sexta-feira, 31 de agosto de 2007

pOR fAVOR, sUCESSO

O segundo colocado na votação de APLAUSO.
Com todas as facilidades disponíveis para se lançar um disco hoje em dia, pelo caminho da independência ou não, é incompreensível que o cultuado álbum Por Favor, Sucesso, uma gema perdida nas profundezas do rock brasileiro, permaneça sem reedição no formato digital. A história dessa peça rara está ligada à era dos festivais de música popular brasileira que, nos anos 60 e 70, tinha para os artistas o valor de um passaporte ao reconhecimento.
Depois do Liverpool – que inaugurou o rock no RS junto com as bandas Os Cleans e Os Brasas – vencer o II Festival Universitário da Música Popular Brasileira, em Porto Alegre, o tema "Por Favor Sucesso" (de autoria de Carlinhos Hartlieb) foi classificado para as eliminatórias do IV Festival Internacional da Canção, no Rio de Janeiro, em setembro de 1969. A banda não arrebatou prêmio algum, mas ganhou um contrato com a gravadora Equipe, para produzir o primeiro – e único – LP do Liverpool, o homônimo "Por Favor, Sucesso".
O disco, com sua combinação de harmonias ousadas, distorções fuzz no talo e acidez verde-amarela, mergulha na fonte do rock inglês e norte-americano, levando bossa-rock, folk e boogie-woogie em estrondosa colisão com a tropicália. Composições como "Olhai os Lírios do Campo", "Impressões Digitais" , "Voando" e "Cabelos Varridos" são retratos expressivos da juventude da época.
Segundo o crítico de música Juarez Fonseca, participar de um festival universitário, e vencê-lo, motivou ainda mais a banda do bairro IAPI que, no começo, só tocava Rolling Stones, mas que já começava a mostrar músicas próprias no programa que o disc-jockey Glênio Reis tinha na TV Gaúcha.

"Por Favor, Sucesso" não vendeu quase nada, contudo, tornou-se objeto de culto – até mesmo fora do Brasil – graças à receita de música brasileira moderna e jovem, feita por cinco cabeludos carismáticos e muito bons músicos: "O disco colocou o Liverpool em pé de igualdade com os Mutantes e, logo depois, com os Novos Baianos, como definidor de uma nova linguagem, para além da ingenuidade banal da Jovem Guarda".

rOCK, mEDO & dELÍRIO eM lAS vEGAS

A editora Conrad acaba de lançar, pela primeira vez no Brasil, o testamente gonzo Medo & Delírio em Las Vegas, livro de 1971 do escritor norte-americano Hunter S. Thompson. Originalmente, "Medo & Delírio" foi publicado pela revista Rolling Stone, que encomendou ao escritor a cobertura da Mint 400, uma corrida off-road de buggies no meio do deserto de nevada. Na bagagem, um arsenal de drogas - da mescalina a "uma galaxia inteira de pílulas multicoloridas", conta Thompson.

Hunter S. Thompson se suicidou com um tiro de espingarda na cabeça em 20 de fevereiro de 2005. Ele deixou um bilhete em que se mostrava deprimido e sofrendo de terríveis dores após uma cirurgia na região da bacia. Seu corpo foi cremado e as cinzas foram lançadas ao céu por um pequeno foguete, em uma cerimônia bancada pelo ator Johnny Depp, seu amigo e que interpretou o personagem Raoul Duke na versão para o cinema de Fear and Loathing in Las Vegas.

O texto abaixo é sobre isso:

Um protótipo de Deus:
muito esquisito para estar vivo,
muito raro para estar morto

A epígrafe foi extraída de uma fala do filme Fear and Lothing Las Vegas (1998) – no Brasil, Medo & Delírio em Las Vegas. É assim que Raoul Duke se refere a Dr. Gonzo, seu companheiro de loucuras intermináveis. A frase traduz o que significou a personalidade e a obra do jornalista e escritor Hunter S. Thompson para a cultura pop, para a literatura e, sobretudo, para a renovação da linguagem do jornalismo. No dia 20 de fevereiro de 2005, aos 67 anos, Thompson suicidou-se com um tiro na cabeça, na sua casa no Colorado, EUA.

O longa-metragem Medo & Delírio é uma adaptação do livro homônimo de Thompson, Fear and Loathing in Las Vegas: A Savage Journey into the Heart of the American Dream, publicado na década de 60. Ao agregar ao gênero jornalístico aspectos ficcionais e passagens dementes de sua própria biografia, Thompson cunhou um gênero - o jornalismo "Gonzo". Nele, faz de si mesmo um protagonista essencial da narrativa: "A ficção é baseada na realidade, a menos que você seja um artista de contos de fada", afirmou Thompson em 2003.
Não há dúvida de que o jornalista foi um sujeito raro – especialmente, esquisito. Sua maneira transtornada e confessadamente drogada de levar a vida, chega, às vezes, a preceder o seu próprio legado literário. No início da década de 60, antes de se tornar conhecido, o jornalista viveu no Brasil uns poucos anos como correspondente do Brazil Herald, um jornal de língua inglesa, editado no país. No Rio de Janeiro, aprontou algumas das suas. Foi preso, certa vez, por praticar tiro ao alvo em local público. Passou a conversa no delegado de plantão, mas se entregou quando deixou cair do bolso um monte de balas de revólver. Apesar da curta estadia, as reportagens que fez por aqui já primavam pelo gênero gonzo.

Na ida para o Brasil, de passagem por países da América do Sul, enviou uma carta para o editor do Brazil Herald, com o seguinte relato gonzo: “Estou no limite da insanidade. Enfraquecido pela disenteria, atacado por moscas e vermes, sem correio, dinheiro ou sexo. Perseguido 24 horas por dia por ladrões, mendigos, cafetões, fascistas, agiotas, loucos e bestas humanas de toda espécie”, relata o jornalista na carta. Quando retornou aos EUA, escreveu sobre gangues de motoqueiros e viagens químicas em Las Vegas – as aventuras que estão descritas em Medo & Delírio, sempre em primeira pessoa.

No irriquieto filme de Terry Gillian (de Brazil, o Filme e Os 12 Macacos), diretor egresso da trupe do Monty Phyton, quem vive o papel de Hunter S. Thompson – que usa o pseudônimo de Raoul Duke – é o excelente Johnny Depp. Dr. Gonzo, o transtornado amigo que o acompanha em suas "viagens", é encarnado pelo também ótimo Benício Del Toro. Tobey Maguire é apenas um pobre infeliz que pega carona com a dupla de perturbados e fica a mercê deles. Com absoluta certeza, o papel mais absurdo de toda a carreira do ator de O Homem-Aranha. O elenco conta ainda com as participações especiais das atrizes Cameron Diaz e Christina Ricci.
Não é tarefa fácil relatar a descrição que Gillian conseguiu obter, em imagens, da insanidade, da psicodelia, da drogadição e, sobretudo, da comédia que materializou em Medo & Delírio. Só assistindo para crer. A diversão é garantida. A história se passa na virada dos anos 60 para os 70. O contexto é a interminável guerra do Vietnã, os ideais da época, dilacerados, Nixon no poder... Marca o fim do sonho e o início do pesadelo americano. Nesse ambiente de confusão e desesperança, Raoul Duke e Dr. Gonzo saem para fazer a cobertura jornalística de uma corrida de automóveis. Com o porta-malas do conversível vermelho abarrotado de substâncias de todas as espécies, de mescalina, heroína e barbitúricos de toda a sorte, a substâncias mais vagabundas como álcool e éter, eles as engolem freneticamente enquanto tomam o rumo de Las Vegas. Têm início inúmeras situações insólitas de paranóia e alucinações. E muito riso.
Rock & Delírio - A trilha sonora contempla algumas músicas que fizeram a cabeça de Thompson, um notório apologista do consumo de substâncias alucinógenas de todos os tipos. Como a emblemática "White Rabbit", que surge em um dos momentos mais caóticos e irreverentes do filme. A canção, do grupo Jefferson Airplaine, grande ícone do rock ácido dos 60's, é uma das principais composições do rock a versar sobre o tema psicodelia em todos os tempos. Sua letra, de cujos personagens são Alice e o Coelho Branco do País das Maravilhas, embalados sob o efeito de cogumelos alucinógenos, pode ser interpretada como a canção de ninar mais onírica já composta, pela força das imagens que sugere.
A música aparece num instante de total alucinação de Benício Del Toro, empapuçado por um coquetel de drogas das mais bizarras. Deitado na banheira do quarto do hotel, pateticamente ele implora ao parceiro para que arremesse o tape-deck quando a música atingir o ápice. Apesar de "Somebody to Love, outro libelo do Jeferson Airplaine, aparecer no filme – durante uma reconstituição de um show da banda, quando Duke se dá conta de que os tempos estavam finalmente mudando –, ela ficou de fora da trilha.

