blur, namorou Justine Frischmann, do Elástica, e tomou um fora da mocinha. Diferente de saber, por exemplo, que é o baixista Bill Wiman que ronca na música "She's a Rainbow", do disco Their Satanic Majesties Request, dos Stones. Isso é fato.
Como a própria vida de Dylan, I’m Not There, que ainda não entrou em cartaz no Brasil (mas pôde ser assistido no IX Festival Internacional de Cinema de Brasília e em outras mostras pelo país), não é um filme fácil. É como um cut-up alucinado de fatos e imagens, cheio de ida e vindas, voltas e reviravoltas. Os neófitos devem ter saído "boiando" da sessão, porque em nenhum momento o filme persegue uma cronologia dos acontecimentos. O que mais deve ter confundido a cabeça de muitos foi a solução inteligente do diretor, ao colocar vários atores para interpretar diferentes fases da vida de Dylan com atuações completamente metafóricas. Funcionou perfeitamente.
Tem o garoto negro de onze anos (Marcus Carl Franklin) que perambula com um violão se apresentando como Woody Guthrie, que foi o maior mentor de Dylan; um sábio surrealista (Ben Whishaw) cuja atuação é apenas proferir charadas repletas de simbologia, representando o fascínio de Dylan pelo poeta Arthur Rimbaud; o velho excêntrico Billy The Kid (Richard Gere) percorrendo o Velho Oeste em retiro voluntário do mundo moderno - na verdade, um paralelo à estadia de Dylan em um local retirado próximo a Woodstock, no estado de Nova York, onde se reuniu com a The Band e gravou o álbum The Basement Tapes.
E a maior sacada de todas: uma chapadona Cate Blanchet interpretando o provocador Dylan que chocou a Inglaterra, enrolou o primeiro baseado do Beatles (eles aparecem como quatro bobalhões fugitivos da alucinada turba feminina) e enfrentou a imprensa britânica. Diante do pedido suplicante de um jornalista para "dar uma palavra para a imprensa", ele responde com o sarcasmo lacônico dos incompreendidos: "cosmonauta".
O subtítulo do filme já entrega o estilo da narrativa - “Inspirado nas várias vidas de Bob Dylan”. Dylan aprovou o formato da produção e permitiu a Haynes a mais rara das concessões: o direito de usar músicas originais e covers no filme. Era pra David Bowie ter feito o mesmo em Velvet Goldmine (1999), o filme de Tod Haynes sobre o glitter rock, inicialmente concebido para homenagear o alter-ego do cantor, Ziggy Stardust. Só que o astro não aprovou o filme e ainda proibiu Haynes de utilizar suas músicas. Ficou apenas o nome, Velvet Goldmine, título de canção do b-side de um single de Bowie.
Haynes, fã de Dylan na adolescência, voltou a escutar o velho poeta à beira dos quarenta anos, quando iniciou o roteiro do drama Longe do Paraíso, de 2002. Começou a vasculhar músicas e a ler biografias do artista e ficou perplexo com todas as transformações de Dylan: "O que mais escutava de todos os relatos sobre ele era sobre uma vida de infinitas mudanças, de uma maneira muito mais profunda em termos culturais do que as modificações camaleônicas de David Bowie ou Madonna que ocorreriam décadas mais tarde", comentou.
Mudanças que tiveram profundos efeitos intelectuais, culturais e quase físicos no público de Dylan: "Ele liquida com tudo que você acredita, todos os seus padrões e conceitos. Ele sacode tudo aquilo que as pessoas construíram para servir-lhes de base. Sempre que você pára para prestar a atenção nele, ele já está em outro lugar. Achei que a única forma de contar uma história em um filme sobre ele seria exacerbando esse fato, usando isso como o princípio para organizar a narrativa, ou as narrativas".
I'm Not There reproduz com fidelidade passagens marcantes da carreira de Bob Dylan, como o famoso show de 1966, no Royal Albert Hall, Inglaterra, em que um fã grita "Judas!" e Dylan responde, exclamando: "Eu não acredito em você!". A melhor resposta para uma acusação cretina.
Memorabilia - Desde 2001, Bob Dylan vem revelando quem é o verdadeiro Robert Allen Zimmerman. Em cinco anos, Dylan abriu seu baú de memórias. Lançou o livro Down the Highway: The Life of Bob Dylan (Conrad Livros), biografia assinada por Howard Sounes. Em 2005, publicou o volume um de Crônicas (Editora Planeta), onde o próprio Dylan relembra o passado em textos curtos. Depois, saiu o imperdível documentário para televisão No Direction Home, de Martin Scorsese (disponível em DVD). E, no ano passado, ele ainda lançou o aclamado e excelente álbum Modern Times (2006). Veja, reveja e junte tudo isso. Ainda vai faltar todo o resto para entender o mínimo sobre Bob Dylan.

