Nada como contar, logo na estréia, com as adoráveis palavras de um escritor cuja reputação precede o próprio nome: Marcelo Benvenutti (na foto abaixo, em processo de criação literária) - ex-ladrão de bancos, ex-seqüestrador, ex-mentiroso profissional e ex-esteta de carteirinha. O gênio de Benvenutti é perfeito para inaugurar esse espaço de mentiras mal contadas e verdades inverossímeis. Digo "ex" porque agora nosso anti-escritor predileto converteu-se em um amoroso pai de família, do tipo que troca fraldas e prepara o mamá do seu bebê Lorenzo. Mas não deixou de cuidar da sua própria mamadeirinha premium - toda noite, algumas vezes pela tarde e outras pela manhã, nosso bebezão liquida com duas ampolas uruguaias de Nortenã litrão. Depois fica ouvindo aquelas músicas que somente ele ainda deve ouvir, em tempos de hypes enjoados, coisas como Isley Brothers, Fast Domino e mestres como Burt Bacharach e Duke Ellington.
Em 1999, Benvenutti vociferou uma das melhores frases do planeta terra (e não eu, como conta na "elegia" que faz a mim logo a seguir) - confissão heterônima da sua melhor lavra: "Eu sou Mickey Rourke!!!". Nosso Harry Angel soltou a famosa frase no mesmo antro pecaminoso que ele também cita, em que eu disse a minha... Sou uma testumunha. Eu estava lá e vi com os próprios olhos. De costume, Benvenutti havia sorvido um mar báltico de cerveja e, no seu desbunde etílico, ajoelhou-se para gritar a antológica frase, que chocou um bando de alternativos anêmicos que se esgeiravam pelas paredes em irrecuperável depressão shoegazer. O Carlinhos - sempre ele - conta essa história na música "A-Há!", do disco Outubro Ou Nada (por sinal, tem uma menção ao álbum por aí).
Benvenutti continua sendo um contador (de dinheiro e finanças e de histórias) e esse ainda é o seu principal ganha pão, até que belo dia ele se torne best-seller. O pão que Benvenutti ganha é líquido, então, ele bebe; se fosse sólido, aí sim, comê-lo-ia...A biografia de Marcelo Benvenutti afirma que ele nasceu de parto parido. No colégio passou desapercebido. Pobres professores que o tiveram em sua sala de aula. Quando chegou a adolescência, Marcelo se negou a crescer. Está se negando até hoje: "Ser adulto é uma coisa deveras chata, diria o grande intelectual cagador de regras", filosofa esse suburbano assumido da zona norte de Porto Alegre.
Dizem que Benvenutti é o maior mentiroso de todos os tempos e de todos os lugares. Dizem isso porque não o conhecem. Se o conhecessem, não diriam. Teriam certeza. Mas, se tratando de um mentiroso, tudo é incerto. Até mesmo esse parágrafo. Escreveu muitos livros e não pára de escrever. Teve um publicado em 2002, Vidas Cegas, que agora jaz sem editora, solto por aí, sem pai, nem mãe. Nosso Mickey Rourke particular deixa o recado: "Se por acaso você for um editor que queira me pagar bem para escrever, aceito de braços abertos suas belas propostas financeiras. Quem vive cheio de ar é pneu", compara.
Cristiano Bastos, mais conhecido como T.Rex por sua adoração pseudo-fake por Marc Bolan, chutador de bunda de alternativos e defensor dos textos de auto-ajuda na terceira pessoa do plural (no estilo "eles que se fodam") poderia ser um Jack London se fosse mais bêbado e menos capitalista. Obviamente, é, pra mim, o criador de uma das melhores frases ditas durante uma noitada em todos os tempos. Lá pelo fim do século passado, no antro porto-alegrense chamado Garagem Hermética lotado de cadelinhas underground e fêmeas obtusas que se multiplicam nos ambientes roqueiros da classe média chinelona, T. Rex saiu-se com a seguinte frase, que resume grande parte da cultura jovem ocidental do Século XXI: "SINTO PEITOS EM MEUS COTOVELOS!"