A viagem psicodélica prossegue com as suítes "Drug Score (Pt. 1 - Acid Spill)", "Drug Score (Pt. 2 - Aorenochrome, the Devil's Dance)" e "Drug Score (Pt. 3 - Flash Backs)", de Ray Cooper, que acompanham os personagem nas horas em que estão seriamente enlouquecidos. "Combination of the Two", do Big Brother & the Holding Company, é uma pérola psicodélica pouco conhecida da banda que acompanhava Janis Joplin e, "Magic Moments", do crooner Perry Cuomo, a típica balada para bebuns que levam a vida a torrar grana nos cassinos de Las Vegas.
Uma curiosidade é um grande sucesso de 1970, "Mama Told Me (Not to Come)", do Three Dog Night, um grupo proto-heavy metal que tinha como maior preocupação o entretenimento do que passar "mensagens cabeça". A letra, composta pelo caipira Randy Newman, vem já na primeira estrofe com a transgressora proposta, muito pertinente ao caráter químico-etílico do filme: "Quer um pouco de uísque na sua água?". Outra redescoberta foi ter incluído "One Toke over the Time Is Tight", do Booker T. & the MG's, entre as músicas escolhidas. O Booker T., banda que tinha na sua formação brancos e negros e que tocava soul music típica da região de Memphis apenas com órgão, sax e guitarra, foi o símbolo da gravadora Stax, concorrente da Motown na década de sessenta.

A trilha ainda revela outras relíquias: a canção "Line", da dupla de folk rock Brewer & Shipley; "She's a Lady", hit da grande e grave voz de Tom Jones; o beat "For Your Love", dos ingleses do The Yardbirds, banda que revelou nomes como Jimmy Page, Jeff Beck e Eric Clapton. Também há espaço para velhos estandartes, como "Tammy", na voz de Debbie Reynolds, atriz principal do clássico Cantando na Chuva, e emoção, com a pungente "Get Together", dos The Youngbloods. Há também lirismo country em "Expecting to Fly", do Buffalo Springfield, do qual surgiram os músicos que integraram formações de grupos como Crosby Stills Nash & Young, Poco e Neil Young & Crazy Horse.
Sobem os créditos e, apropriadamente, o filme encerra com uma versão punk dos Dead Kennedys para a festiva "Viva Las Vegas", que Elvis Presley imortalizou em um dos seus filmes. Foi em Las Vegas que o Rei do Rock terminou sua longa carreira marcada, assim como a vida de Hunter S. Thompson, pela aventura e pelos excessos mundanos.

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

gRÁTIS

O Supergrass liberou música nova no site da banda. É uma versão ao vivo de "Diamond Hoo Ha Man - Live at Guilford", uma das últimas gravações depois do álbum Road the Rouen, de 2005. As outras canções são "Bad Blood" e "Rough Knuckles". Para fazer o download, antes é preciso preencher um rápido cadastro. O sexto álbum do Supergrass está sendo produzido por Nick Launay, que já trabalhou com Nick Cave & Bad Seeds.

iPOD'S 20

As mais pedidas no meu Ipod essa semana:

"I Had Too Much Dream Last Night" - Eletric Prunes
"Sugar Baby Love" - Rubbets
"Stupid Girl" - Neil Young
"Frank Hide" - Celibate Rifles
"O Cheiro do Óleo" - Superguidis
"Young Girl Sunday Blues" - Jefferson Airplaine
"Sugar Magnolia" - Greatfull Dead
"Stab your Back" - Damned
"The Good Humor Man He Sees Everything Like This" - Love
"Rock'n'Roll Queen" - Mott the Hoople
"Festa Punk" - Replicantes
"Great Big Kiss" - Johnny Thunders
"Golden Hair" - Syd Barret
"Old John Robertson" - The Byrds
"Menina Super Brasil" - Júpiter Maçã
"Walk Like a Man" - Grand Funk Railroad
"Rebel Rebel" - David Bowie
"Theme from Shaft" - Isaac Hayes
"Can't Blame the Youth" - Bob Marley & The Waillers
"Block Buster" - Sweet

wHO'S tHE bEST?

Pra quem não é de Porto Alegre e não pôde comprar nas bancas o número 83 da revista de cultura e artes APLAUSO, em circulação apenas no Rio Grande do Sul, vou deixar aqui a íntegra da matéria Os Melhores do Rock Gaúcho. A reportagem de capa, que foi publicada em abril, surgiu da idéia de se fazer uma votação com 50 músicos e especialistas, do RS e de outros lugares, para escolher os 10 melhores discos do "rock gaúcho". A votação também escoheu o pior...
Como toda lista, absolutamente nada tem um caráter definitivo. A apuração, mais do que apenas apontar os melhores, trabalhou com o objetivo de "tirar uma febre" para saber quais são os grandes álbuns já gravados no Estado. Concordem ou não com os resultados, a lista dos 10 álbuns escolhidos, no mínimo, é bem representativa.
A reportagem é grande, então, no post abaixo vou deixar o abre da matéria e, logo abaixo, o texto sobre o grande vencedor, A Sétima Efervescência, de Júpiter Maçã. Os textos sobre os demais colocados serão colocados um por um a seguir e, no final, a escolha dos piores discos já lançados. Abaixo a lista dos ganhadores:
1. A Sétima Efervescência (1996) - Júpiter Maçã
2. Por Favor, Sucesso (1969) - Liverpool
3. De Falla (1987) - De Falla
4. O Futuro É Vórtex (1986) - Replicantes
5. TNT (1987) - TNT
6. Bixo da Seda (1976) - Bixo da Seda
7. DeFalla (1988) - DeFalla
8. Coisa de Louco II (1995) - Graforréia Xilarmônica
9. Fita demo da Vórtex (1987) – Cascavelletes
10. Olelê (2000) – Ultramen

oS 10 mELHORES dISCOS do rOCK gAÚCHO

A pedido de APLAUSO, 50 músicos e especialistas elegem os álbuns mais importantes e influentes já realizados no Rio Grande do Sul, em um ranking repleto de surpresas. Confira quem ganhou e quem ficou de fora

FÁBIO PRIKLADNICKI
CRISTIANO BASTOS

Foram 50 personalidades consultadas, entre músicos, críticos, jornalistas e produtores. No total, mais de 80 títulos citados. Tudo para descobrir quais são os melhores discos da história do rock gaúcho. Cada votante convidado por APLAUSO indicou os cinco melhores álbuns, em ordem de preferência. O melhor de cada um recebeu cinco pontos. O segundo melhor, quatro. E assim por diante, até o quinto melhor, que recebeu um ponto. A seguir, estão destacados os dez discos com a melhor pontuação.
O resultado trouxe diversas surpresas, a começar pelo vencedor. A Sétima Efervescência, de Júpiter Maçã, lançado em 1996 pelo selo Antídoto/ACIT, não só amealhou mais pontos como foi o disco mais citado – 26 vezes. Além disso, com 73 pontos, garantiu distância folgada do segundo colocado, Por Favor, Sucesso (1969), da lendária Liverpool, que somou 51 pontos. Primeira grande banda de rock do RS, o Liverpool teve declarada influência (o nome já sugere) dos Beatles.
Na década de 70, os mesmos integrantes formariam outro grupo que, com um som influenciado pelo rock progressivo, também fez história – e aparece no ranking: Bixo da Seda. Porém, a expressão “rock gaúcho” – polêmica, por sinal – começou a fazer sentido mesmo só nos anos 80, época do boom do rock nacional. As coletâneas Rock Garagem (1984) e Rock Grande do Sul (1986) apresentaram a primeira geração propriamente dita de bandas locais. Os Engenheiros do Hawaii (e o Nenhum de Nós, de forma passageira) conseguiram sucesso no país, enquanto as demais tiveram apenas incursões além do Mampituba, e até hoje a pergunta permanece: o que há de gaúcho no rock gaúcho? A resposta está em alguns registros dessa geração que figuram no ranking, como Replicantes, TNT, Cascavelletes e DeFalla.
Foi essa mesma turma que montou a cultuada Graforréia Xilarmônica, que estreou em disco nos anos 90, com o hino "Amigo Punk" – e que também aparece entre os dez mais. Na segunda metade dessa década, surgiu uma nova leva de bandas, como Bidê ou Balde e Cachorro Grande. Mas é a Ultramen, com uma sonoridade que foge do que se esperaria de uma banda “gaúcha”, a única delas a figurar no ranking, com um disco lançado no sintomático ano 2000. Apesar de também recente, o título vencedor é assinado por um músico de longa ficha corrida no rock gaúcho.
Júpiter Maçã é como prefere ser chamado Flavio Basso, ex-TNT e Cascavelletes. A Sétima Efervescência foi seu primeiro trabalho solo (em 2007, ele deve lançar o quarto, Uma Tarde na Fruteira, que já tem faixas circulando nas rádios e na internet). A importância do álbum está na sonoridade e no visual sessentistas, que praticamente deram o tom do rock gaúcho desde então, influenciando até o modo de os músicos se vestirem. Confira, nas próximas páginas, detalhes e curiosidades sobre os discos, além de descobrir quais são os piores álbuns na opinião do júri e como foi avotação do júri popular, em enquete realizada em parceria com a rádio Ipanema FM.

