POR LULA CÔRTES
Todos os sóis do universo imenso, parece que brilhavam sobre nós naquele instante: seis léguas de sol e caatinga já havíamos andado desde ITABAIANA, a cidade mais próxima. O caminho de barro vermelho, esburacado e seco, banhava de poeira os mandacarus e arbustos de espinheiro, espalhando em tudo os tons de fogo, aumentando alucinadamente a sede e o calor.
Novamente a estrada se dividia, e nós nos decidimos por intuição, ao caminho da direita. Depois soubemos a resposta afirmativa: chegamos a Ingá do INGÁ DO BACAMARTE, pequeno povoado aos pés de uma montanha de arestas desgastadas como uma pirâmide antiga.
Nós caçávamos o passado, e os corações se encheram de esperança com aquela visão. Conversamos com os nativos que limpavam umas quadras de roça. O caminho que havíamos abandonado mais atrás era o de PEDRAS DE FOGO, outro pequeno aglomerado quase sem nenhuma chance de vida.
A água e muito escassa. Conversávamos sobre as pedras. E ao longo, no horizonte agora curto, o lombo prateado da BORBOREMA desenha curvas leves, demonstrativas de sua imensa idade.
A CUPAOBA - como a chamavam os CARIRÍS guerreiros que habitavam aqueles vales há muitas eras. Os nativos tinham mapas no rosto, e o sol lhes rachou os lábios como racha a terra, as pedras duras e afiadas que dificultam a caminhada, lhes endureceu o riso.
Quase sempre calados com os olhos brancos e fundos, eles aos poucos se aproximavam de nós e começavam a nos falar de lendas e de pedras pintadas deixadas pelos índios. Falavam do rio que atravessava o vale, o qual não tinhamos visto ainda, e à medida que contávamos o motivo da nossa estada ali, eles achavam muito estranho.
Um dos homens mais velhos informou enfim o destino que deveríamos seguir: mais cinco léguas por outra picada na caatinga, e quando encontrássemos um eucalipto grande dobrar à esquerda na última porteira branca. Lá se acabava para o carro todo o acesso, e os lajedos iam ficando mais freqüentes. O resto faríamos a pé.
Continua...
*A foto foi tirada no dia em que conheci Lula Côrtes. Em Casa de Pedra (espécie de comuna cultural encravada em Recife) - ambiente no qual se deu a concepção artística de Paêbirú. Algumas locações importantes de Nas Paredes da Pedra Encantada têm a casa como ambiente