sábado, 26 de maio de 2012

o hOMEM dA bOSSA

POR CRISTIANO BASTOS - MAGAZINE BRAZUCA

Começo de noite no Copacabana Palace, Rio de Janeiro. Quando Sérgio Mendes desce para conceder a entrevista, pontualmente às 18h, os hóspedes do luxuoso hotel ainda  aproveitam a imensa piscina do restaurante Pérgula.

O pianista chega com os cabelos impecavelmente penteados para trás, úmidos do banho. Veste a combinação camisa branca e jeans. O perfume é uma fragrância masculina marcantemente cítrica.

Mendes trocou o Rio por Los Angeles há muito tempo.

Em 1961, estreou com o Sexteto Bossa Rio, com o qual gravou o disco Dance Moderno. Excursionando pela Europa e pelos Estados Unidos, registrou vários álbuns ao lado de músicos consagrados, como Cannonball Adderley e Herbie Mann.

Mendes mudou para os EUA em 1964, onde produziu dois álbuns sob a chancela do Brasil '64. Lá começou o grupo Sérgio Mendes & Brazil '66, o qual ganhou sucesso mundial com a versão de "Mas que nada", de Jorge Ben, embalada na batida da bossa nova.

Relaxado no hall do Copacabana Palace, o homem que, em 1967, tocou na Casa Branca para o presidente Nixon e ganhou o Grammy de melhor álbum de World Music faz um pedido simples: água com gás e pedras de gelo.

Seus olhos brilham quando fala de seu amor pela música brasileira.

Com o gravador desligado, diz que o segredo do sucesso é zelo: "É o músico estar a par de tudo que acontece". No meio da conversa ganhou um beijo na testa do filho Tiago, 14, roqueiro que chegou vestindo t-shirt dos Sex Pistols.

No fim da conversa recebeu telefonema de Gustavo, filho mais velho do casamento com a segunda esposa, Gracinha Leporace – sua cantora favorita, como frisou na entrevista.

Sérgio Mendes está no Brasil para o pré-lançamento do seu novo álbum de sucessos, Encanto.

A meta é suceder Timeless, que vendeu mais um milhão de cópias. Tal qual o anterior, Encanto é outra  caleidoscópica obra de Sérgio Mendes.

Tem participações de Herb Alpert, Lannie Hall, Natalie Cole e de brasileiros como Carlinhos Brown e Toninho Horta.

A recriação do maior hit de sua carreira, "The Look of Love", de Burt Bacharach - interpretada por Fergie, do Black Eyed Pea e produzido por will.i.am - é a promessa de estouro. A canção segue a fórmula de sucesso que reviveu "Mais que Nada" em Timeless.

Após lançar Encanto no Brasil, o pianista planeja sair em turnê pela Europa e Ásia. Depois quer voltar ao Cannegie Hall, palco no qual Sérgio Mendes pretende repetir o êxito de 40 anos atrás.

Há quatro décadas, o disco Herb Alpert Presents Sergio Mendes & Brazil 66 vendia milhões de cópias conquistando os Estados Unidos, a Europa e, por fim, o mundo.

Sua música influencia artistas pop "world music" como Beck e David Byrne e também jazzistas. É o caso de Winton Marsallis. Quando começou desconfiava que seria assim?

Sérgio Mendes - No inicío da carreira a gente nem pensa. É difícil prever o que vai acontecer – sempre é o elemento surpresa. O mais importante, nesse tempo todo, e até hoje, sempre foi a curiosidade, a vontade de fazer coisas diferentes e de trabalhar com músicos e cantores de várias partes do mundo. A disponibilidade de aprender e de trocar idéias musicais com outras pessoas sempre foi um traço de minha personalidade. No Brasil, tive vários grupos e acompanhei muitos cantores e cantoras. Fiz bailes em Niterói e toquei em boates do Rio. Foram experiências muito importantes para minha carreira internacional.

Qual o momento mais marcante do seu início nos Estados Unidos?

