Com discursos radicais e forte tendência ao conflito, políticos como Jair Bolsonaro ganham voz e colocam fogo nos debates ideológicos
POR CRISTIANO BASTOS -
ROLLING STONE
ILUSTRAÇÃO: LÉZIO JÚNIOR
Desde que o Brasil restaurou a liberdade democrática, há 26 anos, o cenário da política nacional parece ebulir na intensidade de um vulcão que desperta em calorosa erupção. Como em nenhum outro momento da história, o debate nunca foi tão vasto, um sinal de que a democracia está amplamente assegurada.
Nos últimos tempos, respingando em todas as direções, à direita ou à esquerda, inflamáveis questões impregnaram a opinião pública e os noticiários - uma autêntica "fornalha ideológica" na qual ardem temas controversos da atualidade: homofobia, união homoafetiva, cotas raciais, religião, pena de morte.
E, em um déjà vu dos anos militares, até a tortura entrou em pauta.
Mas que novos ares são estes? Afinal, os tempos vivenciados pela política atual não são diferentes dos anteriores, nos quais a democracia reinou no Brasil.
Vale lembrar, contudo, que a política sempre foi o "reino do conflito ou do consenso", conforme reforça o cientista político Octaciano Nogueira, autor da obra Vocabulário da Política.
"Ou buscamos o consenso ou entramos em conflito. Todos gostaríamos de conceber a política como o reino do consenso e não como a predominância do conflito. O conflito, porém, é inerente à política."
Conflito é quase a palavra de ordem para o deputado federal Jair Messias Bolsonaro (PP-RJ), cuja popularidade foi alçada graças às suas extremadas declarações sobre tópicos polêmicos como homofobia, preconceito racial, tortura, pena de morte e militarismo.
Um militar da reserva, Bolsonaro alardeia abertamente, por exemplo, as "benesses" do golpe militar de 1964. Teria sido, a seu ver, um "glorioso período" da história do Brasil - "Vinte anos de ordem e progresso".
Tão anacrônico quanto o totalitarismo, o parlamentar advoga a favor do uso de tortura em casos de tráfico de drogas e sequestro. "O objetivo é fazer o cara abrir a boca", justifica. Mortalmente radical, por outro lado, é sua solução para crime premeditado: execução sumária.
Incontáveis são as controvérsias com as quais Bolsonaro se envolveu desde que entrou para a política, em 1988. Seu linguajar impetuoso não poupou a presidente Dilma Rousseff, o ex-Luiz Inácio Lula da Silva e, muito menos, o antecessor, Fernando Henrique Cardoso.
Quando FHC ainda estava no poder, em 2000, Bolsonaro disse que o ex-presidente estava "cometendo um crime" ao governar o Brasil da forma como fazia. Deveria, portanto, "ser fuzilado".
Hoje, o deputado afirma que é preciso analisar o contexto da época - e também levar em conta seu nacionalismo exacerbado:
"Quando FHC privatizou a Vale do Rio Doce, falei que, se vivêssemos num país sério, ele seria fuzilado".
Segundo ele, o lucro da empresa foi de R$ 50 bilhões em 2010. "O que a Vale produziu até hoje para o país? Somente buraco. Tira daqui o que temos de melhor, in natura, minerais, e vende a preço de terra no primeiro mundo."
Na cartilha educativa de Jair Bolsonaro, para "corrigir" filhos com tendências homossexuais, reza um antiquado método: as palmadas. De acordo com ele - que declarou preferir "ter um filho morto em um acidente a um homossexual" -, o propósito seria "mudar o filho gayzinho".
Como era de se esperar, a artilharia pesada fulminou como belicoso petardo entre defensores dos direitos humanos e associações LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais). A despeito desse flagrante reacionarismo, é válido lembrar que nenhum político está na Câmara, no Senado ou na Presidência da República sem, antes, receber os votos dos cidadãos.
"Bolsonaro não sobressai por contribuições, grandes pronunciamentos ou pela defesa de reconhecidas ideias democráticas. Ele faz, justamente, o contrário", afirma o cientista Nogueira, para quem o deputado do PP "prega no deserto", ou seja, fala somente para um pequeno segmento de extrema direita.