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

eNTERTAINMENT

O baixista Dave Allen liberou quatro músicas inéditas do Gang of Four no seu ótimo blog, o Pampelmoose - Music Media Web. “Second Life”, “Password", "American Man" e "Fakin'It" vão fazer parte de um EP que a banda pretende lançar no começo de 2008.
"É pra mostrar que estamos trabalhando firme, e não só acomodados debatendo Situacionismo ou o colapso da indústria fonográfica", brincou Allen. O baixista também postou um vídeo do Gang of Four no backstage em Instanbul tocando “I Love a Man in a Uniform” antes do show.

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

aRTE, vIDA & mEDITAÇÃO

"Vocês podem dizer: 'Ok, David Lynch é maluco. Então eu digo: porque não experimentar!?'". É assim que o realizador de Twin Peaks chama a atenção das pessoas sobre a sua militância pela meditação transcendental. Lynch define-se como engajado praticante há mais de três décadas.
Para o cineasta, a meditação conduz à felicidade universal: "Um oceano de consciência sem limites - eterno, profundo", comparou.

No último domingo, 18, o diretor norte-americano David Lynch esteve em Estoril (Portugal) para receber o Prêmio de Carreira do European Film Festival, onde foi saudado com uma completa retrospectiva da sua carreira cinematográfica. Lynch deu ensinamentos de meditação transcendental à imprensa e chegou mesmo a criar uma típica "atmosfera lynchiana". A começar pela sua masterclass de produção: A Arte, a Vida e a Meditação Transcendental.
Meditação transcendental não é religião, deixou bem claro: "É uma técnica meditativa que abre as portas que nos levam ao mais profundo dos estados da consciência", disse o cineasta. E lembrou a todos com a estranha sabedoria que lhe é peculiar: "Estamos na superfície da vida. Todos temos consciência, mas nem todos em um mesmo nível".
Lynch acredita que a prática da meditação transcedental (que ele descreveu como uma "claridade doce e elétrica que traz ondas de felicidade") leva à paz real. Aos atores, recomendou a meditação como ferramenta de busca de criatividade, felicidade e disponibilidade. E para afastar a negatividade – o pior dos venenos, expressou o cineasta.
Sobre os seus filmes, falou que as idéias sempre surgem em fragmentos e brincou que, depois de descobrir o paraíso das câmaras digitais, durante sua última produção, Inland Empire (2006), ficaria doente se fosse obrigado a rodar outro filme em celulóide. Lembrou que cinema não é só intelectualidade: "Boa parte deve ser intuição", defendeu.
Há dois anos, David Lynch organizou uma fundação para financiar pesquisas sobre os efeitos positivos da meditação transcendental (ouça aqui a entrevista que ele deu para a World Radio sobre o assunto). Um dos planos mais ambiciosos é a construção do complexo "Palácios da Paz", cujo projeto inclui a edificação de sete centros inteiramente voltados à disseminação de técnicas avançadas da disciplina. Antes de seguir ao aeroporto, Lynch hasteou civicamente uma "bandeira da invencibilidade da meditação trancendental" ao som do Hino Nacional de Portugal. Nada menos estranho e mais apropriado.

fILMOGRAFIA dAVID lYNCH

Curtas
2002 - Darkened room
1995 - Lumière: Premonitions Following an Evil Deed
1990 - Industrial Symphony No. 1: The Dream of the Broken Hearted
1989 - The Cowboy and the Frenchman
1974 - Amputee, The
1970 - Grandmother, The
1968 - The Alphabet
1966 - Six figures getting sick

Televisão
1990 - Twin Peaks
1990 - American Chronicles
1992 - On the Air
1993 - Hotel Room

