quinta-feira, 28 de abril de 2011

fILME iNVESTIGA aS vIAJENS dE pAÊBIRÚ

Disco criado por Zé Ramalho e Lula Cortes em 1974 é o mais raro do país. Brigado com Cortes há anos, Ramalho não quis dar depoimento ao documentário, mas liberou uso das canções

MARCUS PRETO - ILUSTRADA (FOLHA DE S. PAULO)

Mais que um simples road movie, "Nas Paredes da Pedra Encantada", que estreia no sábado, dentro da programação do festival In-Edit, é uma "viagem sobre uma viagem sobre uma viagem". A definição é dos próprios realizadores, Cristiano Bastos e Leonardo Bonfim.

Em busca de investigar a feitura do mitológico álbum "Paêbirú" (1975), de Lula Cortes e Zé Ramalho, a dupla percorreu o interior da Paraíba até a Pedra do Ingá, sítio arqueológico rodeado de lendas que inspirou o trabalho.

Essa é a terceira viagem a que os diretores se referem. A primeira foi a que Cortes (1950-2011) e Ramalho fizeram à mesma pedra em 1974, à procura de inspiração para compor o álbum. Dormiram ali, ao relento, muitas e muitas noites -no filme, Lula fala em 12 visitas ao local.

Aos pés da pedra, os músicos colheram cogumelos alucinógenos, fizeram fogueira, usaram LSD. A segunda viagem é, portanto, psicodélica.

"No projeto original [do filme], Lula queria que todos da equipe tomássemos um LSD puro", diz Cristiano Bastos. "Queria nos levar à Pedra repetindo a experiência na íntegra. Isso, é preciso dizer, acabou não acontecendo."

Criado sob esse clima alucinado, o LP "Paêbirú" acabou por se tornar uma das peças mais importantes do rock psicodélico brasileiro - "legitimamente brasileiro", aliás, como lembra Bastos. "Os caras foram buscar a psicodelia numa lenda indígena, não nos elfos ingleses."

O que deu ainda mais potencial mitológico ao trabalho foi seu trágico destino. Poucos dias depois de ser prensado, ainda no estoque da gravadora Rozenblit, uma inundação destruiu mil das 1.300 cópias existentes.

Isso tudo o torna o vinil mais raro do Brasil, nunca custando menos de R$ 5 mil.

Lula Cortes morreu no começo deste ano. E é em torno dele que o filme gira. Entram em cena também outros envolvidos no álbum, como o fotógrafo Fred Mesel, a capista Kátia Mesel e alguns músicos, como Alceu Valença.

Zé Ramalho, no entanto, não dá depoimento algum. Coautor do álbum em questão, ele não quis ter sua imagem no documentário.

"Ele e Lula estavam com relacionamento cortado há muito tempo", explica Bastos. "Zé me liberou completamente para usar as músicas no filme. Só não queria imagem dele. Que diabos levaram às rusgas dos dois não nos interessou tanto. Não quisemos evidenciar o viés de uma picuinha dentro de uma história tão bonita."

NAS PAREDES DA PEDRA ENCANTADA
DIREÇÃO Cristiano Bastos e Leonardo Bonfim
PRODUÇÃO Brasil
QUANDO sábado, às 19h
ONDE Cine Olido (av. São João, 473, tel. 0/xx/11/3331-8399)
CLASSIFICAÇÃO não informada

segunda-feira, 11 de abril de 2011

dO jEITINHO dELA*

Estilo próprio, rigor e pragmatismo determinam os 100 primeiros dias de Dilma Rousseff na presidência

POR CRISTIANO BASTOS E RODRIGO ALVAREZ - ROLLING STONE
ILUSTRAÇÃO: LÉZIO JÚNIOR

Dilma Rousseff misturou todos os ingredientes da sua "omelete presidencial" direto na frigideira e respondeu à apresentadora Ana Maria Braga sobre as perspectivas do crescimento econômico para seu governo:

"O nosso objetivo é fazer com que a economia continue crescendo de forma estável, sem que a inflação volte".

De repente, ela interrompe a própria fala: "Tô achando que tá muito baixo esse fogo, hein?"

A escolha da primeira aparição da presidente em um programa de televisão voltado ao público feminino não foi por acaso.

Dilma falou sobre sua preocupação com o poder aquisitivo da população conquistado no governo de Luiz Inácio Lula da Silva e mandou uma indireta para quem reclamava do reajuste do salário mínimo para R$545:

"Quando não tem, nós não damos. Quando tem, nós damos. Então, garantimos... Pera lá, dona Ana Maria", ela interrompe. A petista olha para a frigideira, se concentra e termina de preparar o quitute. "Não tá ficando bom, não, porque estou conversando", completou, antes de apagar o fogo.

A apresentadora e o fiel escudeiro, Louro José, enfim provaram a omelete presidencial: adoraram. Os dois atribuíram o "gostinho diferente" ao bicarbonato de sódio que a presidente incorporou à receita - para deixar o prato "mais fofinho", mas que também notoriamente contribui para estufar o estômago.

Dilma assumiu a presidência da República debaixo de chuva forte, desfilando a bordo de um Rolls-Royce fechado. E, no "frigir do ovos", o fato pôde servir como metáfora para o estilo discreto da petista no governo.

Mas, passados 100 dias no comando, aos poucos ela encontra seu jeitinho de cozinhar - ou melhor, de governar. E, é preciso dizer, até agora sem a paternal intromissão de Lula, que não descumpriu a promessa de deixar a sucessora "trabalhar tranquila".

"Rei morto, rei posto", declamou o "ex".

Nesses três meses, a aprovação de Dilma, inclusive, já igualou os índices obtidos por Lula nos primeiros meses de seu último mandato, em 2006. Lembrando também que ela tem pela frente três reformas muito aguardadas: política, tributária e previdenciária.

Sem se deixar levar por frívolas politicagens, a presidente vem surpreendendo por sua capacidade de ser objetiva.

*Mais na Rolling Stone 55, nas bancas!

terça-feira, 5 de abril de 2011

uM pAÍS eM oBRAS

Comissão liderada por ex-presidentes da República tem como missão tornar realidade a prometida reforma do sistema político brasileiro

POR CRISTIANO BASTOS - ROLLING STONE
ILUSTRAÇÃO: LÉZIO JÚNIOR

O ano em que a tão aspirada reforma política deverá descer do púlpito para, enfim, ganhar vida prática no dia-a-dia dos eleitores também celebra uma efeméride que revela o quão sonolenta vem sendo sua realização.

De acordo com estudo feito pela Câmara dos Deputados, desde 1991, foram recebidas 283 propostas de alteração do sistema político, entre projetos de lei e tentativas de emenda à Constituição.

A análise de tais propostas arrasta-se, portanto, em legislaturas que somam 20 anos.

Atraso que, sobretudo, se deve à "falta de consenso" nos debates do Congresso Nacional. Para o eleitor, o processo deverá trazer maior correspondência entre duas pontas: sua vontade na hora de votar e o resultado final nas urnas.

Apesar de tardia, a reforma política é festejada como "mãe de todas as reformas". Reformaria, antes de tudo, os próprios reformadores. Razão que, por outro lado, explica sua lentidão em acontecer de fato.

Todavia, prósperos ventos sopram a favor da reforma política com o fôlego de um Congresso renovado e o apoio dos chefes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

A presidenta da República, Dilma Rousseff, e o presidente do Senado Federal, José Sarney, elegeram a reforma como prioridade em seus mandatos.

