sexta-feira, 10 de abril de 2009

mAR aBERTO*

Alceu Valença, o bardo de São Bento do Una, se define nos seu 35 anos de carreira: "Sou um artista plural". De fato, timbres plurais - desta vez litorâneos - marcam Ciranda Mourisca, seu novo álbum, o primeiro do pernambucano que sai pela Biscoito Fino.

Os "sons marítimos", contudo, já se ouviam desde o primeiro disco, especialmente em canções como "Planetário", em parceria com Geraldo Azevedo: "A diferença é que agora, porém, neste disco tudo foi elaborado conscientemente", ele explica.

A idéia de Ciranda Mourisca, na verdade, nasceu de "Ciranda da Rosa Vermelha", composição de Alceu que Elba Ramalho transformou em hit. A canção seguia, até então, inédita na intepretação do criador.

No disco, ela ganhou nova versão junto com outras pinçadas na discografia. No repertório, Alceu optou escolher entre aquelas que "não foram parar em rádios ou coletâneas".

"As flores voam e voltam noutra estação", ele canta em "Pétalas", cuja a original é de Maracatu, Batuques e Ladeiras, disco de 1994. Durante a pesquisa de Ciranda Mourisca, Alceu conta que descobriu uma porção de músicas que, à época do lançamento, haviam passado despercebidas.

Caso de "Dia Branco", "Molhado de suor", "Mensageira dos anjos" e "Dente de Oriente". Todas de Molhado de suor – até hoje, uma de suas melhores criações. Aliás, ele compara o novo rebento exatamente com o disco de 35 anos atrás: "Como Molhado de Suor, Ciranda Mourisca é um disco de timbres".

Não por acaso, foi junto ao mar que Alceu foi eternamente fisgado pela música: "Em mim, ela já estava presente na figura de Luiz Gonzaga, que tocava nos auto-falantes de São Bento. Lá eu escutava os cantadores. Entretanto, quando visitei Olinda pela primeira vez ouvi, por exemplo, os cantos mediterrâneos e medievais dos mosteiros. Fiquei deslumbradíssimo ao ver o mar! Neste momento, tive um 'debruçar poético sobre o mundo'", confessa.

No século 16, quando portugueses e espanhóis desembarcaram em Olinda, as nações colonizadoras ainda absorviam efeitos da Invasão Moura, que se perpetuou por três séculos e fundiu a cultura árabe com a Ibérica. Por via marítima, a herança veio estabelecer-se no nordeste.

Sobretudo no sertão: "São os sons característicos das rabecas, das violas e dos aboios", pontua o pernambucano. Já no litoral, se estabeleceram os chamados cirandeiros. Nos anos 60, conta Alceu, ele frequentava a Ilha de Itamaracá, onde conheceu os grandes mestres cirandeiros.

E, para quem não sabe, Alceu Valença também é ator (em 1974 estrelou A noite do Espantalho, filme de Sérgio Ricardo). Agora ele se prepara para estrear como diretor, no longa-metragem Cordel Virtual ou O Mistério da Luneta do Tempo.

Segundo o plural Alceu, será uma "ópera popular": "Quando não estiver sendo cantado, o filme estará sendo narrado em versos", abre o jogo.

Molhado de Suor


*Leia essa matéria na última edição da Rolling Stone, nas bancas.

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