sexta-feira, 21 de março de 2008

pETER bAIESTORF: "tUDO é pERMITIDO"

Por trás das câmeras, do boom de qualidade pós-Cidade de Deus, das discussões de Tropa de Elite, dos roteiros da Globo Filmes, da "unanimidade" sobre O Auto da Compadecida - e dos festivais - tem gente que acha a sétima arte feneceu.
Está morta na maneira que passa no cinema pro público, não importa se hollywoodiano, cult-movieniano ou de videolocadora nos fins-de-semana.
Por detrás de tudo isso e do que há de positivo acontecendo com o cinema brasileiro, nos últimos anos (ainda convalescendo do golpe que levou nos anos 90, mas quase totalmente recuperado), tem um cara que, no editar das fitas e no vai-e-vem das crises, não desiste do seu sonho. Ou melhor, do seu pesadelo estético - nunca.
O nome é Peter Baiestorf, o cineasta catarinenense que leva no ombro a câmera do gênero "faço o que quero e foda-se" no Brasil. Basicamente, pra quem saca a linguagem de Baiestorf, o que ele faz, no fim das contas, é arrancar grandes risadas de divertimento do fiél e doentio público.
Contudo, 100% das pessoas que não apreciam o seu gênero ultratrash de cinema acha que ele deveria ser internado num hospício, antes que suas fantasias saiam das telas pros lares. Como Bela Lugosi, que foi o Count Drácula pelo resto da vida. E que Drácula: I neverrr drrink...wine.
Baiestorf já horrorizou muito, mas também fez rir pra caralho com produções como Boi Bom, marco do udigrudi nacional. Ele, que não pára, agora anunciou sua mais nova produção, uma parceria com a Bulhorgia Produções, o poético título - Arrombada: Vou Mijar na Porra do seu Túmulo!!!. Deve ser lançado em outubro.
Nos filmes da Canibal Filmes espera-se de tudo: violência explícita, mulheres nuas, estranhas parafilias, música splatter & humor negro. E sonoras gargalhadas.
Segundo Baiestorf, Arrombada é uma história de amor carnal-necrófilo com as participações do seu gêmeo xipófago, o "abominável" Coffin Souza, Carli Bortolanza (maquiagens) e a estréia da atriz pornô Ljana Carrion, que teve o cachê dobrado para aceitar filmar cenas de sexploitation com Souza.
Como um fã de Baiestorf definiu, no estranho domínio da internet, se você gosta de fortes emoções, efeitos especiais de tirar o fôlego, bandas consagradas criando soudtracks, momentos de companheirismo & amor ao próximo, pode tomar no seu c*":
"Agora, se prefere assistir a um filme realmente livre das frescuras, que ultimamente tomam as grandes telas, ver muita podreira, sexo e metal barulhento arregaçando os tímpanos vá assistir à nova produção da Canibal".
Nas palavras do diretor, assista: "Vai deixar você feliz".
Peter Baiestorf é de Palmitos, Santa Catarina. The Texas Chain Saw Massacre poderia ter sido rodado lá tranqüilamente.
Ele é um expoente do terror nacional com influências que vão de diretores como Zé do Caixão, John Waters a Pier Paolo Pasolini, só pra ficar nos mais conhecidos.
Direto do seu covil pestilento em Palmitos, Baiestorf deu essa entrevista exclusiva, proibida para menores de 18 anos e pessoas de estômago fraco. Se você se encaixa no perfil, é melhor não ler:
[[DESORIENTAÇÃO]] - Perversões sexuais & produção cultural são A nitroglicerina do cinema trash?
Baiestorf – Na arte tudo é permitido e qualquer manifestação artística é válida. Sou daqueles que acredita que a perversão encenada é algo maravilhoso. Na vida real sou mais tradicionalista: a favor de pena de morte aos estupradores e pedófilos, políticos corruptos e padres.
[DESORIENTAÇÃO]] - Como explica a predileção por temas tabu das produções de baixo orçamento – sadomasoquismo, bondage, zoofilia & outras esquisitices?
Baiestorf – Vídeolocadoras e cinemas estão cheios de filmes "normais". Istoé, quem vai querer pagar pra ver a mesma coisa de sempre com uma produção medíocre e sem recursos financeiros? Quer desbancar uma novela da Globo? Coloca no ar, no SBT, uma novela às 8 horas da noite com roteiro esperto: incesto, pedofilia sugerida, necrofilia, sadomasoquismo. Vai causar impacto e audiência!
[[DESORIENTAÇÃO]] - Teoricamente, os trash movie deveriam ser fenômenos urbanos, não é? Qual razão pra turma do interior do Brasil, especialmente Santa Catarina (Cascavel, Chapecó, Palmitos), ter se tornado pólo dessa estética? Tédio?