A "vassourada" inaugural foi dada pelo Senado, que, em fevereiro, instalou a Comissão de Reforma Política, que nasce com o desafio de cimentar um consenso até hoje não encontrado sobre as propostas em debate.

A "comissão de frente" da reforma, escolhida a dedo pelo próprio Sarney, conta com a vivência política de oito ex-governadores e dois ex-presidentes - os atuais senadores Fernando Collor de Mello (PTB/ AL) e Itamar Franco (PPS/MG).

Presidido por Francisco Dornelles (PP/RJ), o colegiado também é integrado por senadores como Aécio Neves (PSDB-MG), Demóstenes Torres (DEM-GO) e Roberto Requião (PMDB-PR).

Na escalação do "time feminino", estão as senadoras Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Lúcia Vânia (PSDB-GO) e Ana Rita Esgário (PT-ES).

Sarney justificou que seu critério de escolha fundou-se puramente em "experiência política".

"É primordial que todos os membros da comissão deixem de fazer as contas sobre o que é melhor para seu partido e para seu projeto pessoal e pensem no que é melhor para o Brasil", define Aécio Neves, que também defende o fim das coligações partidárias.

De acordo com o senador tucano, esse parece ser um ponto comum entre os parlamentares.

"Até porque esse é um sistema que desfigura o processo representativo. Ou seja, quando um eleitor vota num determinado candidato e elege um candidato de um partido que atuará de forma absolutamente distinta daquele no qual ele votou."

Na primeira reunião da comissão, 11 temas receberam o selo "prioritário" - entre eles, sistema eleitoral, financiamento de campanha, regras para coligações entre partidos, fidelidade partidária, voto facultativo e reeleição.

O mais fundamental dos desafios, ponderou Sarney, no entanto, será encontrar um modelo alternativo à atual forma de eleição de deputados e vereadores.

Ele sugere a adoção de uma fórmula mista. Ou seja, que combine votação majoritária (na qual o mais votado é eleito) com a proporcional (votos obtidos pelo partido ou coligação, os quais determinariam o resultado).

"A mudança no sistema proporcional resolveria cerca de 60% do problema", contabiliza Sarney.

Agora, a missão do colegiado, no prazo de 45 dias, é apresentar à sociedade um anteprojeto de reforma política.

O ex-presidente Fernando Collor de Mello deixou a presidência da Comissão de Infraestrutura – e na qual, curiosamente, deu lugar ao seu algoz nos tempos de "Fora Collor!", o senador Lindberg Farias (PT-RJ) –, para encabeçar a atual comissão.

Collor pretende reavivar no Brasil o debate sobre a instituição do sistema parlamentarista de governo - de sua autoria, inclusive, há uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC 31/07). O senador também se declara favorável a questões como financiamento público e redução dos custos de campanha e fidelidade partidária: "São todas medidas parlamentaristas", diz Collor.

O senador Itamar Franco, por sua vez, defende o fim da reeleição para cargos majoritários, a exemplo do cargo de Presidente da República.

De acordo com Franco, presidente da República de 1992 a 1994, o pressuposto da reeleição atenta contra a ordem constitucional brasileira. Ele também critica os partidos políticos, os quais chama de "estrutura viciada" onde "quatro ou cinco dirigentes mandam".

"Uma hora alguém não gosta mais de sua cara ou de sua atuação e você perde totalmente o espaço. É um absurdo", diz, com indisfarçável sinceridade.

Essa não é a primeira vez (nem deverá ser a última) que ocorrerá uma reforma política no sistema político brasileiro. Nessas duas décadas, desde que a ideia começou ser debatida, alguns avanços surtiram efeito.

Até agora, a maior conquista foi a moralizadora "Lei da Ficha Limpa", cuja aprovação contou com as redes sociais da internet como grande aliada. Os cientistas políticos, contudo, mostram-se descrentes quanto à prioridade que a reforma terá na agenda dos dirigentes da Nação.

Na avaliação de especialistas, desde 1988 (quando a Assembléia Nacional Constituinte consolidou a recém implantada democracia brasileira), o Brasil inegavelmente progrediu em muitos campos – em especial, no social e no econômico.

Politicamente, porém, o País estancou.

O vigente sistema eleitoral é, inclusive, condenado pelos eleitores, que fazem suas escolhas pessoais, mas, de maneira geral, ficam surpresos com o resultado final das votações.

A despeito dessa desconfiança, a turma de senadores que engrossa a Comissão da Reforma Política jura que não costurará apenas "remendos normativos": eles prometem a inteira renovação do sistema político brasileiro.

Porém, no entendimento de Octaviano Nogueira, cientista político da Universidade de Brasília (UnB), os políticos farão somente o que sempre fizeram: proselitismo em causa própria. "Vão fazer um remendo aqui e outro ali, para atender a interesses particulares. Mas não vão mudar o sistema".

Como essencial pilar da reforma, Nogueira cita o voto facultativo – o qual, assim como nas grandes democracias – deveria deixar de ser obrigatório: "Isso, sim, seria 'reforma política', pois diria respeito aos interesses do cidadão", ilustra.

Em sua estreia no Congresso Nacional, Dilma Rousseff voltou a reforçar que a reforma política, que não caminhou nos oito anos do governo Lula, é uma de suas prioridades. Em plenário, entretanto, a presidenta arrancou risos da plateia quando anunciou que trabalhará "em conjunto com a agenda do Congresso" para garantir o andamento do processo.

Dilma se diz, por exemplo, contra as doações ocultas em campanhas eleitorais (quando empresas privadas doam recursos sem identificarem-se na prestação de contas). "Sou a favor de doações explícitas e transparentes", ela diz.

"Os eleitores têm direito de saber quem doou para quem."

Já José Serra, adversário de Dilma em 2010, defende que os candidatos "apresentem-se como são".

Uma das bandeiras hasteadas pelo candidato derrotado à presidência trata do fim daqueles que ele apelida de "candidatos-sabonete", ou, em suas próprias palavras, "políticos vendidos como se fossem novos produtos de consumo".

Conforme dados da ONG Reforma Política Já, cada pleito eleitoral custa aos cofres públicos por volta de R$ 900 milhões. Segundo estudo de 2008 da mesma instituição, 20% dos deputados (estaduais e federais) abandonou suas atividades para dedicar-se exclusivamente a campanhas para prefeituras (aqueles que não se elegeram, posteriormente retornaram ao conforto dos antigos cargos).

Diante da explícita "balbúrdia pública", o efeito mais desejado da reforma política é, sem dúvida, o moralizador. O anseio por mudanças é grande e extravasa as cercanias da Esplanada dos Ministérios. Engajados no "Movimento Reforma Política Já", enfileiram-se artistas como o ator Milton Gonçalves, a atriz Débora Falabella, a banda Jota Quest e o cartunista Ziraldo.

Gonçalves, um dos mais engajados, defende que reformar seria uma das maneiras mais eficientes para reverter a corrupção que assola o Brasil. "Ninguém deve ficar de fora. Precisamos da participação de toda a sociedade", decreta o ator.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), igualmente, é uma das maiores apoiadoras da necessidade da reforma. Dom Geraldo Lyrio Rocha, presidente da CNBB, opina que a mudança não pode ocorrer somente dentro gabinetes: "A vontade do povo, sobretudo, deve ser levada em consideração. A Reforma Política é uma 'dívida' que o Congresso tem para com o Brasil".

Um dos pontos mais polêmicos da reforma política é a adoção do sistema majoritário para a eleição de deputados, medida que findaria com os chamados "puxadores de votos".