Longas
2006 - Inland Empire
2001 - Mulholland Drive (Mulholland Drive)
1999 - The Straight Story (História real)
1997 - Lost Highway (A estrada perdida)
1992 - Twin Peaks: Fire walk with me (Twin Peaks: Os Últimos dias de Laura Palmer)
1990 - Wild at Heart (Coração Selvagem)
1986 - Blue Velvet (Veludo Azul)
1984 - Dune (Duna)
1980 - The Elephant Man (O Homem Elefante)
1977 - Eraserhead

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

fLU

O baixista Flávio Santos, o Flu, é da formação clássica do De Falla, nome que a banda gaúcha escolheu para homenagear o erudito Manuel De Falla (1876-1946). Ou, sabe-se lá, simplesmente por causa da excentricidade melódica do nome do compositor espanhol.
Entre as décadas de 80, 90 e 00, o De Falla manufaturou hits em série - "Não Me Mande Flores", "Repelente", "It´s Fuckin Borin to Death", "Screw You, Susie Doll", "Popozuda Rock’n’Roll". Músicas que nunca desfilaram entre as mais pedidas, mas financiaram o lugar da banda na história do rock brasileiro. Desafiadoras e potentes, as releituras infernais que o De Falla fez pros balanços "Sossego" e "Como Vovó Já Dizia", anteciparam em uns bons anos a colisão explosiva entre hard rock, funk e mpb.
Quando o De Falla se desintegrou, Flu dedicou-se à novidade dos softwares de gravação. Experiência que, no De Falla, foi testada com o piloto Kingzobullshit Backinfulleffect, de 92, ao flertar rock com eletrônica. No seu primeiro álbum solo, E a Alegria Continua, de 1999, Flu combinou bossa nova, rock experimental, psicodelismo e lounge music com o slogan "uma idéia na cabeça e um computador na mesa".
Em 2003, lançou na praça No Flu do Mundo, disco editado pelo selo Instituto/YB com distribuição da Trama. "O rock foi minha escola. Só aprendi a gostar de mpb depois de velho, quando comecei a ouvir música instrumental dos anos 60. Coisas tipo Miltinho, Oscar Castro Neves, Soul Bossa Trio e Tamba Trio", conta o baixista que, atualmente, mora e trabalha no Rio de Janeiro.
Como sócio e produtor da Deff Produtora de Áudio, Flu remixou faixas de Otto, Bidê ou Balde e Nervoso e fez a direção musical do filme Tolerância. Um novo disco, ainda sem selo, deve ser lançado em março do ano que vem. A participação do velho parceiro Edu K não está descartada: "Acho difícil - não impossível. Musicalmente a gente anda meio distante. Talvez role algum encontro maluco. Quem sabe...".
[[DESORIENTAÇÃO]] Você disse que tá fechando parcerias pra lançar um novo disco ainda esse ano. Algum paralelo com os anteriores?
Eu vim pro Rio de Janeiro em 2004 com o objetivo de fazer um trabalho novo. Já estamos 2007... Estamos numa nova era de produção. Tem que se dedicar totalmente ao trabalho ou ir fechando algumas idéias com o tempo. Optei pela segunda opção, pois sempre é preciso correr atrás dos pilas. Tenho feito contato com muitas pessoas pra firmar parcerias de composição e produção. Duas delas já estão prontas, outras duas encaminhadas e várias estão por começar. Já fechei com Rafael Crespo (ex-Planet Hemp) e com os Ritmistas (Dany Roland, Stephan San Juan e Domenico Lancelotti). Estou produzindo com o Gordo Miranda e com o João Brasil. Já fiz contatos com Dado Villa Lobos, o estúdio Toca do Bandido (que era do Tom Capone), Marcelo Fruet, BNegão, a banda Do Amor (Rio de Janeiro) e Junior Tolstoi (guitarrista do Lenine).Estou sempre à procura de um som. Me descobrir, descobrir influências e achar caminhos. Nesse processo, as coisas ficam com uma cara. Mesmo que seja a minha.
[[DESORIENTAÇÃO]] Porque a idéia de gravar cada música num estúdio diferente?
Principalmente pra deixar registrado esses encontros e pra mostrar o som e o estilo de produção de cada parceiro. Claro que sempre vai ter um pouco do que penso sobre produção. Tenho deixado rolar. Ainda não consigo ter idéia de como vai ficar o resultado final, mas com certeza terá uma interessante característica de junções e pensamentos. Pelo menos é isso que procuro.