Mendes - Quando cheguei, em 1962, fui ao Birdland escutar o saxofonista Cannonball Adderley, meu ídolo. Cannonball me convidou para tocar com ele e eu, nervosíssimo, aceitei. No dia seguinte, me chamou para fazer um disco. A partir daí outros encontros aconteceram: Herb Alpert, Frank Sinatra, Fred Astaire. Há quatro anos, will.i.am aparece em minha casa com meus discos, se dizendo fã e que adorava minha música. É sempre renovador conhecer novos músicos e ter essa troca. Sempre me surpreendo quando Beck e bandas como Metallica, por exemplo, vem me dizer influenciados pelo "Sérgio Mendes Sound".

Nos álbuns Timeless e Encanto, o que os novos artistas acrescentaram aos velhos clássicos?

Mendes - O encontro desses jovens com meu trabalho – energia nova. Quando regravo "Mais que Nada", por exemplo, grande sucesso há 40 anos e de novo, em 2006, é sucesso mundial, tem muito a ver com a melodia de Jorge Ben e com a canção, que é eterna. Mas, também tem a ver com a cara nova que o Black Eyed Pea deu à música.

O que difere Timeless de Encanto?

Mendes - Timeless foi uma constelação de astros convidados: Marcelo D2, Erykah Badu, Justin Timberlake, Jill Scott, Stevie Wonder interpretando grandes melodias e os clássicos da música popular brasileira. Em Encanto tentei fazer algo mais "internacional". O repertório ainda são os clássicos da MPB cantados em inglês, português e castelhano. Encontrei o Giavanotti na Itália e fizemos "Lugar Comum", do João Donato, cantando em português; ele respondendo em italiano. Tem o jovem colombiano Ruanes, atualmente o maior cantor em língua espanhola. Fergie, que, diria, é a cantora mais popular do mundo. Decidi refazer "The Look of Love" - quatro décadas depois do sucesso seu estrondoso - com Fergie numa versão funk pancadão. "Água de Beber" virou rap com will e a participação de Toninho Orta. É um disco mais colorido, tem mais caras e lados. A idéia é a mesma de Timeless: colaboração criativa entre músicos de diversos lugares. "Encanto" é uma palvra linda: representa o charme, perfume e sensualidade da música brasileira.

Você foi um dos responsáveis pela popularização da música brasileira no mundo. Dá para explicar a atração exercida pela musicalidade do Brasil?

Mendes - É uma atração do mundo, não só dos Estados Unidos. O encontro de Stan Getz com Tom Jobim, João Gilberto e Astrude foi um momento único da nossa música. O interesse sempre existiu e continuou. O fenômeno Brasil 66 foi um caso disso. A atração aconteceu justamente por conta da originalidade, da sensualidade e, especialmente, pela força das grandes melodias que as canções têm.

Você acompanha a música brasileira feita hoje? Acha legítimas manifestações como o funk, por exemplo?

Mendes - Ouço o que me chega aos ouvidos. As pessoas me mandam muitos discos do mundo inteiro. Recebo coisas do Brasil, da Europa, da África. Estou sempre ouvindo, mas, hoje em dia, é impossível ficar a par de tudo o que está acontecendo. Estou sempre ligado. Tenho um filho de 14 anos e outro de 21. Prefiro não falar sobre isso porque vou acabar esquecendo de citar coisas muito importantes. O Brasil é uma usina de novas energias – inclusive, funk, rap e pagode vão nessa esteira. A diversidade é a coisa mais forte da música brasileira, não há dúvida.

Jorge Mautner escreveu, na edição pirata da Rolling Stone brasileira, em 1972, que Roberto Carlos foi o "primeiro ídolo pop panamericano", pois transitava por Cuba, México e países sul-americanos. Concorda com tal, visto que, na época, você também alcançava sucesso internacional?

Mendes - Concordo plenamente com Jorge Mautner – está certíssimo: Roberto Carlos é um artista da maior importância no mundo.

Encanto reúne vários convidados especiais. Como conseguiu juntar tantos nomes?

Mendes - O processo foi parecido com Timeless. Quando gravei, tinha ideia de quem gostaria que participasse. Eu telefonava para as pessoas perguntando se queriam fazer parte do projeto. A sorte é que todas quiseram.

Do lançamento e Oceano a Timeless passaram-se dez anos. Porque o grande intervalo entre um álbum e outro?