Tanto que a proposta, irônica e apropriadamente, ganhou apelido de "Lei Tiririca": ela impediria a repetição do fenômeno provocado pela eleição do deputado federal que recebeu 1,35 milhão de votos e, tal qual um "milagre da multiplicação", ajudou a eleger candidatos bem menos votados.

A "Lei Tiririca" tornaria inúteis as coligações partidárias nas eleições proporcionais e, de quebra, geraria imediato efeito colateral.

Há quem não acredite, porém, na remissão do sistema. No livro Nervos de Aço, franco raio-x da política brasileira, o ex-deputado Roberto Jefferson (denunciante e confesso agente do "mensalão") escreveu:

"O sistema político brasileiro é um círculo vicioso sem fim. Rouba-se para financiar campanhas eleitorais e conservar-se no poder".

"O que fazer para viabilizar uma reforma que afeta tantos interesses, inclusive os dos próprios parlamentares?", questiona a ex-senadora e ex-candidata a presidente Marina Silva (PV/AC).

Ela pontua que o Brasil precisa de um "realinhamento histórico", pois "só assim a reforma política sairá do papel". Assim, a tão desejada reforma independeria de políticos e poderia ser iniciada pelas escolhas feitas pelos próprios eleitores.

Dentre as quais, Marina sugere eleger parlamentares minimamente comprometidos com outras reformas importantes, como a tributária e a da previdência.

"As pessoas não devem escolher um representante esperando que ele vá se transformar em 'príncipe encantado' da noite para o dia. Também não adianta ficar beijando o 'sapo' na boca para ver se vira príncipe. Não dá certo", ela metaforiza, citando em seguida qual seria a "única saída" para o eleitor:

"Escolher o candidato certo. E, sem preconceito com o sapo, que sou ambientalista."

segunda-feira, 4 de abril de 2011

rEVISTA tRIP: nA tRILHA dO pAÊBIRÚ

Nas Paredes da Pedra Encantada estreia com história mística do disco mais caro do Brasil

POR FILIPE TAVARES - SITE DA TRIP

Em produção desde 2008, o filme Nas Paredes da Pedra Encantada finalmente tem uma data de estreia definida. O documentário de Cristiano Bastos e Leonardo Bomfim, que conta a mística história por trás da obra-prima de Lula Côrtes e Zé Ramalho, a pérola psicodélica Paêbirú, finalmente chega às salas de cinema na edição 2011 do festival In-Edit, que rola de 28 de abril ao dia 12 de maio nas cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro.

Conversamos com Cristiano Bastos, co-diretor do filme, para falar sobre a produção do documentário que sai depois de uma infeliz coincidência: a morte do cantor, compositor e pintor Lula Côrtes.

Personagem central da história, Lula deixou órfãos milhares de fãs ao redor do mundo no último sábado (26), em um leito no hospital Barão de Lucena, em Recife, vítima de um câncer na garganta que combatia nos últimos cinco anos.

Nascido de uma grande reportagem que o diretor fez para a Rolling Stone, o embrião de Nas Paredes da Pedra Encantada foi alimentado pelo próprio Lula, que se responzabilizou em guiar essa viagem de volta à mística Pedra do Ingá.

"Quase tudo foi feito por conta dessa lenda de Sumé, que perpassa todo o disco. A Pedra do Ingá do Bacamarte, que influenciou o disco também, foi um dos caminhos que o índio Sumé teria passado em fuga dos índios Tupinambá. Por isso seria Paê-beru (em Tupi, Caminho ao Peru). É o caminho que o índio percorreu a pé até o Peru", explicou Cristiano. "É um disco que tem muito valor financeiro, é verdade. Mas mais do que isso. Esse disco tem muito valor cultural. É uma das primeiras manifestações da psicodelia realmente brasileira, com temas verdadeiramente brasileiros."

E o valor financeiro não é pouco não. Devido a uma enchente que varreu Recife em 1975, apenas 300 cópias do disco sobreviveram, de 1300 produzidas. Com isso, essa pequena pepita da música psicodélica nacional pode chegar até R$ 5.000 no mercado dos colecionadores. Isso se você encontrar alguém disposto a vender.

"Há um tempo atrás eu cheguei a ver gente no Orkut vendendo só os vinis, sem as capas e sem nada. Gente que achou o disco no meio de um terreno e vendeu só os vinis, do jeito que estavam, por mais da metade do preço de coleção", conta Cristiano, mostrando um pouco dessa fixação que o disco provoca nas pessoas.

Mas nada tão mesquinho quanto dinheiro pode medir o verdadeiro valor de Paêbirú. A obra definiu toda uma geração de músicos e compositores nordestinos, apropriando-se e ampliando tudo aquilo que a Tropicália trouxe para a música do Brasil na década anterior.

Sem saber, a viagem transcedental de Zé Ramalho e Lula Côrtes foi ecoar 35 anos depois do seu lançamento muito além da linha do Equador, sendo relançado nos Estados Unidos e alimentando as mentes de uma nova safra de bandas do folk psicodélico da geração New Weird America (Noah Georgeson, Bon Iver, entre outros).

"A última vez que eu falei com o Lula, por incrível que pareça, foi pelo Gtalk. E eu nem sabia que ele usava a internet. E ai ele me mandou uma mensagem perguntando: 'e aí Cristiano? Não vai lançar esse filme, porra?", revela Cristiano, divertindo-se com a surpresa de ver um mestre da cultura de raiz navegando na internet. "Ele ainda brincou, perguntando se depois de tanto trabalho não ia ver o filme lançado. Tive que rir né? E o pior é que ele estava certo."

Triste com a morte do cantor, Cristiano ainda comentou sua relação pessoal com Lula nos três meses que passou entre Pernambuco e Paraíba, coletando depoimentos da imensa maioria das pessoas envolvidas no projeto.

Durante esse período, o diretor pode desfrutar da hospitalidade e da companhia de Lula em seu ateliê na região de Jaboatão dos Guararapes, onde conviveu não só com o compositor, mas também com o artista plástico Lula Côrtes.

"Eu tive a chance de passar um bom tempo com ele. Sabe quando você fica tentando absorver a inteligência de uma pessoa? Então. Ele era um cara muito vibrante.Você quer conversar com ele. Quer estar sempre perto dele. Sempre conversando pra extrair aquele conteúdo e toda aquela consciência artística que ele tinha", emociona-se o diretor. "Pior é que a gente ia comprar a passagem dele pra São Paulo nesta segunda (28), mas infelizmente... não foi possível."

ESTREIA NO IN-EDIT - A terceira edição do Festival Internacional do Documentário Musical, o In-Edit, será o palco da estreia de Nas Paredes da Pedra Encantada nas telas de cinema do Brasil.

O festival começa em São Paulo no dia 28 de abril e vai até o dia 8 de maio. No dia 6 de maio serão as primeiras sessões no Rio de Janeiro.

Na cidade maravilhosa, o In-Edit 2011 segue até o dia 12. Segundo a assessoria de imprensa do festival, a programação completa deve sair ainda nesta semana.

A estreia oficial do documentário será no Cine Olido, no coração do centro de São Paulo, no próximo dia 30 de abril. Com Lula como guia da viagem, o filme conta com depoimentos de Alceu Valença (que canta com Lula uma música inédita de sua autoria); de Hugo Leão, velho parceiro de Zé Ramalho, que tocou o marcante órgão Farfisa na canção 'Nas Paredes da Pedra Encantada"; da cineasta Katia Mesel, ex-esposa de Lula, que participou da concepção e gravação de Paêbirú; de Raul Córdula, antropólogo paraibano que apresentou a Cortês e Ramalho em 1975 a Pedra do Ingá, que influenciou a criação do álbum; além do cartunista Lailson de Holanda, parceiro no disco Satwa, que precedeu Paêbirú e é tão raro quanto hoje em dia. Zé Ramalho não quis gravar entrevista mas sua presença é marcante no documentário.

