terça-feira, 13 de janeiro de 2009

a eSCALADA dO vÍCIO*

Cocaína leva Nelson à prisão

Folha de São Paulo - 9/5/1966

Nelson Gonçalves encontra-se recolhido à carceragem do DI desde ontem à noite, quando foi autuado em flagrante por tráfico de cocaína. Se não fôr relaxada a prisão, o cantor não poderá iniciar a campanha para a construção do Hospital Infantil "Nelson Gonçalves" e terá que adiar seu encontro com o Arcebispo D. Agnelo Rossi e não poderá entrevistar-se com os jogadores da seleção, para falar da campanha.

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O cantor Nelson Gonçalves, que foi preso em flagrante por porte de tóxicos, em aditamento às declarações prestadas anteontem no Setor de Entorpecentes, confessou ontem ser viciado no uso de cocaína há 11anos. Afirmou que nunca comerciou com o tóxico. Domingo, horas após ter sido preso em sua residência no Brooklin, o cantor negou a acusação que traficava com o entorpecente. Investigações feitas em diversas dependências de sua casa, na ocasião da prisão, constataram a existência e vestígios do tóxico espalhados sobre móveis e assoalho.

No banheiro, onde Nelson se escondeu quando a Polícia chegou, foi encontrada cocaína sobre as bordas do vaso sanitário, o que provaria a tentativa feita pelo cantor de livrar-se da cocaína que estava em seu poder. Uma balança de precisão foi apreendida no local e Nelson disse que ela pertence a um amigo, que a deixou em sua casa para ser vendida.

Outros Implicados

Na tarde de sábado, Moisés Kalif, um viciado que foi ouvido no DI, apontou o cantor Nelson Gonçalves como grande fornecedor de droga. Em investigações feitas na noite do mesmo dia e seguindo pistas fornecidas pela mesma fonte, os policiais chegaram até José Maria Vieira, piloto civil, encarregado de trazer de Corumbá grandes porções de cocaína. A par das ligações de José com Nelson Gonçalves, os policiais rumaram para a residência do cantor, onde o carro 17-45-50, de propriedade de José, estava estacionado. Aguardaram que o visitante se retirasse, e alguns metros adiante, detiveram-no.

Em seu carro apreenderam, além de quase um quilo de cocaína, uma pistola automática Schmith Wesson, calibre 45, e uma Bereta 6,35. O piloto tentou sacar uma das armas, mas foi dominado e preso. Em seguida, os agentes dirigiram-se à residência do cantor. O delegado do SE, Milton Rozenthal, entabulou conversa com Nelson, na expectativa de ser convidado a entrar. Entretanto, pressentindo que fosse a polícia, Nelson fechou a porta, que foi, em seguida, arrombada por policiais. O cantor foi encontrado no banheiro da residência, onde pensa a Polícia - se desfez de grande quantidade de cocaína.

José Freire Dias, investigador de Polícia lotado na Primeira Delegacia Auxiliar, também foi inciado em inquérito, embora as autoridades desconheçam seu paradeiro. Um cheque sem fundos de 1.420.000 cruzeiros encontrado em poder de José Vieira, e que lhe fôra dado pelo investigador em pagamento de uma partida de cocaína, levou o delegado de entorpecentes a indiciá-lo.

Os 14 filhos de Nelson

Nelson Gonçalves, que até a tarde de ontem se mantivera sereno e calmo, sucumbiu aos efeitos das 24 horas de cárcere a que foi submetido e, conforme declarou, à lembrança de seus 14 filhos - dois legítimos e 12 adotivos - que ficaram em sua casa, em companhia da esposa. Disse ainda que, na tarde de ontem, por triste coincidência, seu último disco fôra lançado na praça com suas duas últimas composições: "Menina dos Olhos" e "Maria Luisa" (nome de sua filha).

"Sinto-me completamente vazio e arrasado", declarou o cantor e em seguida chorou copiosamente. Grande número de amigos e admiradores de Nelson Gonçalves acorreram ao DI para confortá-lo e interceder por ele.

Arcebispo e Seleção

Quinta-feira, Nelson vai faltar ao encontro que deveria ter com dom Agnelo Rossi, arcebispo de São Paulo, para pedir apoio à campanha para a construção do Hospital Infantil Nelson Gonçalves. Também não irá dia 23 a Serra Negra, entrevistar-se com os jogadores da seleção, para falar da campanha, a não ser que a Justiça relaxe o flagrante. No auto, entretanto, o delegado Carlos Ferreira Castro, titular do Setor de Entorpecentes, observou com cuidado todos os requisitos da lei para evitar falhas que justifiquem o relaxamento.

Presos querem que Nelson cante

Folha de São Paulo - 11/5/1966

Na tarde de ontem, quando deu entrada na Casa de Detenção, Nelson foi recebido pelos presos com palmas e insistentes pedidos para que cantasse. Emocionado e abatido pelos acontecimentos que o envolveram nestes últimos dias, o cantor prometeu que tão logo a sua situação se defina, cantará para todos os seus companheiros de infortúnio.

O diretor do presídio, caso o flagrante lavrado contra Nelson não seja relaxado, não sabe que função determinar ao artista que, conforme adiantou, só sabe cantar. Nelson, que já não se mostra tão abatido como nos primeiros momentos de sua prisão, fez ao diretor do presídio um único pedido: quer o seu violão para companheiro de cela.

*Legenda: preso em flagrante, Nelson passou uma mês na Casa de Detenção

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