segunda-feira, 16 de novembro de 2009

tEIXEIRINHA: o dONO dAS bILHETERIAS

"Se eu fizesse música com intenções sofisticadas ou intelectuais, estaria ainda hoje na beira da praia com meu violão, a ver navios. Quando eu escrevi 'Coração de Luto' o povo se definiu logo. Eu sou povo também, e as pessoas gostam de minhas canções porque elas cabem exatamente no ouvido delas".
Palavras de Victor Mateus Teixeira, o Teixeirinha, ao contrapor a provocação de um jornalista a respeito da suposta alienação de seu cancioneiro durante a seridade musical dos "anos de chumbo".
A impecável resposta (considerando-se a estatura megapopular do astro gaúcho) também cabe como defesa às centenas de críticas - algumas delas positivas - das quais suas produções cinematográficas foram vítimas: desde a estreia do blockbuster Coração de Luto, em 1967, até o derradeiro A Filha de Iemanjá, de 1981.
Ao longo de 14 anos, a Teixeirinha Produções Artísticas LTDA (empresa que era responsável pela gestão dos negócios do artista no baldio terreno da sétima arte no Brasil) rodou 12 filmes de retumbante sucesso, especialmente nos cinemas do Rio Grande do Sul e nos interiores profundos do país.
Passados quase 25 anos da morte de Teixeirinha, em 1985, vítima de câncer do pulmão (detonava três carteiras por dia), seu séquito de fãs ainda espraia-se pela vastidão do território nacional - e mundo afora. Seus admiradores são canadenses, norte-americanos, portugueses.
Em 2006, "Coração de Luto", popularmente zoada como "Churrasquinho de Mãe", ganhou desavergonhado plágio em Portugal, país no qual a canção/cantor sempre desfrutaram fabuloso sucesso.
Além-mar, o pastiche lusitano alcançou as primeiras colocações na parada musical.
No mesmo ano, a Agência Nacional do Cinema (Ancine) divulgou resultado de uma pesquisa coordenada por João Carlos Rodrigues, representante da Superintendência de Acompanhamento de Mercado (ACO).
O objetivo era tentar responder a seguinte charada:
"Quantos e quais filmes brasileiros fizeram mais de 500 mil espectadores?"
O universo pesquisado foi o dos filmes brasileiros lançados a partir de 1970. Coração de Luto, de 1967, não entrou na lista por ser anterior à apuração. Anteriormente, segundo a ACO, simplesmente não existiam dados confiáveis sobre bilheterias no Brasil.
De acordo com a lista, dos 10 primeiros filmes com maior número de espectadores no Rio Grande do Sul nove (!) deles pertenciam à chancela da Teixeirinha Produções.
Em primeiro lugar figura Motorista Sem Limites, longa dirigido por Milton Barragan cujo lançamento deu-se em agosto de 1970. A película, sucessora do retumbante sucesso Coração de Luto, arrastou 1,8 milhão de pessoas às salas de exibição.
Na décima posição estava O Homem que Copiava (2003), realização de Jorge Furtado.
Fora cantar, trovar e "interpretar" - quesito sobre o qual recai boa parte das críticas logradas desfavoravelmente pelo artista no cinema -, Teixeirinha, em todos as incursões cinematográficas nas quais se aventurou, também se vestia na pele de "mocinho".
Na música, entre as décadas de 1960 a 1980, até seu falecimento, Teixeirinha gravou cerca de 80 discos e compôs aproximadamente 1200 canções. "Coração de Luto", de acordo com o crítico musical Juarez Fonseca, ainda permanece imbatível na posição de "música mais vendida da história do disco no Brasil".
Biaggio Baccarim, ex-diretor artístico da gravadora Chantecler, na qual Teixeirinha gravou quase todos os seus discos, disse que só "Coração de Luto" é responsável pela metade dos 25 milhões de discos vendidos pelo cantor de 1960 a 1995:
"Eu nunca vi nada igual em 37 anos de trabalho na indústria fonográfica", afirmou o paulista Biaggio, hoje assessor jurídico da Warner, gravadora que há três anos comprou o acervo da Chantecler.
Baggio dividiu a Fonseca seguinte causo sobre a façanha fonográfica de "Coração de Luto":
"Nós prensávamos o disco em três fábricas, e mesmo assim não se dava conta. Os caminhões carregados chegavam e nem entravam no depósito, iam direto para as distribuidoras e as lojas. Em lugares mais distantes, como Belém do Pará, enquanto não chegavam novas remessas o disco era vendido no câmbio negro, pelo dobro do preço".
O momento que marca o início dos filmes de Teixeirinha, o final dos anos 1960, coincidiu com a ascensão do Cinema Novo no Brasil.
Segundo a pesquisadora Miriam Rossini, no livro Teixeirinha e o Cinema Gaúcho, quando do anúncio do primeiro filme do músico, Coração de Luto, em 66, os críticos animaram-se diante da perspectiva de que a indústria cinematográfica do Estado pudesse progredir após uma década de decepção.
No início, uma euforia coletiva foi gerada ao redor do filme Coração de Luto. "A todo o momento, a imprensa fazia questão de noticiar o andamento das filmagens, detalhes de produção, distribuição e público", escreve Miriam.
Mesmo assim, explica a doutouranda, era fato certo para a crítica que a imensa bilheteria havia sido causada pelo fluxo dos fãs do artista às salas de cinema: "Alguns críticos locais diziam que 'apesar de Teixeirinha' e do argumento melodramático, o filme era 'bem-feito e caprichado'".
Na época, Milton Barragan, diretor que acompanhou Teixeirinha em muitas das suas produções, saiu em defesa do "patrão":
"Quer queiramos ou não, o cinema de Teixeirinha é válido. Ele expressa uma realidade, verdades que compõem o quadro social do estado. Com todas as suas falhas, é cinema autêntico".
Na opinião de Barragan, Teixeirinha conseguia captar a simplicidade do homem do povo; era a única pessoa produzindo para toda uma camada social excluída dos "projetos culturais".
No post debaixo, curta os cartazes de alguns hits de Teixeirinha na telona. Mas ouça, antes, a canção "Coração de Luto" e, depois, assista a um trecho do homônimo filme (chore com a letra aqui).