quarta-feira, 24 de junho de 2009

eRASMO é rOCK, bICHO!


POR CRISTIANO BASTOS

"Rock não é coisa para maricas. Erasmo está aí que não me deixa mentir. (...) Desde Marlon Brando e James Dean sou chegada num bad boy. Erasmo era o bad boy da Jovem Guarda, o que para mim significa ser ele o verdadeiro pai do rock brasileiro. E no meio dos trocentos clones que poluem as atuais paradas de sucesso com suas mesmices, eis que nosso Tiranossaurus Rex abre alas só com inéditas."

As palavras, excertadas do texto de apresentação de Rock'n'Roll, novo álbum do Tremendão Erasmo Carlos, são da pena da tia do rock: Rita Lee. A realidade, de fato, é que traduzem a natural vocação de Erasmo – por excelência, legítimo rock'n'roller brasileiro (com direito a cara de bandido).

O novo disco prova essa condição: não há embustes ou oportunismo. Erasmo – brincalhão, como de costume – fala sobre a farra dos downloads, Renato & Seus Blue Caps, Jovem Guarda e conta, com exclusividade, os sons que não saem de sua vitrola: "Sou uma miscelânia de influências, bicho!"

Você foi, esses dias, ao programa da Ana Maria Braga e reclamou que ninguém faz cover de você. Na mesma semana, em Porto Alegre, rolou um grande tributo à sua obra. Integrantes de bandas como Bidê ou Balde e Pública reuniram-se para tocar seu álbum Carlos, Erasmo na íntegra.

Pô, bicho, que legal! Fico muito contente, de verdade. Como faço para ouvir? Quero conhecer esse pessoal...

E a capa do novo disco? É puro Johnny Cash...

Lembra bastante o Johnny Cash, tudo preto. A ideia foi surguindo. O rock sugere cores escuras, pretas. Foi por sugestão da fotográfa Gilda Midani. Ela disse: "Vamos fazer uma foto bem Johnny Cash". Ficou elegante. Rock’n’roll mesmo.

O nome fala por si.

Muito colorido fica parecendo Menudo, Jonas Brothers. Eu estava devendo esse disco há muito tempo – para mim e para os fãs. É um álbum com menos teclados e mais guitarras. A coisa, aos poucos, foi amadurecendo. Juntei material durante uns dois anos, até chegar a hora de gravar uma leva de músicas. Tinha uns cinco bons temas. Para não me repetir em 12 músicas, pensei: "Vou levar para outros parceiros, também". Tem o melhor meu e deles. É um bom disco. Estou muito feliz com o resultado.

Como escolheu os parceiros?

Saí catando. Nelson Motta, por exemplo, estava em Portugal. Daí envei para ele um MP3. Samuel Rosa, do qual aprecio muito a poesia, também foi o mesmo processo. Nando Reis idem.

Você sabe que toda sua discografia está disponível para download na internet, não é? Como você reage a isso?

Bicho, se é assim, tem que ser desse jeito. Eu vejo os lados bom e chato disso. O lado chato é para os autores: não há remuneração. Mas, isso não é culpa do público. É culpa da indústria, que não evoluiu junto com a internet. Quando prestaram atenção no problema era tarde. O público acostumou-se e, agora, não vai desacostumar-se.

Entrevistei Renato Barros e ele me revelou um divertido episódio envolvendo você...

Eu fui um Blue Cap. Foi uma passagem muito bonita de minha vida, porque, em minha época, não existiam muitas bandas. Elas só vieram com os Beatles. Estive no Renato pouco tempo. Mas deu para a gente registrar em disco. Depois comecei minha carreira solo. Eles também gravaram um comigo.

O Renato contou que vocês se conheceram por causa de uma garota.

Verdade. Eu queria organizar o grupo. Eles eram muito desorganizados. Em São Paulo tinha os Jet Blacks; eles eram muito organizados. Eu achava que o Renato também tinha que ser rganizado. Então, comprei nas Lojas Pernambucanas um tecido quadriculado – parecia tecido de mesa de cantina italiana, quadriculada. Descolei um alfaiate e mandei confeccionar os paletós. Botei gravata borboleta, meias e sapatos brancos. Esse virou o uniforme dos Blue Caps. Todo mundo pensava que eu era o Renato, porque eu ficava no meio, trajado nessa roupa ridícula.

Do alto de sua sabedoria: o que significou, para você, o mito Raul Seixas? Este ano completa-se 20 anos de sua morte.

Essa semana mesmo eu fiz uma analogia com ele, exaltando os novos meios de mídia, como a internet. Hoje vejo a falta que ele fazia em 1958, quando Roberto, Erasmo e Tim Maia estava surgindo. Ele morava na Bahia, que não era o centro gerador de mídia brasileira. O tempo que Raul levou para ir da Bahia para o Rio, e solidificar-se no meio, durou cinco ou seis anos. Nesse meio tempo é que nos projetamos. Ele é contemporâneo nosso, mas demorou a chegar por causa dessa ausência dos meios imediatos de comunicação.

Sergio Sampaio foi grande amigo de Raul Seixas e, para você, Sampaio fez uma canção. Qual sua lembrança dele?

A música que ele fez para mim foi belíssima, "Feminino Coração de Deus". Ele achava que tinha sido eu um dos responsáveis pelo sucesso dele com "Eu Quero É Botar Meu Bloco na Rua". Ele foi lá em casa quando estava fazendo a música. Estava deprê porque o Roberto Carlos não quis gravar "Meu Pobre Blues", que fez para ele. Ele me mostrou "Eu Quero É Botar Meu Bloco na Rua" e eu e minha mulher demos força: "Pô, bicho, essa música é lega! Parece uma marcha-rancho. O refrão é popular". Ele achava que fui um dos responsáveis – mas era ele, na verdade, que achava. Eu não. No fim, Sérgio inscreveu a música no festival e foi um enorme sucesso. O mérito foi totalmente dele.

O que não sai da sua vitrola?

Ouço muita música antiga: Ray Charles, Ottis Reding e grupos vocais. Sou uma miscelânia de influências. Da modernidade, geralmente, fico sabendo só quando todo mundo já conhece. Mas, para mim, é novidade. Como a Cachorro Grande, que descobri esses dias.


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