Baiestorf - Os capitalistas estão conseguindo aquilo que estava traçado no seu plano: construir um mundo maravilhosamente globalizado. Com Internet e TV ao alcance de qualquer pessoa no mundo – tudo acaba ficando igual! Hoje não existe mais essa separação – é tudo a mesma merda...
Ninguém quer ser diferente, todo mundo quer ser igual, essa é a real! A Canibal é um caso à parte, já que filmes como Gore Gore Gays e Sacanagens Bestiais dos Anjos Arcanjos Fálicos tiveram que ser filmados com pessoas de todos os cantos do Brasil, cidades grandes e pequenas. Foi impossível reunir equipe técnica e elenco num local apenas.
[[DESORIENTAÇÃO]] - Fala das tuas produções doentes.
Baiestorf – A Canibal ficou mais grotesca em 1998, quando lançamos dois longas-metragens e um curta (Boi Bom) que causaram impacto extremo no underground nacional. Mas nossa estética pervertida vem desde 1992, quando filmei o não-concluído Lixo Cerebral, que tinha a cena de um cara defecando e um garoto de onze anos remexendo em tripas e comendo carne humana – ou seja, canibalismo.
Em 95, fiz o, hoje considerado clássico do vídeo gore nacional, O Monstro Legume do Espaço, com cenas de necrofilia e coprofagia. Depois foram quatro longas: Eles Comem Sua Carne, sobre canibalismo com uma cena de amor necrófilo, onde o amante desmenbra sua noiva e volta à condição de feto em meio às vísceras da mulher, recusando-se a viver nesse mundo.
Veja bem: os canibais eram ateus que se alimentavam da carne de fiscais da Prefeitura de Palmitos...
[[DESORIENTAÇÃO]] - Do que mais você foi capaz?
Baiestorf – Caquinha Superstar a Go-Go, com coprofagia, necrofilia e um padre tarado que, além de necrófilo, era bicha e se masturbava com uma cruz sobre o túmulo de uma morta. Blerghhh, um filme policial gore que mostrava um terrorista torturando uma ninfeta (garota com mais de 18 anos, lógico!).
Além disso teve Drogada e, ainda, Bondage, dedicado aos amantes da prática homônima. Em 97, realizei, com estética de cinema marginal e surrealismo, o longa Super Chacrinha e seu Amigo Ultra-Shit em crise vs. Deus e o Diabo naTerra de Glauber Rocha - sem nenhuma perversão.
Mas produzi dois médias no tema: Bondage 2 (com Bondage, sadomasoquismo e sangueira, pois a primeira parte foi bem vendida) e Chapado (sobre três caras drogados, em que um deles, em plano delírio, faz masturbação anal sobre uma cruz gigante e uma mulher vestida de Tor Johnson beija uma cabeça decepada podre).
[[DESORIENTAÇÃO]] - Alguma dessas produções assustou até mesmo os maníacos?
Baiestorf - Sim. Em 98, fiz dois longas amaldiçoados por todo mundo e que não possuem público - foram totalmente rejeitados, assustando até mesmo os tarados. Esses filmes foram pensados para serem assim: grotescos e com fundamentos sociais/religiosos, onde utilizamos a narrativa debochada pra brincar com temas proibidos.
Estou falando de Gore Gore Gays (sinopse: dois viados pervertidos deixam de ser viados após um deles cortar fora o pênis e viram assassinos necrofilos e coprofágicos) e Sacanagens Bestiais dos Arcanjos Fálicos (sinopse: cientista estuda a cabeça de um padre e um fotógrafo/jornalista que possuem apego por todas as taras conhecidas), que filmamos simultaneamente e talvez sejam os dois filmes mais ferozes dos anos 90 produzidos no Brasil, com suas críticas sociais contra o povo/sociedade brasileira que é totalmente pacífica e acomodada.
Já dizia Jörg Buttgereit: 'Cada sociedade tem os filmes que merece!'.
[[DESORIENTAÇÃO]] - Espera que algum dia esses filmes sejam "compreendidos"?
Baiestorf - Esses dois longas-metragens são filmes malditos e incompreendidos, mas tenho certeza que as gerações futuras encontrarão neles o significado pra todo o "deboche anárquico" que colocamos na tela.
É como outro filme incompreendido, Boi Bom, o curta em que coloquei Jorge Timm (um ator de 150 quilos) matando um boi a dentadas vestido de gaúcho, lógico!
E graças à censura financeira, chegamos fálidos de grana ao ano de 99. Daí optei por deixar minha produtora mais acessível ao público. Desde então, estou rodando filmes menos radicais, como Zombio e Raiva, produções gore mais comerciais, com críticas mais sutis, que existem pra vender e dar dinheiro, já que faço com recursos próprios.
Mas não arrependo-me, em momento algum, de ter feito esses filmes: são um "mal necessário" à sociedade brasileira que vegeta enquanto é culturalmente depredada.