a sÉTIMA eFERVESCÊNCIA (1996) – jÚPITER mAÇÃ

No regresso de uma jornada relâmpago pelo folk dylanesco, no começo dadécada de 90, como Woody Apple, o compositor Flavio Basso (ex-Cascavelletes e TNT) inaugurou sua fase elétrico-psicodélica ao empunhar novamente a guitarra e assumir a alcunha de Júpiter Maçã. Montou a banda Júpiter Maçã & os Pereiras Azuiz e gravou a fita demo Ao Vivo na Brasil 2000 FM, de 1995, que já antecipava parte das músicas que entrariam no repertório de A Sétima Efervescência, lançado pelo selo Antídoto/ACIT.
No estúdio, a lisergia das canções originais foi valorizada com sofisticadas orquestrações arranjadas pelo músico Marcelo Birck e partipações especiais de Frank Jorge (Graforréia Xilarmônica e ex-Cascavelletes) e do produtorThomas Dreher. O clima de ousadia experimental está presente em todas as faixas do disco: em "Pictures and Paintings", "Querida Superhist x Mr Frog" e "The Feaking Alice (Hippie Undergroove)", a consciência perturbadora deSyd Barrett influencia diretamente o artista. No encarte do disco, cuja produção é de Egisto dal Santo, Júpiter faz uma deferência aos gnomos de estúdio “que mexiam nos controles, sem autorização, para melhores resultados”.
Na visão do jornalista Fernando Rosa, A Sétima Efervescência, além de ser um grande disco, sintetiza todo o chamado “rock gaúcho”: “Ali está a paixão gaudéria pela década de 60, a psicodelia intravenal de Syd Barrett e a JovemGuarda – em menor escala, mas também presente”. Um dos grandes predicados do álbum, comenta, é que amalgama ingredientes dos demais discos indicados pelojúri na votação – da psicodelia tropicalista do Liverpool ao punk minimalista dos Replicantes, em direção ao pós-tudo da Graforréia Xilarmônica.
Em Porto Alegre, o impacto de A Sétima Efervescência extrapolou as esferas musicais e passou a ditar mudanças de caráter visual: desde então, as ruas da capital (e do bairro Bom Fim, em especial) foram tomadas de assalto por esquadrões de jovens metidos em terninhos de brechó e penteados beatle. Muitos formaram bandas que emulam as simbologias mod resgatadas do túnel dotempo por Júpiter Maçã. Mas a influência também foi sonora: o hino "Lugar do Caralho" foi gravado por Wander Wildner e "Miss Lexotan 6mg Garota" ganhou uma versão da banda Ira!
O ex-Replicantes Carlos Gerbase considera A Sétima Efervescência um álbum clássico porque está ligado a uma tradição estética que Júpiter Maçã foi capaz de superar, ou até negar, para que pudesse existir plenamente: “As idéias musicais do Flavio – ou do Júpiter, como queiram – são radicalmente novas”. Além disso, ele completa, foi gravado com excelente qualidade técnica e, muito mais importante, registrou o momento de exceção de umartista, “o que significa que ele terá vida muito longa”.

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

A revista Brazuca, distribuída entre a colônia brasileira na França e na Bélgica, destacou nossa música na capa da última edição, Musique Brésilienne. A matéria principal, assinada por este jornalista - nas versões french e português -, traz uma entrevista exclusiva com Sérgio Dias, dos Mutantes. Ele falou sobre os planos da banda e dos shows da nova tour pela Europa e Estados Unidos.

Na mesma reportagem, a revista apresenta as bandas Superguidis e Los Porongas, consideradas “revelação do rock brasileiro”. O texto também destaca Eddie, Cansei de Ser Sexy, BNegão e Os Seletores de Freqüência, Racionais MCs e Bonde do Rolê.

Além de apresentar os artistas, a revista debate a situação do mercado francês, belga e europeu para a música brasileira - "saturado", no atual momento. Segundo os produtores, somente os grandes nomes mantém seu espaço, por causa da falta de apoio do governo brasileiro para incentivar os novos artistas nacionais.

Brazuca é uma revista mensal brasileira, nos formatos impresso e digital, distribuída gratuitamente em Paris, Ile-de-France e Bruxelas. O Brasil de A a Z: "arte, cultura, cinema, música, agenda, entrevistas e reportagens”, informam os editores em seu site on line, que disponibiliza a publicação em PDF para download.

terça-feira, 28 de agosto de 2007

o sUÍCIDIO aNUNCIADO dE zIGGY sTARDUST & aS aRANHAS dE mARTE

Em 1973, no palco do teatro Hammersmith Odeon (Londres), David Bowie deu por encerrada a sua mais expressiva fase, das inúmeras que a sua extensa carreira produziu. Em uma noite de atmosfera obscura, guitarras ameaçadoras, teatralidade e frenesi do público adolescente, Bowie cometeu o assassinato do seu alter-ego, o rockstar alienígena Ziggy Stardust.

O concerto-show Ziggy Stardust & the Spiders from Mars – The Motion Pictures, que na época foi exibido nos cinemas, mostra a última aparição do alien criado por Bowie no star-system terrestre. Algumas décadas depois, em 2003, numa jogada de marketing comemorativa de trinta anos de lançamento do filme, a gravadora Emi resolveu evocar o personagem do mundo dos mortos. O esquálido Ziggy ressuscitou restaurado nas versões CD/LP (em edição limitada) & DVD. Mick Ronson, na guitarra, piano e vocais, Woody Woodmansey na bateria e Trevor Bolder, no baixo – a banda Spiders from Mars – também voltou rediviva.

Na era jurássica pré-MTV, especialmente na década de 70, quando o mercado fonográfico ainda não se fundamentava na megalomaníaca produção de videoclipes de hoje, as grandes bandas se serviam da linguagem cinematográfica para promover a sua imagem – com um pendor mais artístico do que promocional, contudo. Dessa época e estética, duas produções também são emblemáticas: The Songs Remains the Same (1976), do Led Zeppellin, que no Brasil foi lançado com o título de Rock é Rock Mesmo, e Born to Boogie (1972), de Marc Bolan & T-Rex, dirigido pelo beatle Ringo Starr.