Segundo o próprio Cristiano, o processo de captação foi rápido e bastante abrangente.

"A produção foi uma coisa bem punk. Eu e o Leonardo resolvemos fazer e dissemos: 'então vamo fazer essa porra'. A gente não quis esperar pra ficar captando, então ninguém se perde em devaneios e digressões. Então a gente decidiu e foi. Eu morei três meses em Recife, mais entre Recife e a Paraíba", explicou Cristiano. "A gente gravou no estúdio do Lula em Jaboatão dos Guararapes, em Ingá do Bacamarte, onde fica a Pedra do Ingá ou Pedra Lavrada, onde tem aquelas inscrições pré-históricas que até hoje ninguém sabe o quer dizer. Além da casa do Alceu Valença e muitos outros lugares."

Nas Paredes da Pedra Encantada é o primeiro filme da dupla Cristiano Bastos e Leonardo Bomfim e já é um dos lançamentos nacionais de 2011 que você não pode perder.

Abaixo, você vê o trailer do filme.

Não deixe de assistir para entender um pouco mais da história e da mística por trás do mais caro vinil brasileiro e desse disco seminal da nossa música popular.

quarta-feira, 23 de março de 2011

eNTREVISTA: eU

POR LAFAIETE JR - PROGRAMA AUTO-FALANTE

Lançado em 2001, o livro Gauleses Irredutíveis: Causos e Atitudes do Rock Ggaúcho transformou-se de imediato em uma espécie de primo do já clássico Mate-me Por Favor: uma história sem censura do punk, de Legs McNeil e Gillian McCain, só que sobre o rock produzido no Rio Grande do Sul.

Escrito por Alisson Avila, Cristiano Bastos e Eduardo Müller, Gauleses irredutíveis apresenta entrevistas com mais de 160 pessoas envolvidas com o rock gaúcho, entre jornalistas, produtores e, claro, músicos recontando 40 anos de rock no estado.

Atualmente o livro virou uma espécie de lenda e não é fácil de ser encontrado para venda – e ainda não existe previsão de lançamento de uma segunda edição.

Hoje, dez anos depois do lançamento do livro, a revista Aplauso aproveita o gancho de uma matéria ("Por Favor, Sucesso!") escrita pelo jornalista Cristiano Bastos (um dos autores do livro Gauleses irredutíveis), e coloca no "mercado" a coletânea Gauleses Irredutíveis Merecem Aplauso.

A coletânea, que é dividida em dois volumes (cada um com 30 músicas) mais um com faixas bônus (com 10 músicas), está disponível para download gratuito e traz músicas em versões oficiais, acústicas, demos e ao vivo.

Muitas vezes com qualidade de áudio nem tão boa, claro. Mas vale levar em consideração mais o caráter de registro histórico da coletânea. Deleite para iniciados e didática para iniciantes.

Liverpool, Os Brasas, Bixo da Seda, Astronauta Pinguim, Bidê ou Balde, Procura-se Quem Fez Isso, DeFalla, Pública, Video Hits, Cachorro Grande, Superguidis e Júpiter Maçã são alguns dos nomes que marcam presença na coletânea, produzida com a intenção de "atingir o coração e os ouvidos das pessoas", segundo Cristiano Bastos, responsável pela curadoria musical da compilação.

Se o livro Gauleses irredutíveis: causos e atitudes do rock gaúcho tem como primo famoso o livro de Legs McNeil e Gillian McCain, a coletânea Gauleses Irredutíveis Merecem Aplauso pode ser vista como prima made in Brazil da clássica Nuggets: Original Artyfacts from the First Psychedelic Era, coletânea lançada no início dos anos 70 pela gravadora Elektra Records.

Cristiano Bastos até a cita no encarte do álbum virtual como uma referência para Gauleses Irredutíveis: "Fazemos votos de que esta tentativa possa ser, ao menos em espírito, nosso Nuggets".

Tivemos um bate papo com Cristiano Bastos a respeito da coletânea. E se você quiser iniciar o download de Gauleses Irredutíveis Merecem Aplauso antes de ler a entrevista, o caminho é este aqui.

Como surgiu a ideia da coletânea Gauleses Irredutíveis Merecem Aplauso?

O insight para a coletânea surgiu com a reportagem de capa que escrevi para a revista Aplauso "Por Favor, Sucesso!", cuja abordagem é um debate mercadológico, no estilo "longe demais das capitais", sobre o rock no Rio Grande do Sul e todas as suas históricas peculiariedades, no que diz respeito ao resto do Brasil. Calhou de o livro Gauleses Irredutíveis – Causos e Atitudes do Rock Gaúcho, que apurei com os jornalistas Alisson Avila e Eduardo Müller, em 2001, está fazendo dez anos este ano. A obra (trabalho de investigação jornalística realizada com 167 músicos, jornalistas e produtores culturais, que enfoca 40 anos de história da música pop gaudéria), está com sua edição esgotada há muitos anos. A procura pela obra, porém, é grande. Recebo e-mails dos mais distantes recantos do País me perguntando sobre uma nova edição do livro. É fácil, igualmente, deparar-se com gente procurando pelo livro na internet – sem achá-lo. Dias desses, um amigo disse que achou um exemplar de Gauleses custando R$ 70 num sebo do Rio de Janeiro… Na Internet ele também não é facilmente "achável". O exemplar que tenho comigo, aliás, tive de pegar de minha mãe, pois o meu havia sido roubado por algum espertinho. Sei também de uma porção de histórias de gente que teve seu Gauleses surrupiado. Além de ser uma forma de lembrar essa uma década do livro, a coletânea Gauleses Irredutíveis Merecem Aplauso é um presente tanto para o fãs como para as bandas presentes. Sobretudo, como escrevi na apresentação da coletânea, foi uma tentativa de reunir mais de cinco décadas de produção pop gaúcha. Não foi fácil. Pencas de boas bandas ficaram de fora.

O que você espera atingir com a coletânea? E o que espera dela?

Com a seleção que fiz para os três discos, espero atingir o coração e os ouvidos das pessoas. As pessoas, naturalmente, querem "A" coletânea perfeita, assim como esperam pelo livro mais irrepreensível, segundo, claro, seus gostos e critérios de importância. Também sempre procurou-se fugir do óbvio ululante na escolha das músicas. Ou seja, fica aquela sensação, como ocorre em muitas compilações, mesmo as mais respeitosas, de que alguma coisa ficou de fora. Para ambos, livro e coletânea, a resposta é a mesma: um livro ou uma coletânea não são a Bíblia. Não conheço uma coletânea sequer que seja absolutamente "perfeita". Nem os box set's Nuggets, com toda sua exuberância, o são. Mas Gauleses Irredutíveis Merecem Aplauso tem recebido excelentes críticas. O Twitter é um dos termômetros desse feedback.

O que você acha que a coletânea representa para a música do Rio Grande do Sul?

Espero que possa significar "respeito", no sentido de valorizar, através dos tempos, a "protéica" produção de rock no Rio Grande do Sul. Nesses estranhos dias, nos quais arte é mais volátil que gás hélio, ainda faz-se necessário, acredito, que os velhos suportes com os quais o rock nasceu – os circunferentes discos – sejam preservados. Por isso a ideia do trabalho completo, em que os leitores poderiam imprimir a arte, recortar e montar seu álbum em casa. Quase como nos "velhos tempos". Clicar um mp3 ainda não matou a tátil sensação de inserir um disco no compartimento e botar para tocar. É de um erotismo que os computadores, essas frias máquinas, nunca emularão.

