sexta-feira, 4 de abril de 2008

aLL tHE yOUNG dUDES

Com delay de semanas, finalmente assisti Juno – numa cópia perfeitamente pirata, pra dizer a verdade, e no cinema privê da minha casa.
Se as salas da Capital Federal não baixarem os preços absurdos dos ingressos (entre R$ 16 e 20 a inteira), não vou mais.
Cinema em Brasília é só pra quem tem grana, como quase tudo. O populacho não vai. Saudades do cineminha a três pilas.
Até gostaria de ter visto Juno no cinema, mas, além dos valores abusivos, tempo anda mais curto que música dos Ramones.
Mal sabia sobre o enredo: como muitos, fui seduzido pela boataria. Não pelo falatório da imprensa; pelo dos espectadores, quase sempre mais sensato que algumas resenhas.
Uma colega soltou a frase aparentemente comum – "ainda se vai ouvir falar muito da Ellen Page". Pensei: "não é clichê, não, é definidor". Ainda vamos ouvir falar muito dessa talentosa guriazinha.
Um tempão já faz que consegui me libertar da necessidade de ver, ler ou ouvir qualquer coisa antes ou no mesmo timing que ela tá rolando.
A última coisa que acompanhei quando estava acontecendo foi Front 242, e nem gosto mais. Tudo o que veio depois, saquei anacronicamente, e sem vergonha. Cansa "ficar por dentro". Atualizar-se, ainda mais hoje, é penoso como correr a São Silvestre – por isso admiro o Lúcio Ribeiro, pra mim um atleta. Estou falando isso com todo o respeito. Eu mesmo não conseguiria. Teria que treinar muuuito.
Quando se é jornalista, então, se informar de tudo-que-rola-no-circo-freak-do-bizz é quase obrigação. Não acredito nesse princípio, e nem que tudo é um circo freak, necessariamente - a não ser que o assunto seja pauta, ou, saber antes de todo mundo, "o seu lance". Não sou talhado pras tendências, mas alguém precisa mapeá-las, não é?
Entendi o primeiro disco dos Stone Roses com dez anos de atraso. Quando caiu a ficha todo mundo já tava noutras. O único problema disso é passar por estúpido. Saquei a jogada dos Roses e o álbum foi direto pra minha heart list.
É quando você se sente meio do dono da banda. Ninguém tá mais ouvindo aquilo - só tu. Com Juno não foi assim, foi quase, porque até o atraso de hoje diminuiu com avanço & mudança tecnológica das mídias.

Provavelmente sou eu o errado, mas imagino pré-estréias desse jeito: as portas do cinema se abrem, vai começar a sessão. Pouco antes, monte de gente aglomerada no saguão se prepara pra enfrentar duas horas de aeróbica intelectual coletiva. Mentes privilegiadas em sintonia estésico-xamânica.
Muitos colegas de profissão rodam por ali, claro – faz parte do jogo. "Que cabelo mais gozado o daquele sujeito", você pensa meio deslocado, quase um misantropo em síndrome de pânico. As pessoas te dão medo, com o detalhe que o esquizo, no fundo, é você.
Descolados profissionais, publicitários embalados em gravatinhas com ideogramas chineses, fashionables fora de moda e fashionables além da moda, pessoas bonitas a granel, garotas tão lindas, produzidas e perfumadas que chegam a lhe desviar a atenção pra volúpia das lustrosas pernas à mostra.