[[DESORIENTAÇÃO]] Como anda Porto Alegre pra música? O mercado está melhor no Rio?
Com a invenção da banda larga, muita coisa mudou. A troca de arquivos de músicas na internet é intenso. Muita gente descobrindo coisas novas. Isso faz com que o dito mercado musical tenha uma drástica mudança. Não se fala mais em preços abusivos de cds, pois não vendem mais. A pirataria também já está em queda. Sou muito a favor da democratização da cultura. Que o povo tenha acesso fácil ao novo. Só assim é que algo realmente pode mudar na cultura contemporânea. Porto Alegre sempe foi do rock. Tem rádios e uma forte ligação com o rock. Isso é legal até o ponto de se tornar preconceito. Lá, me senti muito "estranho no ninho" com o som que faço. Minha banda acabou virando de rock. Não que não gostasse, mas parece que tava sendo induzido a isso. Mesmo assim, não consegui fazer parte das turminhas alternativas. E nem de música eletrônica. Mesmo incoscientemente, o pessoal da música é bem careta na maneira de olhar pro seu trabalho. Eles se dedicam mais as influêcias e idolatrias do que exatamente procurar por arte. Aqui no Rio, como samba e chorinho são muito fortes, a mistura de estilos é natural. Se vê muitas bandas misturando muita coisa e não se fala muito em estilo. Não existem os gravatinhas, os jaquetinhas e nem a turma mod. Têm muitas pessoas fazendo música. Se vai ficar bom ou ruim só o tempo mostrará.
[[DESORIENTAÇÃO]] E a versão de "Não me Mande Flores" que você regravou, o que tem de novidade?
Inclui uma versão da música no repertório dos shows com Os Dubem, que era minha banda em Porto Alegre. Eu senti que a canção tinha muito a ver com o que estava fazendo, manipulando rock com outros elementos. Daí rolou o primeiro arranjo. A versão que gravei com o Rafael Crespo ainda tem resquícios desse arranjo. Tem a pegada rock, mas a maluqueira ficou mais forte. Tem intervenções de eletrônicas e guitarreiras doidas. Acho que ficou bem diferente das versões do De Falla e do Urubu Rei.
[[DESORIENTAÇÃO]] O novo disco vai mesmo se chamar Di-Versão?
Di-Versão foi o nome que pensei caso o disco fosse todo de versões de músicas que gosto. Mas vai ser variado. Ainda não pensei no nome. O conceito vai ser da destruição total de preconceitos. Quero mostrar que o Século 21 tem que se render ao bom senso. Nada é bom ou ruim. Ambos tem seu valor!
[[DESORIENTAÇÃO]] Saudades dos tempos do De Falla?
Gosto muito de história. Adoro meus companheiros de banda. De todas que já tive e de todas que terei. Acho sempre importante o aprendizado que as pessoas trazem pra nossas vidas. Mas não sou saudosista. Já fizemos uma volta em 2005. Foi divertido. Estamos conversando pra, talvez, dar uma nova ativada. A gente gosta do que fez e sempre é bom tocar com os amigos. Espero que role muitas reuniões – até porque, a gente nunca falou que a banda acabou. Volta o e meia alguém se adona do nome e lança alguma coisa...
[[DESORIENTAÇÃO]] Alguma parceria com o Edu K?
O Edu K é um parceiro musical e amigo muito importante. Aprendi muita coisa com ele. Mesmo sem ele saber disso. O cara sempre foi um criador e destruidor – quase ao mesmo tempo. Estávamos sempre nos recriando no palco e nos discos. Ele era o cabeça. Claro que, depois de um tempo, ele tomou conta geral de tudo. Daí ficou meio chato. Mesmo assim, achei importante fazer parte de todos os momentos dessa convivência. Muito do que sou hoje veio dessa época. Vem de muitos fatores, mas Edu K é um fator importantíssimo! Acho uma parceria meio difícil, mas não impossível. Musicalmente a gente está meio distante. Talvez em algum encontro maluco. Quem sabe...

dE fALLA (1988)