Para ver onde isso vai parar, clique aqui, beibe...

vACA aMARELA

Neste fim de semana, nos dias 31 de agosto e primeiro de setembro, tem a sexta edicão do Festival Vaca Amarela, em Goiânia Rock City. São 32 bandas, de Goiás e de outros estados brasileiros. O festival marca a filiação do Vaca Amarela a Associação Brasileira dos Festivais Independentes (Abrafin).
Estarei lá praquela cobertura gonzo (ao menos em espírito) com o meu fotógrafo indígena Gus Van Peixoto e, claro, pra assistir, rever, beijar & abraçar meus queridos amigos da Bidê ou Balde. E para prestigiar a banda Vanguart, do Mato Grosso, e o seu folk rock pantaneiro e - afinal de contas - ver qualé do Kid Vinil & Magazine. Em Brasília, Kid se apresenta no sábado, no Arena, na festa da revista Tupanzine.
O Vaca Amarela também faz parte do Circuito Fora do Eixo - "uma rede de trabalho que reúne 15 estados com o objetivo de promover intercâmbio e distribuição da música produzida à revelia das grandes corporações do mercado fonográfico".

a vOLTA dOS gAULESES

Confirmadíssimo. O livro Gauleses Irredutíveis - Causos e Atitudes do Rock Gaúcho, de Alisson Avila, Cristiano Bastos e Eduardo Müller, será relançado, com acréscimos, durante a 53° Feira do Livro de Porto Alegre, em outubro, pela editora Doravante (ex-Sagra Luzzatto). A nova edição terá prefácio escrito pelo músico e cineasta Carlos Gerbase e contará com uma lista dos 100 discos essenciais do rock do RS formulada por Fernando Rosa, jornalista e editor do site SenhorF.

Em 2001, Gauleses Irredutíveis foi a obra de autores estreantes mais vendida da 47° Feira do Livro de Porto Alegre - e, assim que lançada, esgotou rapidamente sua primeira edição. Virou peça de colecionador disputada em sebos e na internet. O livro também ficou conhecido fora do Brasil, em países como Itália, Inglaterra e Estados Unidos. Os autores do coletivo italiano Wu-Ming, do best-seller Q-O Caçador de Hereges, leram o livro e deixaram seus comentários em uma série de matérias no site da Wu-Ming Foudation. Gauleses, inclusive, foi referência para um livro nos mesmos moldes, lançado pelo coletivo, sobre o rock italiano.
Aguardem lançamentos, com shows e autógrafos, em São Paulo, Brasília e Porto Alegre.
Gauleses Irredutíveis – Causos e Atitudes do Rock Gaúcho (Editora Sagra Luzzatto, 2001, 253 págs.) – obra inédita no segmento – é um trabalho de apuração jornalística realizada com 167 músicos, jornalistas e produtores culturais da cena roqueira do Rio Grande do Sul. Enfoca 40 anos de história da música no RS. Traz mais de 1000 declarações exclusivas e 84 registros fotográficos reveladores.
Pra quem não conhece o livro - cuja métrica são depoimentos dentro de temáticas, como mercado fonográfico, aventuras na estrada, sexo & drogas e etc - vou colar aqui declarações de alguns personagens dos anos 80 e 90 que, na realidade, continuam aí até hoje, gravando os seus discos e tocando. Um pequeno recorte sobre a rivalidade entre Cascavelletes e Graforréia Xilarmônica, muito comum entre as bandas da época. Essa é sobre sabotagem e bebedeira:
Alexandre Barea: "A idéia de sabotarmos o show da Graforréia foi a seguinte: eu e o Flavio Basso encarávamos o Cascavelletes como se fosse uma banda fechada, um negócio bem delinqüente, um grupo que aprontava todas o dia inteiro..."

Flavio Basso: "Eu era realmente doentio com essa coisa de beatlemania..."
Nei Van Soria: "Nós achávamos que ninguém da banda podia tocar com outras pessoas ou em outras bandas. Eu e o Flavio cumpríamos isso à risca, o Barea também. O Frank não."
Alexandre Barea: "Uma hora antes do começo do show no bar Ocidente, eu e o Flavio compramos uma garrafa de Velho Barreiro e fizemos uma caipirinha gigante..."
Frank Jorge: "Aconteceu que eles chegaram bêbados, gritando umas coisas. Só que estavam tão bêbados que não conseguiram tornar plena a sabotagem."
Alexandre Ograndi: "Tinha muita gente: do lado de fora, pendurada nas árvores. A gente não sabia que os dois tinham ido no show para nos sabotar."
Flavio Basso: "Moral da historia: depois que chegamos, o Barea, no segundo ou terceiro número, se retirou porque estava passando muito mal. Antes tivesse acontecido comigo! Caí sobre as coisas, as pessoas também caindo. Uma coisa inclusive um tanto arriscada para a saúde. Mas tudo acabou bem..."


quinta-feira, 23 de agosto de 2007

cARLINHOS & oS íNDIOS

Entrevista exclusiva do Carlinhos Carneiro, da Bidê ou Balde, pro site da Bizz. Auxiliado por uma médium que o guiou para incorporar três entidades indígenas, das etnias Xavante, Kraho e Guarani, Carlinhos & Os Índios (isso já é nome de banda...) falaram sobre as atividades paralelas da Bidê - quando não está com o microfone na mão o vocalista mantém uma rotina campeira - e contaram como Rivers Cuomo liberou a versão de "Buddy Holly" do primeiro disco. Por fim, a indiada enfileirou todos os seus ídolos do rock gaúcho. Mantenham a calma e fiquem atentos, que "eles" exigem respeito!

- Carlinhos, você está sozinho na sala ou tem mais alguém com você aí?

Sim, eu estou acompanhado. Sinto a presença dos três índios, meus camaradas, que vieram tentar rever o mundo através de mim e fizeram da minha fala uma ponte pra algumas das suas intenções e delírios. Pois os mortos deliram...
- Como você se sente nunca estando solitário?
Como um canguru.
- Vocês se sentem prontos pra falar sobre a Bidê ou Balde?
Sim, acho que sim. Os índios gostam da Bidê...

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

eU sOU mICKEY rOURKE!

Nada como contar, logo na estréia, com as adoráveis palavras de um escritor cuja reputação precede o próprio nome: Marcelo Benvenutti (na foto abaixo, em processo de criação literária) - ex-ladrão de bancos, ex-seqüestrador, ex-mentiroso profissional e ex-esteta de carteirinha. O gênio de Benvenutti é perfeito para inaugurar esse espaço de mentiras mal contadas e verdades inverossímeis. Digo "ex" porque agora nosso anti-escritor predileto converteu-se em um amoroso pai de família, do tipo que troca fraldas e prepara o mamá do seu bebê Lorenzo. Mas não deixou de cuidar da sua própria mamadeirinha premium - toda noite, algumas vezes pela tarde e outras pela manhã, nosso bebezão liquida com duas ampolas uruguaias de Nortenã litrão. Depois fica ouvindo aquelas músicas que somente ele ainda deve ouvir, em tempos de hypes enjoados, coisas como Isley Brothers, Fast Domino e mestres como Burt Bacharach e Duke Ellington.
Em 1999, Benvenutti vociferou uma das melhores frases do planeta terra (e não eu, como conta na "elegia" que faz a mim logo a seguir) - confissão heterônima da sua melhor lavra: "Eu sou Mickey Rourke!!!". Nosso Harry Angel soltou a famosa frase no mesmo antro pecaminoso que ele também cita, em que eu disse a minha... Sou uma testumunha. Eu estava lá e vi com os próprios olhos. De costume, Benvenutti havia sorvido um mar báltico de cerveja e, no seu desbunde etílico, ajoelhou-se para gritar a antológica frase, que chocou um bando de alternativos anêmicos que se esgeiravam pelas paredes em irrecuperável depressão shoegazer. O Carlinhos - sempre ele - conta essa história na música "A-Há!", do disco Outubro Ou Nada (por sinal, tem uma menção ao álbum por aí).
Benvenutti continua sendo um contador (de dinheiro e finanças e de histórias) e esse ainda é o seu principal ganha pão, até que belo dia ele se torne best-seller. O pão que Benvenutti ganha é líquido, então, ele bebe; se fosse sólido, aí sim, comê-lo-ia...A biografia de Marcelo Benvenutti afirma que ele nasceu de parto parido. No colégio passou desapercebido. Pobres professores que o tiveram em sua sala de aula. Quando chegou a adolescência, Marcelo se negou a crescer. Está se negando até hoje: "Ser adulto é uma coisa deveras chata, diria o grande intelectual cagador de regras", filosofa esse suburbano assumido da zona norte de Porto Alegre.
Dizem que Benvenutti é o maior mentiroso de todos os tempos e de todos os lugares. Dizem isso porque não o conhecem. Se o conhecessem, não diriam. Teriam certeza. Mas, se tratando de um mentiroso, tudo é incerto. Até mesmo esse parágrafo. Escreveu muitos livros e não pára de escrever. Teve um publicado em 2002, Vidas Cegas, que agora jaz sem editora, solto por aí, sem pai, nem mãe. Nosso Mickey Rourke particular deixa o recado: "Se por acaso você for um editor que queira me pagar bem para escrever, aceito de braços abertos suas belas propostas financeiras. Quem vive cheio de ar é pneu", compara.