Mendes - Depois de Oceano fiquei sem idéias. Foi importante ter dado uma parada nas gravações para reformular a cabeça. Foi ótimo. Voltei aos estúdios renovado.

Como Herb Alpert ajudou em sua carreira?

Mendes - Ele foi muito importante. O Brasil 66 começou na sua gravadora, a A & M Records (Alpert & Moss), que muita gente pensava ser Alpert & Mendes. Infelizmente não era verdade (risos). Alpert me convidou para fazer parte do cast da gravadora, produziu meu primeiro disco e acabou casando com uma das minhas cantoras, Lannie Hall. Em Encanto, convidei Herb para tocar trompete e Lannie, para cantar. É uma amizade de mais de 40 anos.

Ainda lembra a sensação de tocar no célebre concerto da bossa nova no Carnegie Hall, há 40 anos?

Mendes - Foi uma experiência maravilhosa. Na época, eu tinha o grupo Bossa Rio. A idéia de chegar aos Estados Unidos, pela primeira, vez e tocar no Carnegie Hall era o sonho que se concretizava. Toquei com Tom Jobim e João Gilberto e depois conheci Stan Getz e Dizzy Gillespie. No dia seguinte fui ao Birdland conhecer Cannonball Adderley.

Qual a melhor recordação que gurda de sua carreira?

Mendes - Fiz duas turnês com Frank Sinatra: uma em 1968, outra em 1980. Rodamos o mundo todo e ficamos muito amigos. Eu abri os espetáculos de Sinatra com o meu grupo. Também trabalhei com Fred Astaire. Astaire dançou "The Look of Love" na entrega do Oscar de melhor canção, em 1968. Não levou o prêmio, mas, só vê-lo dançar, enquanto tocávamos, foi incrível. São esses percursos mavavilhosos que tive a sorte de ter.

domingo, 15 de abril de 2012

pEIXE vIVO

Romário já foi o melhor jogador de futebol do mundo. Hoje, fora do habitat, é um dos deputados federais de maior destaque em Brasília. Quantos gols mais ele ainda pretende marcar na vida?

POR CRISTIANO BASTOS
FOTOS: MURILLO MEIRELLES


Favela do Jacarezinho, zona Norte do Rio de Janeiro, meados dos anos 50. O rádio, aparelho sagrado nos lares brasileiros, está sintonizado no prefixo PRE-8, no programa César de Alencar, o mais ouvido do Brasil.

No horário das 15h, a grande atração era intelectual: o fenômeno "Romário, o Homem Dicionário", célebre pelo vasto vocabulário, que para amplificar o mistério em torno de si ornava a cabeça com turbantes indianos e se fantasiava com vestes exóticas.

A semana inteira, os ouvintes estudavam palavras difíceis para desafiá-lo.

Qualquer um do auditório podia perguntar: "Seu Romário, o que significa 'zíngaro'?"

Ele concentrava-se por instantes e respondia:

"Cigano, ou boêmio."

"Uma salva de palmas!", comandava Alencar. A claque delirava.

Outro desafiante tirava um papelzinho do bolso e investia:

"Me diga o que quer dizer 'helíaco'."

Em tom professoral, Romário respondia: "Diz-se do nascimento ou ocaso de um astro".

Ninguém jamais embolsou o polpudo prêmio que seria pago a quem apresentasse um vocábulo desconhecido para o craque das letras. Reza a história de que não houve sequer uma vez em que ele tenha errado. Romário era imbatível com as palavras.

Dono de espirituosas tiradas, o jovem Edevair de Souza Faria era tão fiel ao programa radiofônico quanto ao América Futebol Clube, seu time do coração. Recém-casado com Manuela Ladislau Faria, a dona Lita, ele buscava um nome importante para batizar o filho que se encaminhava. E não pensou duas vezes em batizar o rebento com o nome do ídolo do rádio.

Romário de Souza Faria foi escalado por "Papai do Céu" (como ele gosta de dizer) para entrar em campo no dia 29 de janeiro de 1966. E, tal qual seu homônimo, predestinava-se a acertar incontáveis vezes ao longo da vida. Mas, ao contrário do imbatível Homem Dicionário, a errar outras tantas também.