O segundo álbum o do De Falla, apelidado pelo vocalista Edu K de It's Fuckin Boring to Death (controverso, pois o nome só é perceptível na lombada do vinil), é o último disco da banda pelo selo Plug da major BMG.
Cercados pela crítica, que aguardava novo sopro de criatividade, o DeFalla não frustrou as expectativas: do pós-punk do primogênito LP, partiram pro crossover maluco de rap, funk e heavy metal, em 1988 - o que prova que estavam ligados nas últimas tendências estrangeiras que, há vinte anos, recém saíam do berço.
São perceptíveis as influências de Run-DMC, Beastie Boys e Red Hot Chili Peppers, sem que a banda perdesse de vista microfonias, vinhetas absurdas e letras fundindo português e inglês (como em "I Have to Sing a Song"). O De Falla também não fez concessões à peculiar obssessão pelos temas sexo & violência. O disco é um dos pioneiros do uso do sampler no Brasil. Entre outras colagens, quem prestar atenção pode sacar uma fala de Denis Hopper no filme Veludo Azul, de David Lynch.
Logo na abertura, a versão upgrade de "Como Vovó Já Dizia", de Raul Seixas, numa versão rap com muitos escratch e batidona arrasa quarteirão. Na opinião do guitarristra Mini, dos Walverdes, esse disco sintetiza parte importante do espírito do rock gaúcho - que é estar extremamente conectado no que está rolando mas, ao mesmo tempo, cultivar certa atitude de "não tô nem aí para nada": "Nesse álbum, a mistura de pop, hip-hop, rock, pós-punk e funk soa incrivelmente chinela e sofisticada ao mesmo tempo".
A insanidade prossegue faixa após faixa, como na versão desconstruída de "Revolution" (que era pra ser uma versão dos Beatles e, como não ficou nada semelhante à original, virou música do De Falla mesmo) e no hit "Repelente". O "lado B" começa com "It´s Fuckin Borin to Death" - cuja letra cita o filme Nascido para Matar, de Stanley Kubrick - e prossegue com o groove demoníaco de "Satã (é coisa do diabo)". Tonho Croco, da Ultramen, confirma a diversão: "Gastei o vinil e a fita cassete de tanto ouvir!".