Você é responsável pela curadoria musical. Quanto tempo levou para selecionar as músicas? Como foi esse processo?

Demorou cerca de dois meses, tempo levado na apuração da reportagem "Por Favor, Sucesso!". Foi um trabalho divertido e trabalhoso de ser feito, mas muito gratificante. O trabalho compreendeu desde a curadoria das canções que formam os três sets, a apuração envolvendo as canções selecionadas e, depois, escrever a respeito das 70 músicas. Por fim, a formatação das artes gráficas dos discos, feita com a equipe da revista Aplauso.

Depois que a coletânea ficou pronta, alguma banda te mandou música mas não dava mais tempo de entrar?

Não, isso não aconteceu. Rolou de algumas bandas não responderem ao "chamamento" para entrar na coletânea. Outras não enviaram suas músicas a tempo do fechamento.

Por algum motivo ficou alguma faixa de fora que você queria muito que entrasse?

Claro que eu gostaria de ter na coletânea gravações de bandas como Engenheiros do Hawaii e TNT, mas no caso dessas duas, por exemplo, os fonogramas teriam de ser licenciados por grandes gravadoras. Embora a indústria fonográfica esteja falida, é bom não mexer nesse vespeiro, motivo pelo qual todas as 70 músicas presentes na coletânea foram liberadas pelos seus autores. A Graforréia [Xilarmônica], provavelmente, foi a grande banda em falta na coletânea. Foi outra que não atendeu ao “chamado”, infelizmente.

Qual o critério para selecionar as músicas que entraram no "volume bônus"?

O critério foi envenenar ainda mais o “creme” com raridades. Dentre as quais, "Aquarianas da Rua 20", "Cartas de Playground" e "Desconstruções do Acaso", as quais foram pinçadas do ensaio pós-álbuns Sétima Efervescência / pré-Plastic Soda, do Júpiter Maçã. Algumas bandas que cederam seus sons na última hora, como os Telecines, entraram no terceiro volume.

Para você, quais as três músicas mais “lendárias” que entraram na coletânea?

"Adeus, Meu Chiripá", do grupo Rebenque, "Sobre Amanhã", DeFalla e "Lobo da Estepe", Cascavellettes (ao vivo em 1991). A folkezinha "Adeus, Meu Chiripá", do desconhecido grupo Rebenque, foi recuperada do álbum Som Grande do Sul, produzido pelo lendário Airton dos Anjos em 1978, época em que a produção discográfica andava francamente em baixa. Essa nem muitos de meus próprios conterrâneos conheciam… Com exceção do Gordo Miranda [o produtor Carlos Eduardo Miranda], que vibrou quando eu lhe disse que ela entraria na coletânea. O registro de "Sobre Amanhã", remasterizado pelo Flavio Santos, o Flu, não deixa esquecer que o DeFalla, até hoje, é uma das melhores bandas brasileiras de todos os tempos, muito embora muitos torçam o nariz para os feitos musicais de EduK & Cia. No caso de "Lobo da Estepe", para quem adolescia em Porto Alegre no começo dos anos 1990, meu caso, é um déjà vu e tanto. Os Cascavelletes foram, para muita gente no Rio Grande do Sul, um misto de Beatles, por causa da legião de fãs, com Rolling Stones, em razão de suas picardias dentro e fora dos palcos. Em Gauleses Irredutíveis… o registro de "Lobo da Estepe", que emula vocalizes de Simon & Garfunkel, também é lendária. Tem o climão das velhas bootlegs empoeiradas. Na gravação, Flavio Basso, também conhecido pela alcunha Júpiter Maçã, resume para o ensandecido público viamonense: “É muito bom tocar canções da banda quando a gente sente que vocês fazem parte dela”. Há muitas gravações que poderiam levar o timbre "lendárias".

Tem mais algum outro projeto parecido com esse?

Desde o tempo em que [o livro] Gauleses Irredutíveis foi lançado existe a ideia de se fazer um documentário tendo o livro como ponto de partida, obviamente, atualizando-o. Antes, contudo, estou finalizando, com Leonardo Bomfim, o road doc Nas Paredes da Pedra Encantada, que viaja pelas lendas do mítico Paêbirú – Caminho da Montanha do Sol, álbum lançando em 1975 por Lula Côrtes e Zé Ramalho. O filme, que deve estrear em 2011, investiga não só a riqueza musical de Paêbirú, mas também o imaginário particular do interior da Paraíba e o momento psicodélico dos anos 70 na ponte entre Recife e João Pessoa. Depois que terminar essa jornada de “nordestinidade”, voltarei novamente o olhar para o rock do Cone Sul. Assim como foi Gauleses Irredutíveis, tanto a coletânea quanto o livro, um filme que retrate a sempre ardente produção de rock no Rio Grande do Sul precisa ser rodado. A história não pode se perder.

quarta-feira, 2 de março de 2011

pOR fAVOR, sUCESSO!

Fama, arte e reconhecimento: que fenômeno leva bandas gaúchas à paulicéia em busca do desvairado sonho rock-and-roll?

POR CRISTIANO BASTOS - (De São Paulo, Goiânia e Brasília – menos de Porto Alegre)

A mais de 3 mil léguas submarinas, o telefone ringe: de Brasília, capital federal, a ligação soa em algum endereço incerto de Tapes, bucólico recanto irrigado pela Lagoa dos Patos.

Peço por Marco Antônio Figueiredo, vulgo "Fughetti Luz".

Trata-se do pioneiro homem, que, pode-se pontificar, desferiu para o Brasil a "palhetada fundamental" de um cancioneiro pop sul-rio-grandense.

Dos versos "Ouça menina, essa nova música/ Que será sucesso durante um mês", "Por Favor, Sucesso" virou fenômeno entre a magrinhagem setentista gaúcha.

Composto em 1969, o hino do Liverpool leva assinatura do poeta Carlinhos Hartlieb, jovem agitador das concorridas Rodas de Som daquele tempo.

Por Favor, Sucesso


Presentemente, Luz – cuja idade é mistério maior do que ele próprio – faz outro tipo de súplica: "Por favor, me deixem em paz!".

Calejado, antes mesmo que eu me identifique como repórter, o cantor adivinha o mote da prosa. Malfadado, o bate-papo deveria ser a respeito da profusão de bandas gaúchas que batem em retirada para tentar a sorte em São Paulo, centro econômico-cultural do país.

Tal como o Liverpool fez ao pôr o pé na estrada rumo ao Rio de Janeiro 40 anos atrás – quando a fuga tinha no eixo Rio-São Paulo o destino mais cobiçado. Majestade que, de certa forma, os cariocas perderam. A Meca do rock, hoje, é São Paulo.

Em seu intratável, mas divertido, azedume, Fughetti Luz reina ao telefone: "Não quero mais falar sobre o Liverpool, não". A negativa só faz mitificar a reputação de punk por natureza do autor de hits como "Olhai os Lírios do Campo", "Bixo da Seda" e "Trem".

Em 1964, ainda crooner do conjunto Flamboyant, Elis Regina também deu no pé. Do IAPI, em Porto Alegre, direto para o Rio de Janeiro. Atitude rock, sem dúvida. ainda mais para uma mulher cuja arte estava recém começando a amadurecer naquele primeiro ano de chumbo.

Bandas e artistas pop (Os Cleans, Os Brasas, Almôndegas, Hermes Aquino, Rosa Tattooada, Garotos da Rua – e muitos outros), em suas respectivas épocas, nem pestanejaram quando convidados a sair de Porto Alegre.