Juno é dos melhores filmes que vi nos últimos tempos, pode crer. Como Bruxa de Blair, não existem segredos de produção. Uma metáfora roqueira o explica muito bem: assim como o Aerosmith jamais gravaria um disco como Nevermind, roteiristas putas-velhas de Hollywood nunca escreveriam um filme como Juno. Eles não são mais jovens.
A responsável pelos crocantes diálogos que deram a Juno o Oscar de Melhor Roteiro é Diablo Cody, blogueira e ex-stripper. A cada frame, como uma metralhadora de frases, Diablo nos diz, mediada pela cativante personagem de Juno, coisas que fazem parar pra pensar - e quase se perde o próximo diálogo. Tive de usar o rew umas vezes.
Bleeker é um cara legal e tem bem cara de Bleeker. Mais legal é a maneira como tudo se resolve no final. Faltam no mundo mais mulheres como Juno, eu pensei, menos beautyzadas e mais inquietadas. Queria deixar claro: todas as mulheres não são assim, antes que alguma Valerie Solanas bata na minha porta querendo me castrar. Morro de medo, mas várias são.
Juno é esperta. Com 16 anos, sacava que não é fácil superar o que Iggy já fez pela humanidade: não precisa fazer mais nada por nós, Iggy, nós e que precisamos por você! Pode até fazer discos ruins que tá liberado.
Agora, me perdoem: sou obrigado a concordar - quase inteiramente - com ela: Sonic Youth é chato. Gosto muito do Sister e do Go, mas não tenho saco pra coisas noise progressivas dos outros disco. "Quando é que vai entrar aquela parte barulhenta, caralho?".
Acho que o Pop pensa o mesmo. Falou isso quando veio ao Brasil:
Sabia que vinha o Sonic Youth, que tem um som mais cabeça, e sei que aqui existe o "intelectual latino-americano superprotegido" [risos] — em todo país tem sempre um grupinho de gente com grau universitário que nunca é ameaçado... Pensei: "Bem, se eles gostam de Sonic Youth, o que vai ser de nós?
E a mulher daquele cara, o roqueiro dos jingles? Lembrou uma namorada que tive uma vez, tão bonita, chata e controladora quanto. Com a diferença que jamais vestiria uma t-shirt do Alice in Chains.
Tá certo que a moça do filme seria ótima mãe, mas, chata seria pro resto da vida. Mulheres adoram reclamar dos homens. Segundo o olhar feminino, homens são seres dotados de defeitos históricos que, heroicamente, elas "têm" que mudar seja lá qual for o custo - ainda que o custo seja o amor.

Não há nada pior na vida do homem que a mulher que lhe aporrinha o tempo inteiro por qualquer coisinha. Os homens possuem milhões de defeitos (que nós até reconhecemos), mas, me desculpem, o defeito da chatice é quase exclusividade delas. Elas sabem disso e nisso tem a expertise.
Pior ainda é a mulher que se investe da missão de mudá-lo. Um dia a namorada chegou pra mim, num momento de desestabilização financeira e soltou essa, imperativa: "Não precisa comprar mais discos. Já tem o bastante. Pra que mais? Chega!". Aonde que já se viu uma coisa dessas?
Onde quer que esteja, espero que tenha encontrado um homem-massinha de modelar pra montá-lo e remontá-lo ao bel-prazer. "Só o masoquismo salva", seu lema.
O filme também é sobre isso: o cara que se libertou do casamento frustrado pra viver o sonho juvenil que ainda vivia nele, e a mulher que queria ser mãe, mas não podia.
É compreensível o fato das mulheres, que amadurecem antes de nós, varões, não verem mais graça em barbados que ainda curtam ouvir Melvins e assistir filmes gore. Agora, nos achar infantilizados por isso e querer que abandonemos nossas paixões é o cúmulo.
Depois, querem encontrar respostas pra sua cantilena amorosa na auto-ajuda: "Porque, Deus do Céu, meus relacionamentos nunca dão certo?!".
Quando Juno dança a lentinha com o grunge boa-praça ao som de "All the Young Dudes" - do Mott the Hoople* -, é que a coisa se complica: apaixonar-se por Juno ou por Diablo – afinal, todas aquelas frases maravilhosas sairam da cabeça dela.
Então, não sei se me decido entre pedir uma ou outra em casamento. Juno não dá - é de menor. Com a Diablo, pré-balzaquina, rola. Será que ela abre meu e-mail? Deve ser quente como o inferno.
*O termo "punk" foi usado numa canção da tradição rock em "Wizz Kids", do Mott the Hoople: "her father was a street punk and her mother was a drunk" (o pai dela era um punk das ruas e a mãe, uma bêbada )