Cristiano Bastos, mais conhecido como T.Rex por sua adoração pseudo-fake por Marc Bolan, chutador de bunda de alternativos e defensor dos textos de auto-ajuda na terceira pessoa do plural (no estilo "eles que se fodam") poderia ser um Jack London se fosse mais bêbado e menos capitalista. Obviamente, é, pra mim, o criador de uma das melhores frases ditas durante uma noitada em todos os tempos. Lá pelo fim do século passado, no antro porto-alegrense chamado Garagem Hermética lotado de cadelinhas underground e fêmeas obtusas que se multiplicam nos ambientes roqueiros da classe média chinelona, T. Rex saiu-se com a seguinte frase, que resume grande parte da cultura jovem ocidental do Século XXI: "SINTO PEITOS EM MEUS COTOVELOS!"

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

eM óRBITA pELO mUNDO

Saiu na última edição da revista Aplauso. Em breve, a íntegra da matéria no blog:


Vencedor do ranking do rock gaúcho promovido por APLAUSO, Júpiter Maçã lança dois novos discos (um deles na Europa) e prepara o relançamento de seu maior clássico, A Sétima Efervescência



CRISTIANO BASTOS

Ao se fazer um retrospecto da produção musical de Flavio Basso (codinome Júpiter Maçã e, ora convenham suas translações de personalidade, também conhecido pelo arquétipo anglo-saxônico Jupiter Apple), em mais de 20 anos de carreira, chega-se a uma conclusão meio óbvia: nada, em sua numerosa obra, foi em vão. Mas poderia ter sido, afinal. Na fase pós-TNT e Cascavelletes, suas bandas de maior apelo comercial, o artista resolveu buscar uma combinação excêntrica de experimentos sonoros, múltiplas personali­dades artísticas e a opção pelo duplo viés idiomático das músicas. Um câmbio, muitas vezes, sem aviso prévio entre o inglês e o português. Aliados a isso, a invariabilidade do mercado fonográfico e, para complicar, o fato de ser de Porto Alegre, portanto, sujeito às conhecidas limitações de uma cidade não-central. Ou seja, além de excêntrico, o flerte do músico foi audacioso. Tinha chances de não dar certo. Mas deu. E agora ele está de olho no mundo.
Após tantas andanças, a música de Júpiter Maçã vem cativando um público crescente fora do Brasil...

Leia a íntegra deste texto na edição impressa da APLAUSO 86

dELÍRIO cOLETIVO

Nem é preciso comentar: a exortação "descabe-se de tanto dançar em clima de saudável hedonismo" foi mesmo obedecida na "Festa, Rock Medo & Delírio na Montanha". A festinha virou hit. Simplesmente não vale a pena tentar explicar uma noite de muito rock, diversão e muitos outros "aõs" que nem é preciso dizer... Casa lotada de belos espécimes humanos. Ficamos metabolizando as bem-aventuranças da festa durante toda a semana seguinte (algo comparável, para mim, somente a lendária festa no Teatro Nilton Filho, com o show da JKABAK, nos anos 90). O clamor para uma nova edição da festinha é grande e já tem até uma data programada: 6 de Outubro. Quem foi curtiu. Se ficou curioso, apareça na próxima. Nós te avisaremos.

Um Top 20 que "bombei" na festa, em ordem aleatória:

"Heart of Glass" - Blondie
"Da-Da-Da" - Trio
"Wake Up Little Suzie" - Suzie 4
"Candy" - Iggy Pop & Kate Pierson
"I Beg Your Pardon" - Kon Kan
"I Love Rock'n'Roll" - Joan Jet
"Mama Mia" - Abba
"Revolution" - Beatles
"Surfin Bird" - Trashman
"Fale Mal de Mim" - Autoramas
"Roan" - B'52
"Be My Babe" - The Ronnetes
"Wath Wonderful World" - Joey Ramone
"Beatiful Stranger" - Madonna
"I'm a Beliver" - The Monkees
"Time Of The Season" - Zombies

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

fIM dE jOGO

Infelizmente, a revista Bizz - mais uma vez - sumiu de cena, ou melhor, das bancas. Que é a terceira ou quarta vez que a revista fecha suas portas, em mais de 20 anos entre idas e vindas, não é nenhuma novidade. Nos anos 80 e 90, período árido de informações da era pré-internet, a Bizz saciou com informações milhares de leitores amantes de música pop com a expertise de lendários colaboradores: Ana Maria Bahiana, José Augusto Lemos, Celso Pucci, André Forastieri e Thomas Pappon - só pra ficar em alguns. Era preciso esperar um mês inteiro pra buscar a nova edição da revista nas bancas - tempo que, pros mais fissurados, parecia não ter fim. Uma alternativa era comprar tablóides como Melody Maker e New Musical Express, no aeroporto, pra saber o que estava rolando no mainstream estrangeiro. Algo fora da realidade artística local.

Na real, é uma lástima que a Bizz tenha "soçobrado" (e não foi por falta de esforços da equipe comandada pelo editor Ricardo Alexandre) na sua breve reexistência - isso só prova a vulnerabilidade do mercado editorial brasileiro. Pior ainda, atesta uma vulnerabilidade maior ainda da imprensa brasileira especializada em música, que ficou com uma importante lacuna a ser ocupada - e não se sabe por quem, até agora. O trono está vago e não será ocupado pela Rolling Stone, por motivos óbvios: a linha editorial da RS não está circunscrita apenas aos domínios musicais. Basta ver as capas da revista - a última é Os Simpsons. Sites de "jornalismo" musical têm aos montes na web, contudo, são pouquíssimos os que cumprem o papel de serem legais, informativos e bem feitos ao mesmo tempo. A excessão heróica é o site SenhorF, que sozinho praticamente move a cena independente brasileira na mídia. Recém sepultada, a Bizz já causa saudades.

Bancarrota à parte (culpa da web, dos leitores, que não desembolsam uns trocados por uma revista, desinteresse, falta de anunciantes? Não importa), a Bizz foi o veículo de música que melhor soube forjar - do nada - uma identidade editorial própria. E isso, convenhamos, é um tanto complicado num país onde não se dá muita bola pra suas melhores instituições. Lembro quando, ainda adolescente, em 1987, comprei meu primeiro número da Bizz (que ainda tenho guardado) na rodoviária de Porto Alegre. Uma edição gordacha com o Duran Duran na capa.

O destino era Floripa, ônibus da meia-noite. Devorei aquele exemplar madrugada adentro com o mesmo labor que Jack London descreveu a respeito dos milhares de livros que leu insaciavelmente como única saída viável para ascender de proletário mal-pago a escritor engajado em causas universais. A analogia é meio exagerada, mas é mais ou menos por aí. Eu estava à cata de informações sobre o fabuloso mundo da música pop. Depois disso descobri e me interessei pelo jornalismo.

Na Bizz tomei contato com as bandas que amo incondicionalmente, em reportagens que, fora a informação, despertavam ainda mais a curiosidade. Provável que o primeiro facho de luz da minha adoração mística por Marc Bolan & T.Rex tenha sido lançado por textos da revista. Li o arrepiante testamento sobre o álbum The Slider escrito por Jean-Yves Neville e tive a alma irremediavelmente iniciada no mistério que circunda os grandes gênios do pop. Como brincou o quadrinista Joe Sacco na HQ Derrotista "Marc Bolan foi um enviado dos deuses para lembrarmos que somos todos crianças". Outra discoteca básica sedutora foi a do Surealistic Pillow, do Jefferson Airplaine. Depois de ler o texto ficava aquela impressão: Grace Slick, uma mulher num mundo de bandas emasculadas e ela compôs "White Rabbit" e "Somebody to Love"?! O jeito era conseguir o disco. Até hoje essa é (era) minha seção predileta.