quarta-feira, 31 de outubro de 2007

1001 dISCOS

Quase dois quilos pesam os "1001 discos para ouvir antes de morrer (Sextante, R$ 45, em média)", lançado recentemente no Brasil do original inglês 1001 Albums You Must Hear Before Die. Robert Dimery e Michael Lydon são os coordenadores editoriais deste compêndio de 950 páginas. Dimery colabora com as revistas Time Out e Vogue e escreveu The Rise And Fall Of The Stone Roses. Lydon é um dos fundadores da Rolling Stone e biografou a vida de John Lennon.
Para definir a lista dos 1001 discos, Dimery mobilizou 90 jornalistas e críticos de música de todo o mundo. A lista não é imaculada (e qual é?), mas o livro fica além de simples inventário de música pop. Seria melhor classificado como uma excursão cronológica pela história da indústria fonográfica. Passeio que parte do álbum In The Wee Small Hours (1955), de Frank Sinatra, e vai até Get Behind me Satan (2005), do White Stripes.
Fora a variedade das informações, cada álbum foi contextualizado historicamente com detalhes sobre produção, design e lista de canções. Só as imagens das mais de 900 capas, artistas e bandas valem a aquisição. A única coisa duvidosa foi a escolha de Syd Vicious para ilustrar a capa da edição brasileira. Nos tempos de Never Mind the Bollocks, único disco dos Sex Pistols que aparece no livro, Syd nem era da banda.
O grande gênero privilegiado é o rock, mas todos os estilos estão lá: soul, dance, world music, hip-hop, rap, jazz, bossa nova, eletrônica, blues, punk, heavy metal, disco, experimentalismo. Para o Brasil, a lista reforça o quanto a música nacional ganhou reconhecimento planetário de anos pra cá. São destacados cerca de 20 discos famosos da MPB.
Entre eles: Francis Albert Sinatra & Tom Jobim (1967), Stan Getz e João Gilberto (Getz Gilberto - 1963), Astrud Gilberto (Beach Samba – 1967), Mutantes (Os Mutantes - 1968), Caetano Veloso (Caetano Veloso - 1968), Milton Nascimento e Lô Borges (Clube da Esquina – 1972), Jorge Ben (Africa/Brasi - 1976), Elis Regina (Vento de Maio - 1978), Sepultura (Arise – 1991/ Roots – 1996) e Bebel Gilberto (Tanto Tempo - 2000).
O livro também apresenta as obviedades de sempre: What's Going On, de Marvin Gaye, The Rise And Fall Of Ziggy Stardust, do Bowie e London Calling, do The Clash, são tão previsíveis quanto uma nova tour do Deep Purple no ano que vem. O equilíbrio é possível pela inclusão de estranhices como Einstürzende Neubauten e Aphex Twin. O Radiohead é o grande excesso. Todos os álbuns da banda foram comentados - faltou apenas falar de Pablo Honey, mas isso seria demais da conta. Britney Spears e Mariah Carey são bobagens inevitáveis.
Os textos são bem escritos (a edição brasileira pecou na tradução ao errar o sexo de alguns artistas) e envolventes e, com a leitura, mesmo bandas aborrecidas como Dire Straits e Boston se tornam mais ou menos atraentes. A cada folheada, o impulso de sair correndo pro eMule e baixar o livro página por página. Uma obra para atiçar os neófitos e estimular a curiosidade dos colecionadores de rock.
Go Girl Crazy! (1975) - Dictators
Em 1975, dois rapazes norte-americanos, Legs McNeil e John Holmstrom, gastaram a maior parte do seu verão ouvindo o álbum Go Girl Crazy!, dos Dictators. Embebedavam-se todas as noites e acabavam aos gritos cantando cada uma das canções do disco. Não muito tempo depois, estes dois rapazes foram os fundadores da revista Punk, uma das bíblias desse movimento anárquico que eclodiu nos últimos anos da década de setenta. Tal como os New York Dolls, os The Dictators eram precedentes do punk. Anos antes de se ouvir falar dos Ramones, Dead Boys e dos Sex Pistols, Dick Manitoba, a "arma secreta" dos The Dictators, já cantava sobre vomitar comida no McDonalds, beber cerveja e assistir a filmes duvidosos de série B. Go Girl Crazy! foi um dos primeiros discos punk, muito antes de se ouvir falar dessa definição. Mas oferecia muito mais: sons de garage surf e heavy metal – o guitarrista Ross "The Boss" Funichello fundou muito mais tarde os Manowar. Os The Dictators conseguiram inúmeros admiradores, em parte graças ao sentido de humor da banda. O disco incluía todos os ingredientes para ser um êxito, mas os acontecimentos tomaram um rumo infeliz. Pouco tempo depois do lançamento do álbum a Epic despediu-os: má gerência, turnês mal planejadas e brigas entre os membros da banda não ajudaram. O álbum não atraiu grande interesse até 1977, momento em que bandas como os Ramones tinham já polido a sua própria marca punk. Os Dictators foram marginalizados. No entanto, Go Girl Crazy! chegou primeiro.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

sOUNDTRACK dE uMA gERAÇÃO*


Por Cristiano Bastos
Não parece, mas trinta velinhas já foram assopradas desde que, nos remotos 1977, o punk partiu o rock ao meio. Nem por isso o grande documentário da época, Punk Rock Movie, tem qualquer edição comemorativa prevista no Brasil.

Tudo bem - para isso existe o Google Video. Lá o filme pode ser assistido na íntegra. Registrado em Super8 por Don Letts (diretor de The Clash: Westway to the World, entre outros), Punk Rock Movie - ao lado de Rude Boy, do The Clash, e The Great Rock'n'Roll Swindle, dos Sex Pistols - é fundamental para entender o fenômeno que tomou conta da Inglaterra nos anos 1970.

Genuinamente tosca, a câmera de Letts captura apresentações vibrantes do Clash, Pistols, Wayne County & the Electric Chairs, Generation X, Slaughter and the Dogs, The Slits, Siouxsie & the Banshees, Subway Sect, X-Ray Spex, Alternative TV e The Heartbreakers.

Com tantos tipinhos esquisitos circulando nos bastidores dos shows, o jovem, mas sempre feio, Shane MacGowan, dos The Pogues, quase não mete medo.

A apresentação dos Pistols é histórica: marca a estréia do "baixista" Syd Vicious, a mais nova contratação do big boss Malcom McLaren.

Os novaiorquinos dos Heartbreakers sobem ao palco e uma legião calçando botas Doc Martins pogueia feliz da vida no Roxy Club - enquanto Johnny Thunders, como alguém disse, "toca sua guitarra como quem solta cusparadas".

*Revista Bizz

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