"Sou bem diferente do Homem Dicionário. Porque de vez em quando eu erro, né?", assume o baixinho, do alto de seu 1,69 m. Porém, não é preciso dizer que a fama do proverbial "peixe" foi bem mais longe.

Da Holanda ao longínquo Qatar, nos Emirados Árabes, o nome de Romário – e suas façanhas – correram o mundo. Apelidos não faltaram: "Gênio da Grande Área", "Reimário", "Romágico". Em 2001, sua marrentice foi satirizada na Escolinha do Professor Raimundo de Chico Anysio, com a paródia "Ramório".

Os fãs, para recordar os feitos heroicos nos 11 clubes para os quais o jogador emprestou sua arte (cronologicamente: Estrelinha, Vasco da Gama, PSV Eindhoven, Barcelona, Flamengo, Valencia, Fluminense, Al-Sadd, Miami, Adelaide United e, realizando o sonho do falecido pai, o adorado América, pelo qual disputou uma única partida), instituíram, em 11 de novembro de 2011, o "Romarian Day."

Atualmente fora dos gramados, palco habitado profissionalmente por mais de 20 anos, é no minado campo da política nacional que, até 2015, o deputado federal Romário disputará suas partidas. Em uma chuvosa tarde de terça-feira de março, ele está sentado relaxadamente em seu escritório abafado de 40 metros quadrados, no anexo da Câmara dos Deputados.

O número do gabinete (411) alude ao cabalístico 11 da camisa com que inúmeras vezes se sagrou campeão. Vestindo o amarelo da seleção, o centroavante – escudado pelo parceiro Bebeto – foi o expoente decisivo da conquista do tetra na Copa dos Estados Unidos, em 1994. Na estante no canto, descansa uma réplica da Taça Fifa que ele levantou em 17 de julho daquele ano.

Amaury Jr., veterano colunista televisivo, também está na sala, e quer saber de Romário se ele frequenta as baladas de Brasília. "Já tive bastantes fraquezas", ele confidencia.

Durante o expediente, de terça a quinta-feira e sem hora para terminar, o gabinete é assolado constantemente por políticos, representantes de entidades e toda sorte de pessoas em busca de algum tipo de apoio.

Pedem desde autógrafos, cessão de imagem, passagens e, se for possível, até dinheiro vivo. Em cima da mesa, uma pilha de objetos (livros, fotografias, fardamentos oficiais) o aguarda para que neles Romário eternize o autógrafo. A maior parte do material é relacionado ao Vasco, flâmula com a qual os torcedores mais o identificam.

O telefone toca intermitentemente. Uma das ligações, revela a secretária, é de Andrew Parsons, presidente do Comitê Paraolímpico Brasileiro. "Precisa urgentemente falar com o deputado", ela explica.

Coberta por fios prateados, a cabeça de Romário não esconde a calvície. Em 2007, quando atuava pelo Vasco, a queda de cabelo chegou a levá-lo à suspensão de 120 dias nos jogos do Campeonato Brasileiro. Tudo por causa da loção Propécia (para o combate da queda de cabelo), que contém a substância finasterida, proibida pelo Controle de Dopagem da CBF.

"Se [o remédio] fazia algum efeito era ao contrário, pois eu corria cada vez menos e fazia menos gols. Até brinquei, na época, que era o 'doping do Paraguai'", diz, acariciando a cabeça e esboçando um raro sorriso (na verdade, ele é “tímido”, garante a assessora).

Na ocasião, Romário está trajando um bem cortado terno Armani azul-petróleo riscado com listras brancas. Embora tenha cursado dois períodos de educação física na Universidade Castelo Branco (RJ), poucos sabem que ele também estudou Design de Moda na faculdade Estácio de Sá, visando ser "estilista de moda masculina e feminina".

É elegante e vaidoso, mas não se considera metrossexual. E, ainda que carregue marca de furo na orelha, ao menos na vida pública dispensou o clássico brinquinho. Ligeiramente caídos e avermelhados, os olhos estão sempre atentos, como se vigilantes, e a língua, levemente presa, permanece afiada. Romário atende o celular, fala rapidamente e, após desligar, volta-se em minha direção.