Todas as grandes bandas que já pisaram suas botas de plataformas sobre a face da terra - ou aquelas que ao menos mereciam uma menção por terem pisado sobre a face da terra com algum barulho - desfilaram sua arte e glamour pelas páginas da Bizz. Houve um tempo (anos 80 e parte dos 90) em que Stooges, New York Dolls, Zombies, Bowie, Trashman e outros expoentes do rock eram tão novos quanto um walkman Sony em 1978 - se é que eles já existiam nessa época...

Aliás, esse atraso de informações, que caracteriza o rock nacional nos anos 80, tem a ver com isso: não existiam revistas. Nos anos 70, ganhamos uma versão pirata da Rolling Stone; depois, a Pop!, que começou bem, mas logo descambou pra uma espécie de Capricho unissex da música. Por causa dessa carência de informações, o Brasil do meio dos anos oitenta vivia uma onda New Wave old fashion, enquanto que, na Europa e nos Estados Unidos, o gênero esgotara-se há pelo menos uns cinco anos. O único consolo é que os gringos apenas estavam fazendo "lixo mais desenvolvido" - a menos que você considere a turma dos new romantics a coisa mais legal do planeta...Hoje, graças à internet, a anacronia é coisa do passado. O cara em Londres lança uma última tendência eletrônica e, por aqui, os filhotinhos já se proliferaram no dia seguinte. É até uma praga. E uma coisa lúdica da Bizz: qual leitor não colecionou as fichinhas que vinham encartadas na revista? Algumas fichas da minha coleção ainda estão lá, outras viraram descolados porta-copos do Sig-Sig Sputnik, Abba, Byrds, Crosby Stills Nash & Young, The Cramps.

A entrevista a seguir, com o guitarrista e vocalista do Mudhoney, Mark Arm, foi publicada na edição derradeira da revista - julho, capa dos Los Hermanos -, com o sugestivo nome de O Último Show (acredita-se que o título foi uma brincadeira com o iminente fim da revista). Arm, o boa-praça, um dos caras que iniciou o grunge em Seattle, fala sobre sua estante de discos e revela as coisas legais que anda ouvindo.

A entrevista rolou na última - a terceira - passagem do Mudhoney pelo Brasil. Com certeza um dos shows mais a fudê que vi em toda a minha vida. Aquele show de 2002 no Teatro de Elis, em Porto Alegre. Todo mundo pogando em felicidade fuzz: Benvenutti, Talitha Jones, Carlinhos, Fidel, Caíco, Alisson - velhos amigos e parceiros de beligerância roqueira. Depois do show, Mark Arm foi assistir Os Replicantes no bar Garagem Hermética (o antigo, ainda) e curtiu um monte a tosqueira da banda gaúcha. Certo amigo nosso até fumou um cigarrinho do diabo com o cara no desenrolar daquela madrugada gélida de Porto Alegre. Anos mais tarde, presenciei Mark Arm fazendo os vocais do falecido Robin Tyner no retorno do MC5, em São Paulo, e ele segurou a onda legal. Foi carregado pelo público do Campary Rock. E, meses atrás, no festival Porão do Rock, em Brasília.

Lá embaixo, no blog, outra matéria publicada na última edição da revista, seção Tesouros Perdidos, sobre o disco Young, Loud and Snooty, dos Dead Boys, que nunca tinham aparecido nas páginas da Bizz - por causa disso, fico feliz de tê-la escrito. Afinal, todas as grandes bandas que caminharam sobre a face da terra - um dia - saíram na Bizz.

Todo mundo sabe que Mark Arm (em frente na foto) é um fissurado colecionador de discos de rock. Na sua terceira vinda ao Brasil, com o Mudhoney, ele abriu o jogo sobre os seus álbuns prediletos, o que anda ouvindo e destacou, entre os seus dez mais, a banda carioca Os Brasões, um registro raro da psicodelia brasileira.

Qual álbum da primeira era piscodélica não sai nem a pau do seu player?
Escuto um monte de coisas diferentes e, uma hora ou outra, todas acabam deixando o meu toca-discos. Mas, Safe As Milk, do Captain Beefheart & the Magic Band é um grande álbum da primeira fase do piscodelismo. Assim como The Psychedelic Sounds, o primeiro do 13thFloor Elevators.

As trilhas sonoras de Russ Meyer são itens importantes na sua coleção, já que Mudhoney é o nome de um filme do diretor?
Não são tão importantes assim, como se pode imaginar. A única trilha sonora que eu tenho de um filme de Meyer, em minha coleção, é Faster Pussycatt Kill! Kill!, de 1965.

Qual o mais novo título passou para sua discoteca?
O último foi o álbum do Pissed Jeans, Hope for Men (SubPop) - a melhor e mais fudida gravação de punk que ouvi em muito tempo.
Cite dez álbuns que uma boa coleção de rock deve ter.
Não gosto de dizer o que as pessoas devem ouvir e nem de impor o meu gosto para os outros. Mas gosto dos ábuns desses dez artistas: The Stooges (o primeiro), MC5 (High Time), Captain Beefheart (Safe AsMilk), Brian Eno (Here Come the Warm Jets), Bill Withers (Still Bill, Just As I Am), Charles Mingus (tudo), Os Brasões (Os Brasões), Pere Ubu (The Modern Dance), Rolling Stones (tudo até It's Only Rock 'n' Roll), Easy Action (Friends of Rock 'n' Roll).
Qual disco tem a melhor distorção fuzz de todos os tempos?
Não tenho certeza. Vincebus Ereptum, do Blue Cheer, talvez.

terça-feira, 7 de agosto de 2007

sESTINE: fOLK rOCK cOM pOESIA bEAT

"Brasília sofre pela herança. Tem muita banda querendo ser 'a nova Legião'. Só que, ao invés de compor melodias bonitas, prefere dar sermão político na platéia. Até no meio indie tem dessas coisas", provoca o compositor Márcio Porto, cantor e guitarrista da banda brasiliense Sestine.
Numa cidade em que estilos populares - degenerados do brega, axé e sertanejo da pior linhagem - convivem com o legado canônico de Renato Russo, uma banda que laça suas inspirações do folk rock de guitarras é merecedora de atenção. Mas não é isso que chama atenção na Sestine. O grande forte da banda, na verdade, são as boas letras em português e as doses de poesia bitter sweet que, sutilmente, ora adocica, ora reveste as canções de uma melancolia ensolarada do centro-oeste brasileiro.
Os versos de "W2" traduzem a solidão das vias e superquadras brasilienses - a mercê da irradição maléfica das rádios via-satélite: "Eu sou um blefe, e pela W2 deserta nós deixamos toda nossa covardia, para enterramos os cadáveres que cantam os sucessos dessa rádio". A Sestine tem três ep's editados, A Idade da Seresta, Carros-Fantasma e As Engrenagens. Pelo selo SenhorF Virtual, a banda lançou o single "Jana".
Sestine, explica Márcio, é o pseudônimo que ele lançava mão para tocar em bares da capital federal antes do som se eletrificar com a entrada de Marcelo Freitas (bateria), Thiago Soares (guitarra) e Tiago França (baixo). Eles ainda querem agradar a gregos e troianos: "Já foi dito que a Sestine deveria tocar para um Maracanã lotado, para uma platéia de anjos, uma reunião de deuses, presídios e corredores da morte. E para pessoas como eu e vocês também". Pra quem gosta de Smashing Pumpkins, Grant Lee Buffalo, Wilco, Bob Dylan, David Gray, Rolling Stones e Mutton Birds.




rOCK mEDO & dELÍRIO nA mONTANHA!

Essa é pra quem é de Brasília. Descabele-se de tanto dançar em clima de saudável hedonismo na festinha mais quente da capital federal, ao som do melhor cancioneiro pop de todos os tempos (clique no flyer para maiores detalhes).
O endereço da badalação é na mansão montanhesca do Chico Daniel - chefe da assessoria do Ministério da Educação, ex-guerrilheiro de Lamarca, fugitivo político e conhecido manipulador de imagens subliminares na mídia telejornalística - e do "Sandrinho de Tramanda", o surfista sem-prancha do planalto central.
Leve sua bebidinha predileta para engordar a imensa piscina de gelo montada no pátio da mansão. Só não vale ficar lá dentro. Traga também suas fantasias, sejam lá quais... Para aplacar a fome dos comilões enlaricados da madrugada, providenciamos cachorros quentes o suficiente para alimentar um presídio lotado de maconheiros famintos. Energias e fluidos vitais serão recompostos por afrodisíacos caldos by Manoela Frade, nossa hosteszinha adorável.