E, nesse segundo decênio, nossos artesãos do pop, outra vez, estão na crista da onda. Na eleição dos melhores de 2010 feita pela revista Rolling Stone, três álbuns gaúchos aparecem no top 25: Fresno, Superguidis e – ora, veja só – Vitor Ramil.

Afundado num sofá da casa da Pública, a conversa que levo com Pedro Metz, cantor e letrista, versa justamente sobre este ir ou não ir. Na capital paulista, o casarão onde os guris da banda residem, ensaiam e compõem, fica em meio à boemia da Vila Madalena. 

CARA, CORAGEM E ERVA DE CHIMARRÃO - Mas o papo, assim como o rock de agora, muito pouco tem de novo. No gaulês Rio Grande do Sul, historicamente afeito a pelejas de toda sorte, o debate existe desde o dia em que cunharam a alquebrada insígnia "rock gaúcho".

Nos áureos anos 1980/1990 (boom do rock brasileiro, como gostam de chamar), muitas bandas gaúchas dançaram embaladas pelo suingado esquemão bancado pelas grandes gravadoras. Como destino, as selváticas plagas cariocas e paulistas.

Cara, coragem e, no alforje, a erva de chimarrão.

Grande parte dos retirantes, porém, como  bons filhos à casa retornaram. Em 2001, confessa o frontmen da Bidê ou Balde, Carlinhos Carneiro, o conjunto passou por altos e baixos em sua estadia paulista.

Dos mais aplaudidos da cena contemporânea do rock nacional, os guaibenses do Superguidis se apoderam da famosa frase de Dom Pedro II:

"Se é para o bem de todos e felicidade geral da nação, diga ao povo que ficamos!",  diz o guitarrista Lucas Pocamacha, parafraseando a História para justificar permanência em terra pampeana. Ainda.

Em solo bandeirante, Pedro Metz ajeita um carreteiro – "só para não perder o costume". Conta que a escolha por São Paulo foi, acima de tudo, profissional.

O perfil macro da cidade pareceu ideal para as ambições criativas da Pública. Louros, inclusive, repousam na "estante de prêmios" dessa (Re)Pública, onde com alta rotatividade recebem visitas de congêneres paulistanos. Como os músicos das bandas Biônica e Rock Rocket.

Entre os troféus, a estatueta arrebatada com o videoclipe de Casa Abandonada na edição de 2007 do Video Music Brasil. “Nos sentimos desafiados a tentar”, ressalta Metz, que arremata: "Não curtimos a situação cômoda que ficar no Rio Grande do Sul representa".

E logo se reconcilia: "Amamos Porto Alegre".

Parceiro de empreitada, o baixista Guilherme Almeida (filho do nativista Iraci Rocha) também discorre sobre o autoexílio. E fala por todos: "A escolha foi importantíssima em nossas vidas".

No caso dele, a brincadeira ainda tem rendido novos sons: além da Pública, Almeida anda enredado em projetos com Martin (guitarrista da banda de Pitty) e com Tita Lima – cantora paulistana que é acompanhada pelo guitarrista Guri Assis Brasil, outro integrante da Pública. 

Agora façamos o favor: o caso desfraldado pela banda porto-alegrense Fresno, estampado em todas as possíveis mídias, merece ser narrado. Em tempos que a indústria fonográfica agoniza em mortal concordata, a façanha conseguida por esses nativos da capital é um admirável triunfo. Autodefinida como "powerpop-rock-shoegaze"...

Mais só nas bancas!

rOCK nA pONTE aÉREA

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

iRREDUTIBILIZANDO

APLAUSO 110 nas bancas...

... e no Portal APLAUSO: 70 músicas do cancioneiro pop-gaudério disponíveis para download, com capa, encarte e informações exclusivas para que o internauta monte seus próprios discos

Na reportagem de capa de APLAUSO 110 ("Por favor, sucesso!"), o repórter Cristiano Bastos revela que nem sempre o Rio Grande do Sul é capaz de suportar o crescimento de artistas locais, especialmente quando se trata de rock-n-roll.

Desde antes dos anos 1960, muitas bandas buscam em São Paulo a fama e as vendas que o mercado gaúcho é incapaz de proporcionar. Estudioso do assunto, Bastos traz à tona um valioso debate mercadológico, ilustrado tanto por histórias de quem recém chegou à capital paulista quanto de quem foi e voltou – como a Bidê ou Balde, capa desta edição.

Para resgatar essa linguagem, APLAUSO também oferece aos seus leitores uma compilação, dividida em dois volumes (e um terceiro de extras), de arquivos históricos do rock rio-grandense. Idealizado e produzido por Cristiano (coautor do livro Gauleses Irredutíveis – Causos e Atitudes do Rock Gaúcho), o álbum Gauleses Irredutíveis Merecem APLAUSO pode ser baixado gratuitamente no site da revista: http://www.aplauso.com.br/.

Para que o leitor monte seus próprios discos, é só imprimir capa, contracapa e encarte (com informações de 70 músicas), desenhado com ilustrações feitas a partir de flyers de artistas e bandas de diferentes épocas do cancioneiro pop-gaudério.

Dos 70 fonogramas editados nesses dois álbuns, alguns são recém gravados, outros são inéditos ou foram colhidos quase diretamente em suas matrizes originais. É o caso de grande parte das canções e álbuns localizados entre as décadas de 1960/1970, cujas mastertapes, até hoje, jamais foram remasterizadas. É o caso de bandas como Os Brasas, Liverpool, Bixo da Seda e Os Cleans. Na medida do possível, Gauleses Irredutíveis Merecem APLAUSO procura coligar nomes que representam diversas “eras” da música jovem gaúcha.

Uma palhinha da coletânea...

Lançado em fita K-7, Último Verão, álbum de estreia de Julio Reny, apresentava o petit hit "Cine Marabá". A canção tocou bem nos primórdios da Ipanema FM, em Porto Alegre, e, tanto quanto, na extinta Fluminense, a "maldita", que irradiava os “venenos” de Niterói, Rio de Janeiro.

"Cine Marabá" é um dos fonogramas cedidos por Reny que foram reunidos na compilação "Gauleses Irredutíveis Merecem APLAUSO", com a qual a revista presenteia seus leitores.

A coletânea traz surpresas de artistas e bandas como Rosa Tattooada, Pupilas Dilatadas, Pública, Loomer, Júpiter Maçã, Os Replicantes, Yanto Latino, Os Cleans, Os Brasas, Conjunto Melódico Norberto Bauldauf e Lovecraft.

"Me Deixa Desafinar", novo single da Bidê ou Balde, é um dos hits do especial. Mimi Lessa, lendário guitarrista do Liverpool e do Bixo da Seda, hoje radicado no Rio, foi responsável pela liberação de duas gemas: uma delas é "Por Favor, Sucesso", o hino que dá nome a esta reportagem.

Outros destaques

El Mapa de Todos, agora no RS - Um dos extras da reportagem de capa de APLAUSO 110 já está publicado no Portal APLAUSO. Trata-se de uma entrevista com Fernando Rosa, editor do site Senhor F (http://www.senhorf.com.br/) e produtor do festival El Mapa de Todos, cuja segunda edição acontece entre 12 e 14 de abril em Porto Alegre. Na entrevista, Rosa faz uma profunda análise do panorama do rock independente sul-americano.