"O cara ligou pra avisar que hoje vai ter uma reunião pra decidir se vai ter uma reunião amanhã. Foda, né?"


*Leia a reportagem na íntegra.

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quinta-feira, 8 de março de 2012

eLAS qUEREM mAIS pODER

No ano em que se completam oito décadas da instituição do voto feminino no Brasil, a presença de mulheres em cargos políticos ainda deixa a desejar


POR CRISTIANO BASTOS
ILUSTRAÇÃO: LÉZIO JÚNIOR


“Ô abre-alas/ que eu quero passar!” 


Até hoje ecoa o inesquecível refrão da primeira marchinha a estrear no Carnaval, composta por Chiquinha Gonzaga (1847-1935) em 1889, o ano da Proclamação da República.

De caráter simbólico, o hino realmente abriu alas: feminista, abolicionista e também a primeira mulher a reger uma orquestra no Brasil, Chiquinha morreu empunhando o estandarte da batalha pelos direitos autorais dos músicos.

Politicamente, ela pôs na rua a comissão de frente para as gerações de mulheres que a sucederam no tempo e na história.

No rastro do legado de Chiquinha, em 24 de fevereiro de 1932, as mulheres conquistaram o direito, até então somente masculino, de exercer a participação política como eleitoras e candidatas. E, um ano depois, escolheu-se por meio do voto a primeira deputada federal brasileira: Carlota Pereira de Queirós.

Antes disso, as mulheres eram consideradas "menores de idade", como os índios – sem direitos mínimos e elementares, como trabalhar fora de casa.

O cenário mudou radicalmente, em 2010, quando Dilma Rousseff tornou-se a primeira mulher presidente do Brasil. Mas nosso universo político continua a dever para o gênero feminino. É recente, na verdade, a "maioridade" da mulher nos meandros da política nacional.

O grande marco é de 24 anos atrás, na Assembleia Constituinte, que determinou a ampliação dos direitos civis, sociais e econômicos da mulher.

Em 2012, as diferenças ainda gritam. As mulheres, as quais representam mais da metade do eleitorado brasileiro, possuem representações mínimas na Câmara dos Deputados, no Senado e nas assembleias legislativas.

Na Esplanada, devido à onipresença de Dilma, esse número é melhor, porém relativo: apenas 26% dos ministérios são administrados por mulheres em áreas importantes.

A seguir, seis convidadas especiais – três deputadas, uma senadora, uma prefeita e uma ministra – discorrem sobre a atual situação da mulher na política brasileira. Embora as opiniões toquem nas mais variadas feridas, todas elas concordam: é preciso, com sensibilidade, dividir o poder com os homens.


GLEISI HOFFMANN 
Ministra da Casa Civil

"A mulher só conquistou seu direito ao voto em 1932. Menos de 100 anos depois, temos na presidência da República uma mulher e o governo federal composto por um número significativo de mulheres. Considerando o espaço de tempo, podemos dizer que foi um avanço sem precedentes na história.

Do ponto de vista da representatividade da mulher, ainda estamos muito atrás. Somos mais da metade da população, mais da metade do eleitorado e temos sub-representação política. É por isso que buscamos, na reforma política, cota mínima de participação. Uma tentativa de acelerar a equidade de gênero.

Não podemos deixar de lembrar: é claro que, graças à participação da mulher na política brasileira, temas que dizem respeito às crianças, adolescentes, mulheres e idosos foram inseridos na pauta das ações do governo.

Aquela mulher que antigamente se encerrava na esfera doméstica hoje representa um diferencial na política brasileira. As questões que passam pelas mãos das mulheres acabam beneficiando toda a sociedade. Brigamos pelo direito a uma licença-maternidade e conquistamos, a duras penas, uma lei que nos protegesse da violência doméstica.

Até a mulher entrar na política, projetos de creches e de educação infantil não existiam. Hoje, o país oferece mais oportunidades para a mulher trabalhar fora de casa e poder compartilhar os cuidados com os filhos com as escolas e creches.

A mulher é uma figura do consenso, do diálogo. São valores femininos. Não digo que somos melhores nem piores do que os homens. Mas também não somos iguais. Não somos de entrar em disputas, só para brigar. Estabelecemos consensos, ouvimos, partilhamos.