Não perca essa oportunidade de se divertir e ser feliz!



segunda-feira, 6 de agosto de 2007

o iMPÉRIO cONTRA-aTACA

Memórias de quase dez anos, 1998, eu acho, se alguma coisa aqui dentro não estiver danificada a essas alturas, me fazem lembrar a primeira vez que ouvi aquele terrível nome saindo da boca do Carlinhos Carneiro: "Bidê ou Balde". Na hora não me soou muito bonito. Todos conheciam as fantásticas capacidades dadaístas do Carlinhos já tenro jovem - que sempre foi e ainda é - e desde os tempos em que ele ainda era um balconista de videolocadora (alguém já imaginou o Carneiro nessa situação?). Acredita-se que toda a pulsão criativa do Carlinhos tenha sua gênese ali naquela diminuta locadora de Bagé, onde ele prescrevia Blue Velvet e Twin Peaks pra clientes em estado de mania & depressão. Alguns deles se afundaram tanto em David Lynch que não voltaram. Carlinhos havia ido longe demais - e tão jovem...
Nos corredores da Famecos, penando em ressaca sonambúlica na cadeira de Administração em Jornalismo, aos sábados (eu e Carlinhos repetimos essa umas três vezes. Culpa das sextas-feiras. Estávamos sempre na função undernight e, pela manhã, nos resumíamos a desprezíveis farrapos humanos), sugeri um nome bobo pra eles. Chegou até a ser considerado - Os Japonas. Tempos depois o Carlinhos contou isso numa entrevista e uns carinhas do interior do Rio Grande do Sul, fãs confessos da Bidê ou Balde, nomearam a sua banda de Os Japonas em homenagem à arrrte da Bidê. Por causa desse nome horrendo Os Japonas nem devem mais existir. Acho que foram entubados pela "onda fashion do polyester" ou pela alta do preço do nylon, que transfigurou radicalmente a face da moda rock em 2002...Quem se lembra?
Bidê ou Balde é desses nomes que na primeira ouvida soam terríveis e depois são assimilados pela sua irresístivel fonética. Pronuncie-o em voz alta e permita-se sintir os vocábulos escorregando um a um da sua boca, as quatro sílabas: Bi-Dê ou Bal-De. Chega a ser um lance meio dadaísta. Com certeza é. Outras vezes soa como um slogan impossível de se decifrar. Bidê? E porque Balde? E isso junto, o que significa? No fim é apenas um nome pop - tipo Devo (alguém sabe o que significa Devo?) - e misterioso - misterioso como todo nome de banda de rock deveria ser.

A Bidê ou Balde (pensem o que quiserem, os sisudos detratores) é uma das melhores bandas surgidas no encastelado estado do Rio Grande do Sul em todos os tempos. O iconoclasta Outubro ou Nada! é um álbum repleto de grandes canções, com riffs tão bem tirados que parecem saídos direto de uma abastada vaca leiteira, sem mencionar as melodias encantadoras, os sexy vocais da Vivi e da mamãe-Katia. E mais: o disco é arranjado com uma elegância que pouco se vê na música pop brasileira - independente ou não. A cada faixa, engendra uma admirável engenharia de passagens sonoras, suítes e lindas microfonias. Ouça. Amo riffs e "Metalassê", o grande power hit do álbum, conseguiu ser um dos melhores que ouvi em toda minha vida de obsessões roqueiras.

Voltando ao esquisito do nome, eis que Carlinhos Carneiro está agora em um projeto paralelo à Bidê ou Balde (nesse momento tricotando novas composições), cujo nome é ainda mais strange: O Império da Lã. Tente formar em imagens o que Império da Lã poderia significar pra você. Na minha cabeça vem algo como um reinado de ovelhas no topo do mundo, o obscurantismo pós-Revolução dos Bichos. Ou algo mais prosaico, como uma loja especializada em lãs e malhas de todos os tipos fincada numa daquelas galerias da Rua dos Andradas. Quem sabe, então, uma senha secreta pra detonar a guerra nuclear...

Mas o Império da Lã, na verdade, não é "uma outra banda do Carlinhos". Ela é formada por um exército de putas-velhas com longa passagem - outros mais neófitos - pelo "rock de Porto Alegre", vamos usar essa terminologia. São eles: na bateria, simultaneamente, Pedro Petracco (dos Cartolas) e Gustavo “Prego” Telles (da Pata de Elefante); nas guitarras, Guri Assis Brasil, Guilherme Almeida (ambos da Pública) e Chico Berlota (da Groove James); no baixo, Julio Porto (da Ultramen); na percussão, Guilherme Thiesen (dos Stratopumas); no naipe de metais, Christian Poffo (sax e flauta), Vinícius Azzolini (trompete), Clint Não-Eastwood (sax barítono) e PC Gambá (trompete); a voz feminina da artista plástica Nina Moraes; e o crooner Carlinhos “Imperador” Carneiro (da Bidê ou Balde).
Seguro de si, Carneirinho afirma, com todas as letras, que O Império da Lã é, nada mais nada menos, que "o melhor conjunto de baile do RS, desde a formação de 94 da Banda Impacto!. Somos formados pelo créme de la créme da atual música jóóóvem porto-alegrense". O Império, explica o crooner, é uma banda sem repertório ou formação fixa, uma congruência de amizades e afinidades musicais, misturadas em uma anárquica salada de estilos em que unidade é a extensão do império por si própria. Sacou? Eu não. Só vendo.

Depois de uma histórica estréia mundial, há pouco mais de um mês, na fronteiriça cidade de Jaguarão (que rendeu-se por completo à barbárie da banda em dois shows lotados, cada um com mais de 2 horas de duração - e, de lambuja, ainda entregou a vizinha cidade uruguaia Rio Branco aos domínios do Império), os cavaleiros imperiais querem encabeçar o mundo. No repertório da dominação, além de músicas de autoria da banda, um passeio guiado por canções de Tim Maia, Frank Sinatra, Bob Marley, Erasmo Carlos, Wilco, Beatles, Supergrass, Roberto Carlos e Beck.

O plano, para um futuro bem próximo, confidencia Carlinhos, é aumentar os domínios do Império da Lã, arregimentando seguidores e adoradores em novas cidades. E, a seguir, a grande meta da banda para ingressar no seu sonho de mainstream: fazer shows em praças de alimentação, churrascarias, lojas e galerias de arte, para "arrecadar agasalhos (e alimentos, e brinquedos - além de novelos de lã, para virarem agasalhos em terapias ocupacionais de clínicas e asilos) para ajudar os necessitados e, de quebra, divertir-se em lugares inusitados". Império da Lã não é só despotismo - tem o seu viés social.

"Logo logo, o mundo será pequeno para o Império da Lã!", profetiza Carlinhos Carneiro. Planta-se a dúvida: O que será da Orquestra Imperial daqui pra frente?!

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

a aMARGA sINFONIA dO sUPERSTAR

No post abaixo, a íntegra da matéria sobre o novo disco da Superguidis, A Amarga Sinfonia do Superstar, que saiu na edição 84 da revista de cultura e artes Aplauso, de Porto Alegre. Da mesma matéria, o bate-bola com Andrio Maquenzi, vocalista e guitarrista:





Uma banda
Difícil. Fico com o dream team da Backbeat.

Um disco
In Utero, do Nirvana, que me deu vontade de ter uma banda. Era 1994.

Um pedal
Oliver Bass Chorus! Plugue o microfone e você fica com a voz igual à do Ozzy Osbourne!

Herói
Stephen Malkmus, cuja sensibilidade musical e senso de humor admiramos e seguimos.

Anti-herói
Bob Dylan. Se lambuzou todo naquele submundo descrito pelos beats. Cresci ouvindo ele, com meu velho. Outsider de carteirinha.

Livro
Clichê, vá lá: On The Road, Jack Kerouac.

Lugar dos sonhos pra tocar
Queria ter tocado com o Mudhoney no Teatro de Elis, na Porto Alegre de 2001.

Fã perfeito
Philippe Seabra. Gosta da banda, libera o estudiozão pra gravar e dá palpites. Heheh.

O cantor mais cool do rock
Beck Hansen tem a genialidade escorrendo por debaixo do sovaco! O cara canta e dança demais, recicla sons e é um compositor que se reinventa como quem troca de cueca.