Outra entrevista exclusiva disponível no Portal APLAUSO é com o produtor paulista Leonardo Dias Pereira, que promove em São Paulo o "Urbanaque Apresenta", série de encontros roqueiros organizados pelo magazine eletrônico Urbanaque (http://www.urbanaque.com.br/). Em suas edições, o Urbanaque procura trazer bandas e artistas de fora de São Paulo, assim como do próprio rock.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

cOELHA bRANCA

Algumas pílulas te fazem crescer, outras te fazem encolher. E as que a sua mãe te dá não fazem efeito algum. (Grace Slick)

POR CRISTIANO BASTOS

Cena esquizofrênica do filme Medo e Delírio em Las Vegas, de Terry Gillian: esparramado na banheira louco de pedra, o narcotizado Dr. Gonzo (Benício Del Toro) implora a Raoul Duke (Johnny Depp) para que arremesse o toca-fitas na água quando a canção que ringe dos alto-falantes atinja o clímax.

O comando é imperativo: "Feed your head! Feed your head! – estrofes finais de "White Rabbit", música banida das rádios nortes-americanas, em 1967, por causa da apologia às viagens alucinógenas.

A voz que emposta potência e candura para cantar as aventuras de Alice in Wonderland, após ter lanchado  pílulas psicodélicas, é de Grace Slick, a bela, talentosa e politizada cantora e letrista do Jefferson Airplaine.

Em "White Rabbit", espécie de Bolero de Ravel embalado numa canção de ninar de movimentos circulares, um dos hinos da head music, Grace pincelou tonalidades ainda mais "dietilamídicas" à naturalmente lisérgica obra de Lewis Carrol.

Grace divide a autoria de "White Rabbit" com o irmão, Darby Slick, com o qual ela integrava o Great Society, banda que registrou a música antes do Airplaine.

Os irmãos Slick também assinam "Somebody to Love", peça sonora não menos simbólica que "White Rabbit".

São hits que fulguram no fundamental álbum do Jefferson Airplaine, Surrealistic Pillow, que marca o début de Grace nos vocais da banda da Costa Oeste dos Estados Unidos.

Musa do acid rock de San Francisco, Grace não foi a única fêmea talentosa da cena do rock psicodélico que prevalecia na Califórnia – e no mundo – no auge do Verão do Amor.

Mama Cass e Michelle Phillips (do Mamas and the Papas), Nico e Janis Joplin eram grandes vozes. Mas nenhuma delas juntava, tal Grace, intraduzível beleza, nata habilidade como songwritter e domínio sobre a complicada matemática construtora de canções pop e metricamente perfeitas.

O escritor gonzo Hunter Thompson sempre assumiu o fetiche por Grace Slick. Cansou de afirmar que música, além das estimadas drogas, sempre fora "combustível":

Pessoas sentimentais chamam isso de inspiração, mas o que elas realmente querem dizer é combustível. Isso acontece de novo, e de novo, e cedo ou tarde você é fisgado, e fica viciado. Toda vez que ouço "White Rabbit", estou de volta à meia-noite viscosa de San Francisco, procurando por música, dirigindo uma motocicleta vermelha veloz ladeira abaixo em direção ao Presidio, me curvando desesperadamente nas curvas através dos eucaliptos, tentando chegar ao Matrix a tempo de ouvir Grace Slick tocar sua flauta.

No rock dos anos 1970/1980, é clara a linha condutora que parte do estilo vocal de Grace Slick e influencia outras mulheres do rock: da chata (pra burro) Alanis Morrisete à chata (pra caralho) Dolores O'Riordan, da poetisa punk Patty Smith à runaway Joan Jett, todas reverenciaram – da melhor à pior forma – a força vocal de Grace.

Alcoólatra, vegetariana e defensora dos animais, com o fim do Airplaine Grace Slick encarou a insipidez do Jefferson Starship, cuja formação fora diluída numa enjoativa receita de hard rock ufológico e sintetizadores.

E o que ainda restara do Jefferson Airplaine reduziu-se à corruptela "Starship" e seu rock inofensivo, perfeito para rodar no easy listening boco-moco das rádios adultas.

A beleza e o charme de Grace Slick arrebataram muitos corações.

Apaixonado, o cantor folk Country Joe McDonald compôs a balada "Grace" em seu louvor.

Jim Morrison teve um rápido affair com ela encharcado em bourbon.

Em 1998, Grace confessou que, de todas as pessoas com quem sempre desejara ter um caso amoroso, só faltaram duas: o guitarrista Jimi Hendrix e o ator inglês Peter O'Toole.

Em 1994, após reclamações da vizinhança, um policial vai até a casa de Grace Slick, em Tiburon, Califórnia, conferir o que estava rolando. É surpreendido pela cantora completamente embriagada e por um cano fumegante apontado para sua cara.

A sentença de Grace foi estipulada em 200 horas de prestação de serviços comunitários. Ela também foi obrigada a comparecer aos Alcoólicos Anônimos durante três meses.

Hoje, Grace Slick jura que sua garganta dourada está longe da bebida. Mas o fabuloso canto de antes não se fez mais ouvir como naqueles dias - em que a vida era mais onírica e as cores pareciam vibrar com maior
intensidade.

gRAÇA

jEFFERSON aIRPLAINE lOVES yOU





segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

pSICODELIA à bRASILEIRA

A história do disco mais caro do Brasil, valendo até R$ 5 mil, é investigada em documentário

POR LEONARDO LICHOTE - O GLOBO

Rio de Janeiro - Inscrições rupestres misteriosas, mitos indígenas, boas doses de psicodelia, uma busca para reconstruir as obscuras origens de uma lenda da música brasileira…O roteiro tem elementos que parecem moldados para a ficção, algo como um Indiana Jones lisérgico.

Mas Nas Paredes da Pedra Encantada (visite o blog oficial), filme de Cristiano Bastos e Leonardo Bonfim, é um documentário -  "road doc", como define Cristiano - que investiga a história do raríssimo disco Paêbirú: Caminho da Montanha do Sol, de Zé Ramalho e Lula Côrtes, lançado em 1975.

- Há vários motivos para se falar de Paêbirú - defende Cristiano. - É o disco mais caro do Brasil, sua última cotação está entre R$ 4 mil e R$ 5 mil, o dobro do Louco Por Você, o primeiro de Roberto Carlos (existe uma edição pirata, em vinil, de Paêbirú, lançada na Europa, mas que não vem com o livro que acompanhava o original, trazendo estudos sobre a região e informações sobre a lenda do Caminho da Montanha do Sol). Mais que a raridade, ele é o fundador de uma psicodelia genuinamente brasileira, com elementos da cultura indígena. E sua história tem toda uma mística. Das únicas 1.300 cópias da prensagem original, 1.000 foram perdidas numa enchente em Recife. Nunca vi uma história tão fantástica como a que circunda esse álbum.

Jornalista, Cristiano tomou contato com a fantástica história quando fez uma reportagem para a revista Rolling Stone sobre o disco. Quando percebeu que sua apuração poderia render um documentário, se lançou com Leonardo Bonfim na aventura de tentar reconstituir os fatores que permitiram o surgimento do álbum.

O termo "aventura" não é exagero.

Cristiano morou entre Pernambuco e Paraíba por três meses, investiu dinheiro do seu bolso no filme - atualmente em fase de montagem - e penou para encontrar seus personagens. Mais que isso, quase foi preso durante as filmagens:

- Estávamos na cidade do Ingá do Bacamarte (município da Paraíba onde se localiza a Pedra do Ingá, onde estavam as inscrições que serviram de estopim para o processo criativo que gerou o disco) quando a polícia nos abordou, com vários carros e armas apontadas para nós. Estava havendo uma onda de assaltos a bancos na região, e eles, vendo aquele grupo andando de um lado para o outro e fazendo ligações, acharam que éramos ladrões. Tivemos que ser libertados pelo prefeito, que já sabia do projeto e inclusive colaborou com dinheiro para as filmagens.