Temos hoje à frente da nação um grande exemplo de uma mulher que faz a diferença. Uma pessoa forte, determinada e comprometida com o desenvolvimento do Brasil. Sabemos que manter o país na rota de crescimento traz inúmeros desafios. E a cada dia vemos as esferas de oportunidades se ampliarem com as ações conduzidas pela presidente Dilma.

Enfim, nós, mulheres, já conquistamos mais espaço e hoje temos voz na vida política. Nosso olhar feminino faz diferença. Diante das grandes conquistas e avanços proporcionados por nós, continuo defendendo a presença feminina no espaço público. Acredito que aumentando a participação da mulher na política brasileira os ganhos para o país serão maiores.


*Você lê essa reportagem na íntegra na edição 66 ou no site da Rolling Stone.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

lIÇÃO dE cASA pARA o fUTURO

Pela terceira vez, o Brasil lança um plano para exterminar o analfabetismo. As dificuldades, porém, vão muito além das salas de aula

POR CRISTIANO BASTOS
ILUSTRAÇÃO: LÉZIO JÚNIOR


Em 1962, ano em que o Brasil conquistava o bicampeonato mundial de futebol no Chile e os compositores Antônio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes eternizavam “Garota de Ipanema”, o panorama educacional brasileiro, no cenário pintado pelo antropólogo Darcy Ribeiro, era "calamitoso".

Então ministro do presidente João Goulart, Ribeiro traçava o Primeiro Plano Nacional de Educação, o qual listava uma série de medidas emergenciais para salvar a educação no país. Entre outras ambições, ele desejava alfabetizar, até 1970, todas as crianças e adolescentes entre 7 e 14 anos.

Na época, o Brasil amargava o pior índice de iletrados de toda a América Latina: um exército de 5,8 milhões de analfabetos – o que representava 39% de toda a população nacional. Mas um golpe de Estado, cujo comando militar tramava obscuros "planos", enterrou definitivamente o projeto dois anos depois.

Hoje, o Brasil é um dos motores econômicos do mundo, passou a ser a sexta economia global e, antes de 2015, deverá ultrapassar a França e garantir o quinto lugar (conforme as projeções do Fundo Monetário Internacional).

Com tanta pujança, é gritante, entretanto, a defasagem do sistema educacional, se comparado ao momento econômico vivido pelo país. De fato, ainda é impossível comparar a educação no Brasil com os níveis de formação profissional das nações mais desenvolvidas.

O setor já vingou inúmeras melhoras, mas os números continuam falando por si próprios.

É o que mostra a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2009, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), segundo a qual 3,7 milhões de crianças e jovens (de 4 a 17 anos) estão fora da escola.

As estatísticas não são muito alentadoras. Por exemplo, caiu em apenas 0,3 ponto percentual a taxa de analfabetismo entre pessoas com 15 anos ou mais. Em 2008, o índice foi de 10% e, em 2009, de 9,7% – no total, ainda há 14,1 milhões de brasileiros que não sabem ler nem escrever.

Para a superação dessas deficiências históricas, uma das propostas que poderá soprar ares renovados a esse panorama é o novo Plano Nacional de Educação (PNE), feito para vigorar no decênio 2011/2020.

Encaminhado pelo governo à Câmara dos Deputados por meio do projeto de lei 8035/2010, o projeto foi entregue, em Dezembro de 2010, ao então presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo ex-ministro da Educação, Fernando Haddad.

A comissão especial que analisa o PNE em plenário marcou para este Fevereiro a apresentação do texto final, que deverá ser votado em março. Após a aprovação, segue para o Senado e, caso avance, vai para a sanção presidencial.

"Fizemos um projeto", explica Haddad, "com metas para serem aplicadas e honrarem a sociedade. Mas, se chegarmos a 2020 com metade delas não cumpridas, ele [o PNE] perderá credibilidade. Queremos aprovar um plano amadurecido e factível e exigimos um esforço adicional", conclama o ex-ministro, agora candidato à prefeitura de São Paulo, que recém-entregou o cargo ao titular da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante.


Você continua lendo esta matéria na edição 65 da Rolling Stone Brasil, Fevereiro/2012.

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