Microfonia perfeita
O final de Like a Hurricane no Rock in Rio 3, com a velha Les Paul preta do Neil Young com três cordas arrebentadas sendo esmur­rada pela mão já ensangüentada do velho índio, fazendo ecoar es­trondosos simulacros de trovões. Incrível!

O "seu" filme de rock já foi feito? Sobre o que ele seria?
Já. Jim Jarmusch pulou na frente, com o Year Of The Horse. Seria algo assim, quando ficarmos mais velhos e caducos, e a iminência do Acidente Vascular Cerebral nos bater às têmporas, rodar um filmezinho em turnê, enxertado com imagens de arquivo!

5 discos do seu Top List:
Bom, pra isso estabeleço um critério, o qual consiste naqueles discos em que eu não pulo NENHUMA faixa. Ouço-o todo, se bobear, no repeat. Parecem coletâneas.

1. Foo Fighters - Foo Fighters

2. My Bloody Valentine - Loveless

3. Stone Temple Pilots - Nº 4

4. PJ Harvey - Stories From The City, Stories From The Sea

5. The Smashing Pumpkins - Siamese Dream

Aforismo predileto
“Não existe trabalho ruim, o ruim é ter de trabalhar”. Seu Madruga.

Lema de vida
Levo a vida tal qual Juca de Oliveira no longínquo comercial da Maracugina. Não há uma frase concreta, mas sim o ato de desfranzir as sobrancelhas, desestressar... “Deixa que depois nóis desatola ela”.

sUPERBADALADOS!

Os fãs que vêm sendo arrebatados pela energia da Superguidis - banda que saiu de Guaíba, na região metropolitana de Porto Alegre, e se tornou uma das maiores promessas do rock nacional - podem ficar tranqüilos: os guris continuam simples, irônicos e provocadores em seu segundo e aguardado disco

CRISTIANO BASTOS

A um passo de ser lançado, o segundo disco da Superguidis, A Amarga Sinfonia do Superstar (SenhorF Discos), vem cercado de expectativas. O desafio é duplo: reproduzir a sensação do trabalho anterior - que revelou mais de um punhado de gemas pop-distorcidas, como "O Coraçãozinho" e "Espiral Arco-Íris" - e, de quebra, desembaraçar-se de vez dos grilhões que os deixam cativos da corroída rotulagem "rock gaúcho". O jogo, no entanto, está praticamente ganho. "Quem curtiu o primeiro disco vai adorar o próximo", afiança o guitarrista Lucas Pocamacha. Você vai entender o que ele quer dizer quando se flagrar repetindo o refrão "de tanto responder perguntas eu virei uma exclamação", de Exclamação, um dos possíveis hits do disco, cuja fita master APLAUSO teve acesso em primeira mão.

Verdade seja dita: eles nem desconfiavam que o álbum primogênito causaria o frisson que os alçou, um ano atrás, ao status de banda mais falada da cena independente brasileira. Em 2006, a revista Bizz os incluiu na lista das "13 bandas que realmente importam no novo rock", ao lado dos hermanos Los Álamos, da Argentina, e do hype nova-iorquino We Are Scientists. Recentemente, a mesma publicação os definiu como "a grande esperança branca do rock independente brasileiro". Uma eleição feita pelo site Trama Virtual elegeu o debut da Superguidis como o melhor disco independente do ano passado. Com o detalhe que, para eles, foi tudo quase sem querer. "Não fazíamos idéia. Só queríamos gravar uma demo um pouco maior e lançá-la", espanta-se Lucas.

E a coisa não pára por aí. Em junho, tocam no Festival Porão do Rock, em Brasília, com Mudhoney e Bell Rays, dos EUA, e os lusitanos do Born a Lion. Em julho se apresentam em Buenos Aires, La Plata e Montevidéo. E lançam um single em vinil da música Mais um Dia de Cão, uma parceria entre as gravadoras SenhorF e Monstro Discos, de Goiânia. No lado B, uma (sub) versão de Everybody's Got Something to Hide, Except From Me and My Monkey, do White Album dos Beatles.

O ponto de partida do estouro foi em 2005. Os guris da Superguidis, estudantes de comunicação da PUC-RS até então conhecidos só no circuito indepentende gaúcho, toparam com o jornalista gaúcho Fernando Rosa, proprietário do selo SenhorF Discos, de Brasília (que lançou outro expoente da nova cena, os acreanos Los Porongas). Deixaram com ele uma cópia da master que tinha a zangada Malevolosidade e a sensível O Banana. Rosa conta que, nos meses seguintes, ouviu a cópia centenas de vezes, torcendo para que se decidissem lançar pelo seu selo: "Na época, escrevi que se tratava de um ‘disco de geração’ - e acho que não errei. A receptividade do álbum e a reação das pessoas, shows Brasil adentro, confirmaram a definição. Não podia ser diferente: com 12 canções exuberantes, o álbum tem tudo o que um disco de rock deve ter: poesia inteligente, guitarras tortas e senso pop de sobra".

O produtor de A Amarga Sinfonia do Superstar e líder da banda Plebe Rude, Philippe Seabra, além de amigo, virou fã dos novos pop-stars de Guaíba: "Eles surgiram no meu estúdio, o Daybreak, como uma lufada de ar fresco soprada pelo ancestral vento Minuano. O futuro do rock brasileiro está nas canções com pegada e postura. Isso os Guidis tem de sobra". Seabra entrega que ficou admirado com a celeridade da banda: "Separamos três semanas de trabalho, sabia que seria rápido. Mas não estava preparado para uma gravação tão ligeira. Mataram o disco inteiro em menos de dez dias! No tempo que sobrou ficamos jogando bola, com exceção do Lucas que, no próximo embate, precisa antes entrar em forma. Ele não agüentou nem quatro minutos de jogo", sacaneia.

No estúdio, banda e produtor optaram pelo método Chas Chandler (que trabalhou com Slade e Jimi Hendrix Experience) de gravação. Isto é: um take só para todas músicas. As artimanhas dos estúdios modernos, como edição e uso de click track (metrônomo quem mantém o baterista no tempo correto da música) e autotune (efeito de pós-produção que afina a voz do cantor), foram deixadas de lado. O segredo, Lucas tenta explicar, "é soar pop sem parecer idiota". A diferença, pontua, está na cara um pouquinho menos infantil que as músicas têm agora: "A ironia mudou de direção. Até poderia dizer que, nesse disco, a ironia está um pouco mais ‘séria’. Só que, por precaução, não vou afirmar isso, não".

Voltando aos rótulos como "rock gaúcho". O objetivo da Superguidis é se manter à parte das bandas que, por opção estética ou falta de referências, tem a "cara do Sul". Na opinião de Lucas falta a essas bandas arejar um pouco a cabeça. "A verdade é que, em Porto Alegre, a galera não está a fim de novidades. Não há mais mercado interno e sequer um selo independente que preste". Outra falha da cena gaúcha, observa o guitarrista, é que ninguém conhece as bandas de fora, e nem quer conhecer, ao contrário do que acontece em outros Estados. Tanto é que a Superguidis cooptou fãs do Oiapoque ao Chuí. "Faz tempo que está rolando um comodismo irritante no Rio Grande do Sul. A impressão é de que o Estado congelou no tempo e, especialmente na música, nos anos 60". Para reforçar o que Lucas diz é só observar o caso da Graforréia Xilarmônica, que não encontrou uma gravadora gaúcha para lançar seu disco ao vivo - editou o trabalho pela mesma SenhorF. Ou então as bandas Pública e Walverdes, que são do selo paulista Mondo 77. "Parece que, no RS, existe um medo de fazer alguma coisa diferente", ele critica.

A Superguidis também não encara o sucesso em suas personificações roqueiras mais clássicas. Os músicos passam longe da pecha de malvadões e garantem nem pensar nos exércitos de groupies desvairadas, ávidas para deixar marcas de batom na cueca do seu roqueiro favorito. "Ainda falta ganharmos alguns milhões para que elas apareçam", despista Lucas. Quanto às drogas, a temível preocupação dos pais nesse negócio profano por excelência chamado rock, então, nem pensar. Diz Lucas: "A melhor droga que nos ofereceram até hoje foi Toddynho, em Belém. Bateu legal".

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