O filme - ao qual O GLOBO teve acesso exclusivo - traz entrevistas com personagens como os músicos Lula Côrtes e Alceu Valença (que toca no disco), o arqueólogo Raul Córdula (que apresentou a Pedra do Ingá a Lula e a Zé Ramalho) e a cineasta Kátia Mesel (companheira de Lula então e sócia dele no selo Abrakadabra, que lançou o disco).

As gravações registram muitos momentos musicais espontâneos e até cenas que reforçam as lendas em torno do disco.

- Cada lado do álbum duplo de Paêbirú tem um conceito: fogo, terra, ar e água. Cada um tem uma sonoridade. Fogo é o lado mais roqueiro, ar são músicas mais etéreas… No lado da água, tem uma parte que faz louvações a Iemanjá. No filme, quando Kátia Mesel canta isso, começa a chover - narra Cristiano, que alimenta mais um tanto a mística ao dedicar o filme ao deus Sumé (parte da mitologia de Paêbirú).

Zé Ramalho - que até hoje visita a Pedra e acredita que extraterrestres estão por trás de suas inscrições - não dá depoimento para o filme. Mas autorizou os diretores a usar todas as músicas para contar a história.

- Existe uma rusga entre Zé e Lula, e Zé preferiu não falar sobre o álbum. Mas todos no filme falam dele com muito carinho - nota Cristiano. - Apesar de negar a entrevista, Zé foi muito gente fina, fez um documento liberando a música… Só não queria ter a imagem dele hoje no filme. Ele pergunta por que não falaram do disco quando ele foi lançado (o álbum foi completamente ignorado na época). Aquilo foi muito decepcionante. Além de tudo, Zé Ramalho considera a obra que ele fez solo, posteriormente, muito mais importante. Como o disco tinha um aspecto coletivo, ele ali não tem o peso de ser o portador da mensagem, é só mais uma das vozes.

Mesmo antes da finalização, os diretores já receberam convites para apresentar o filme em festivais.

- Nosso desejo é estrear no É Tudo Verdade - diz Cristiano. - Seria ótimo também ter a exibição na TV, num espaço como o Canal Brasil.

Eles contam com a força da história. E os poderes de Sumé.




Pedra Templo Animal

Música e arranjo - Lula Côrtes & Zé Ramalho
Trompas marinhas - Lula Côrtes
Voz - Zé Ramalho
Okulelê - Zé Ramalho
Viola de 12 - Lula Côrtes
Sereias - Katia e Inácia
Percussão - Marconi, Israel, Agrício
Baixo base - Paulo Raphael
Coro - Alceu, Zé Ramalho
Letra - Lula Côrtes

sábado, 5 de fevereiro de 2011

lITTLE sUZY*

What's It Like To Be Loved (1976)


*Na gestação pré-Patty Smith/Debby Harry/Joan Jett, os primeiros anos da década de 1970, a mignonzinha Suzi Quatro flertou solitária num universo dominado por homens & suas guitarras.

Suzi, possivelmente, foi a primeira fêmea-de-frente do rock-and-roll.

Ao ser descoberta pelo empresário Mick Most, em Detroit, mulheres não existiam no comando das bandas (a que lhe escoltava era formada só por homens). Antes, porém, acompanhada das irmãs Patti, Nancy e Arlene, ela tocou seu baixo Fender Precision-1957 nas Pleasure Seekers.

Norte-americana, Suzi Quatro, literalmente,  invadiu a parada glitter européia com sua voz sexy e rouca, e arrematou alguns Top of The Pops ("Can the Can", "48 Crash", "Daytona Demon", "Devil Gate Drive).

Aggro-Phobia é o terceiro e, também, um dos melhores álbuns gravados por Suzy. Contém os hits de peso "Tear Me Apart", "Wake Up Little Suzy", "Make Me Smile" (cover de Steve Harley).

A dançante "What's It Like To Be Loved" antecipa a fórmula discothèque-rock aprimorada pelo Blondie no embalo de "One Way Or Another": guitarras sintetizadas, efeitos de voz e a indefectível bateria horizontal marchando sobre a melodia.

Padrão ainda muito emulado...

Mas o que é rock senão eterna reinvenção?

Over and over.

domingo, 23 de janeiro de 2011

20tH aVANT-gARDE mETAL

*A Marc Bolan Les Paul Gallery Les Paul está exibindo, na Namm Show (espécie de entidade filantrópica do rock), o modelo Gibson manejado por Marc Bolan em seu hit-mor:

"20th Century Boy". 

Guitarrista do T-Rex, Bolan morreu tragicamente num acidente de automóvel aos 29, em 1977.

Editada em março de 1973, no formato 7' single, foi registrada apenas para ser b-side de “Free Angel” - que não foi hit...

Erro feio de cálculo.

Produzida por Tony Visconti, “20th Century Boy” sucedeu nas paradas o single “Solid Gold Easy Action”, de 1972. Um ano depois, Bolan lançava “The Groover”.

As três canções não deixam dúvida do quanto, naqueles dias, Bolan apostava no estilo criado por ele: o “avant-garde metal”.

"20th Century Boy"

No Reino Unido, a música foi chart #3 e inclusa, também, como bônus-track no maravilhoso álbum Tanx. De inegável rítmica/compressão/balanço, seus trovejantes riffs tomam de assalto os ouvidos mais incautos.

Pega de surpresa até quem ouviu "20th Century Boy" dezenas de vezes.

Para a soundtrack do (exagerado) filme Velvet Goldmine - que joga mais purpurina que devia sobre o glitter rock -, o Placebo releu a canção numa versão anoréxica. 

Fac-simile sem nada de manha e sensualidade transbordantes do astro pop Marc Bolan.

Confira o 'suíngue maroto' de Bolan no televisivo holandês Muzik Laden (play it very loud!).

"20th Century Boy" ganhou versões de bandas como The Replacements e Siouxsie and The Banshees. Siouxsie, aliás, quase é uma versão feminina de Marc Bolan - da qual era fã desde meninota.

O Sigue-Sigue Sputnik fez uma corruptela: "21st Century Boy"

Em 1991, “20th Century Boy” voltou às paradas britânicas. Após ser usada num comercial da Levi's, entrou pro Top 20 inglês.

Estrelado pelo jovem, e totalmente  desconhecido, à época, ator Brad Pitt (veja-o), o comercial deu-lhe fama. 

Há quem diga: as locações são as mesmas do filme Thelma & Louise...

E os riffs de "20th Century Boy"?

São riffs tão simples (e poderosos!), que estão aí para dedilhar de aficionados nos milionários games Guitar Hero 5 e Rock Band Friends.

Para mim, facinho, facinho estrelariam um "3 mais" de todos os tempos.

Misteriosa, a letra é umas das melhores do cancioneiro rock-and-rol. Mas eu sou suspeito para falar. Ou melhor, para cantar: 

Friend say it's fine, friends say it’s good
Everybody says: it's just like Robin Hood
I move like a rat, talk like a cat, sting like a bee
Babe i'm gonna be your man
And it's plain to see you were meant for me, yeah!

Na Terra do Sol Nascente, (Marc Bolan é tão amado quanto Pelé no Japão), "20th Century Boy" se grafa com estes ideogramas:

"20世紀少年".

Cool, né?!

bRAD cENTURY bOY

Who's Next?